SÁBADO

TEATRO E DANÇA

Purificado­s, de Sarah Kane, é uma “câmara dos horrores” que estará no Parque de Palmela, em Cascais

- TEXTO RITA BERTRAND

Oteatro de Sarah Kane é radical e visceral. Portanto, é preciso bom estômago para o aguentar, como começaram a revelar aos portuguese­s os Artistas Unidos, entre 2000 e 2004, com as encenações de Ruínas, Falta, 4:48 Psicose e

O Amor de Fedra – na verdade , quase todas as peças da autora inglesa, que se suicidou em 1999, com apenas 28 anos. Sarah Kane é hoje um nome do teatro contemporâ­neo por ter assinado textos que a toda a hora testam os limites psicológic­os das personagen­s e do público, de certa forma como a sua própria cabeça – atormentad­a, depressiva responsáve­l pelos vários internamen­tos psiquiátri­cos por que passou – a testava a ela.

A sua dramaturgi­a completa-se com Purificado­s, peça-sensação de 1998 (com a própria a substituir imprevista­mente uma das actrizes, que adoeceu), que agora chega ao Auditório Fernando Lopes-Graça, no Parque Palmela, em Cascais,. É uma produção da Palco 13, com encenação de Gonçalo Carvalho e música original de Gil Amado – um acto de coragem, sabendo-se que ainda em 2016 a peça foi recuperada em Londres e considerad­a chocante demais, fazendo muitos espectador­es desmaiar e ainda mais sair a meio. Os críticos culparam então a encenação – muito lenta, com as exíguas 50 páginas de texto a resultarem num espectácul­o de quase duas horas –, que lhe retirou vitalidade mas, em todo o caso, mesmo numa montagem ligeira não é de esperar entretenim­ento leve e ligeiro e sim um verdadeiro soco no estômago.

Com Alexandre Carvalho, Érica Rodrigues, Joana Jorge, João Cachola, Luís Barros, Romeu Vala e Vicente Wallenstei­n (que deu nas vistas ainda estagiário, na Comuna, com Play Loud, de Falk Richter), este Purificado­s põe Tinker, um homem maquiavéli­co, misto de psiquiatra e traficante de droga, a testar, por meio de métodos pouco ortodoxos, os limites do amor de quatro personagen­s: um par de irmãos gémeos e um casal gay. Qual Big Brother, Tinker conhece todas as juras de cada um e confronta-os com elas, provando que é mais fácil traí-las que cumpri-las: quantas vezes dizemos que morreríamo­s por alguém, mas na prática não seria bem assim? E como mostrá-lo?

A autora não se compadecia com as sensibilid­ades do público e, entre humilhaçõe­s várias, mudanças de sexo forçadas, uma sugestão de incesto e um enforcamen­to, ainda pôs Tinker a sodomizar um dos amantes com um pau e a cortar-lhe a língua em frente ao outro – que acabará de garganta cortada, a jorrar sangue. Excessivo? Não admira: assim é o teatro de horrores de Sarah Kane.

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 ??  ?? PURIFICADO­S AUDITÓRIO LOPES-GRAÇA, PARQUE PALMELA, CASCAIS De 5 a 28/4 • 4.ª a sáb., 21h30 €10
PURIFICADO­S AUDITÓRIO LOPES-GRAÇA, PARQUE PALMELA, CASCAIS De 5 a 28/4 • 4.ª a sáb., 21h30 €10
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Neste teatro de horrores, Érica Rodrigues e Joana Jorge contracena­m com Romeu Vala (à esquerda) e Vicente Wallenstei­n (à direita)
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