AULAS À DISTÂNCIA E EXAMES EM RISCO
h Dos 385 mil estudantes do ensino superior, mais de metade estão já sem aulas a esta data. A vaga de encerramentos temporários começou no início da semana e, além de aulas, inclui bibliotecas, salas de estudos, associações de estudantes, etc. É possível que o fecho das instalações se generalize e a magnitude deste facto só encontra paralelo em 1974 e 1975, quando o caos administrativo e político do País manteve as universidades fechadas.
Todas as faculdades de Medicina foram encerradas por decisão do Conselho Nacional de Escolas Médicas, afetando 12.500 alunos.
Assim que foi divulgado que a Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa iria encerrar, todos os espaços foram imediatamente fechados, e inclusive cadeiras e mesas removidas, por exemplo no Egas Moniz, um dos edifícios de ensino da Universidade de Lisboa. Contudo, mesmo depois disto, e tendo em conta que a DGS está a desaconselhar todos os eventos públicos, realizou-se na tarde de terça-feira, 9, uma conferência de Biologia, com convidados internacionais no auditório Lobo Antunes – “um auditório que os estudantes frequentam”, diz à SÁBADO uma aluna da faculdade.
Os encerramentos foram generalizados na capital: Universidade de Lisboa, Nova, Católica, ISPA e Lusófona, entre outros. As universidades de Coimbra e do Minho suspenderam também as aulas. O que se mantém aberto à hora de fecho desta edição? Os politécnicos (exceto alguns casos no Norte) e as universidades do Porto, Trás-os-Montes e Alto Douro, Covilhã, Aveiro, Algarve, Açores e Madeira. Apenas suspendem até agora algumas atividades
ESTÁ A SER PONDERADA A DESMARCAÇÃO DE CONSULTAS E EXAMES NÃO URGENTES
desportivas, culturais e de lazer.
O ensino à distância está a ser a solução para a maior parte das universidades que tomaram a decisão de suspender as aulas presenciais. “Cada instituição tem de ter uma estratégia, que pode passar por ensino à distância, por alterar calendário letivo. Mas estão preparadas”, diz o presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) Fontainhas Fernandes, admitindo que os reitores têm “trocado experiências”, mas que não há propriamente diretivas do organismo a que preside para lidar com a covid-19. “Há organização, há uma estratégia de comunicação e um plano de contingência. O que importa é comunicar bem e que não se crie contrainformação.”
“Todas as instituições de ensino privado estão preparadas para o ensino à distância”, declara Miguel Copetto da Associação Portuguesa do
Ensino Superior Privado, garantindo que esse instrumento será essencial “porque todas as aulas suspensas terão de ser compensadas”. A dúvida é saber como se poderão realizar os exames se esta situação se prolongar. “Falar de exames ainda é muito prematuro”, comenta.
Uma das preocupações dos reitores são os alunos estrangeiros e os portugueses em Erasmus. “Cada instituição tem uma listagem destes alunos e está a haver uma monitorização”, assegura Fontainha Fernandes, que diz que na UTAD, onde é reitor, se está a aconselhar o adiamento da vinda dos alunos em zonas consideradas de risco. “Há o caso de uma estudante chinesa que quer vir para cá para um curso de Português e estamos a aconselhá-la a adiar o curso”, conta o reitor. “Todas as instituições do ensino superior privado estão a fazer o acompanhamento dos alunos em Erasmus”, assegura Miguel Copetto, explicando que há monitorização feita através dos gabinetes de relações exteriores que em alguns casos estão a aconselhar o isolamento de quem veio de zonas de risco ou teve contacto com pessoas infetadas.
Miguel Copetto só lamenta que a informação da DGS para os planos de contingência não tenha sido feita a pensar nas especificidades do ensino superior. “Infelizmente, não houve indicações específicas sobre planos de contingência. Foi preciso adaptar o plano que havia para as empresas.”
2 milhões de alunos em casa
Na terça-feira, dia de fecho desta edição, aguardava-se com expectativa a reunião do Conselho Nacional de Saúde Pública com o Governo. Daqui vai sair a decisão de fechar ou não todas as escolas do País. Se houver um encerramento, e contando com os estudantes universitários, serão mais de 2 milhões de alunos sem aulas. Como se fossem férias de verão, em março.
Uma das incógnitas são os exames e as provas de aferição. Fonte oficial do Ministério da Educação explica Q
NÃO HAVIA PLANO DE CONTINGÊNCIA PARA O ENSINO SUPERIOR. TEVE DE SE ADAPTAR O DAS EMPRESAS
Q à SÁBADO que qualquer medida que venha a ser tomada “vai depender da evolução da situação”. Mas nas escolas já há quem olhe para os piores cenários. “O bom senso ditaria que não houvesse provas de aferição”, defende o professor Paulo Guinote, explicando que se o encerramento de escolas for superior aos 15 dias das férias da Páscoa, o calendário vai começar a apertar, com as reuniões de notas e a necessidade de garantir o intervalo entre os exames a tornar mais difícil que tudo se mantenha como previsto.
Filinto Lima presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas, diz que se a epidemia de covid-19 obrigar a um encerramento prolongado, “cada escola terá a sua solução para recuperar as aprendizagens”. Aulas de recuperação são uma solução. Outra alternativa para os alunos não perderem matéria é mandar materiais de estudo e trabalhos de casa pela Internet. É o que tem estado a acontecer com alguns alunos do Agrupamento de Escolas Roque Gameiro, na Amadora, que estão em isolamento desde sexta-feira, depois de serem detetados três casos positivos (uma professora e dois alunos).
A resposta aos problemas que estão a ser postos pelo novo coronavírus podem ser muito diferentes, porque as escolas públicas têm autonomia para decidir quase tudo. Até agora, o Ministério da Educação tem remetido para as escolas apenas as orientações que vêm da DGS. “As instruções gerais têm estado a ser dadas pela DGESTE (Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares) com base na DGS”, diz fonte oficial do Ministério, que adianta que além das recomendações emitidas pela autoridade de Saúde, houve apenas uma recomendação “para ponderar visitas de estudo e evitar deslocações não essenciais”.
Uma coisa era dada como certa: a parte do plano de contingência da DGS que põe a hipótese de tentar impedir o contágio sem interromper as aulas através da “redução do tamanho das turmas” ou aumentando “o espaço entre alunos” é vista como inviável pelos professores. “Isso não faz sentido nenhum. Os
MEDIDAS COMO A REDUÇÃO DO TAMANHO DAS TURMAS SÃO INEFICAZES PARA CONTER A COVID-19
miúdos cruzam-se nas escadas, brincam, o risco maior não é sequer nas aulas”, acredita Paulo Guinote. “As turmas já são grandes e as salas já estão cheias. Será impossível cumprir isso. Se se der a opção entre uma coisa e outra, será melhor encerrar”, reage Filinto Lima.