NUNO ROGEIRO
Há um problema pungente de injustiça social, má repartição da riqueza e ausência de grandes programas de desenvolvimento em Cabo Delgado, a rica província mais pobre de Moçambique.
Mas do que o país não precisa, certamente, é de ver estes males agravados e ampliados com a instalação de um falso “Califado”, onde todos teriam de seguir a mesma alegada “Fé” deturpada, ou ser decapitados. Onde todos os tráficos seriam permitidos, desde que houvesse vassalagem ao impostor “Estado Islâmico”.
Moçambique é, como Portugal, membro da ONU e da CPLP. De todos os países que poderiam ajudar no esforço de resistência militar, só a comunidade lusófona fala uma das línguas locais. Os outros, fluentes em Suaíle ou Changana, ou não querem, ou não sabem ou não podem.
E lembre-se que já estivemos em Moçambique na ONUMOZ (1992-1994), depois da paz entre Frelimo e Renamo.
Portugal possui um programa de Cooperação Técnico Militar com Maputo, que foi suspenso em várias áreas, mas que cobre os três ramos, e a formação de oficiais na Academia Samora Machel. Nada impede que seja alargado e melhorado, com um foco mais operacional.
Mas treinar homens demora meses. Moçambique pode já não ter esse tempo.
Outra opção seria a de criação de um acordo especial de defesa, que envolvesse governo, parlamento e PR de Portugal, e que teria de se certificar do apoio público da sociedade e dos partidos, dos objectivos precisos e da escrupulosa aplicação da Lei Internacional relevante, incluindo no Q
Q domínio dos Direitos Humanos.
Mas Portugal não deveria agir sozinho, mesmo que lhe fosse pedido, e se quisesse.
É que a ameaça a Moçambique foi declarada (pela ONU e SADC) como desafio regional e global de segurança, tão grave, por exemplo, como o que empenha as nossas forças no Sahel, no Afeganistão, no Iraque ou na RCA.
Terá assim de haver uma força internacionalmente dotada de mandato inequívoco, e regras de empenhamento eficazes.
Força essa pedida, co-definida e aceite por Moçambique, e sustentada por Portugal e outros, na medida do conhecimento do terreno, capacidade técnica e experiência de cada membro.
Este contingente pode ter duas modalidades: ou ser constituído (tipo Sabre/Takuba) por pequenas unidades de tropas especiais, que assessoram e conduzem os militares moçambicanos em combate, apaziguamento, ajuda humanitária, operações psicológicas, assuntos civis, defesa territorial, etc., ou implicar um largo exército multinacional/multimissões, como na RDC.
Pode ainda equacionar-se um modelo cronológico: primeiro, para pacificar a região e acabar com as bases do Daesh, do sudoeste de Quissanga às margens do Rovuma, com uma força mais robusta e bem apetrechada militarmente na guerra de guerrilha, contra-guerrilha e enquadramento paramilitar de civis, e depois com um contingente de “uso dual”, que assegure a paz e proporcione o regresso pleno de refugiados, a reedificação da economia e o desenvolvimento social.
A verdade é que a guerra contra o Daesh EIPAC em Moçambique entrou numa fase especialmente dramática, com o terceiro ataque e destruição quase total da vila-porto estratégica de Mocimboa da Praia.
Portugal, e a comunidade internacional, não podem cruzar os braços: mais do que um erro, seria uma estupidez.
PS1 – O novo laço entre Israel e os Emirados, apoiado pelo Conselho de Cooperação do Golfo, tem capacidade de revolucionar o Médio Oriente. Os únicos renitentes “absolutos” são Iraque e Irão. Mas claro que é um caminho acidentado. E onde fica a Palestina?
PS2 – Depois do fiasco das manifestações “antifascistas” em Lisboa e Porto, da patética concentração “branca” em frente do também patético SOS Racismo, e da disputa interna entre grupos, grupinhos e grupúsculos da “extrema esquerda” e da “extrema direita” (releia-se Robert Michels para perceber porque é que os pequenos se dividem mais do que os grandes), talvez possamos regressar a discussões importantes sobre Portugal e o futuro. W