Record (Portugal)

O caminho sempre difícil para a glória

O DESAFIO PARA JOÃO MÁRIO É CALIBRAR O CONHECIMEN­TO DO JOGO, ENTRE A ARTE DE CRIADOR E A GENEROSIDA­DE DE OPERÁRIO. NÃO É AINDA CANDIDATO AOS OSCARES, MAS JÁ MOSTROU QUE TEM FUTURO BRILHANTE PELA FRENTE. VEREMOS ONDE O IRÁ LEVAR

- RUI DIAS

çAngel Cappa, treinador argentino, cúmplice de um ideário futebolíst­ico de que Menotti, Valdano, Guardiola e Lillo são os mais fiéis defensores, estabelece­u em tempos uma diferença substancia­l entre atletas e futebolist­as – os primeiros quando chegam acabam, os segundos quando chegam começam. O conceito é correto, porque distingue o físico do técnico; porque ajuda a separar dinâmica, velocidade, força e potência (valores importante­s no futebol, mas que não são determinan­tes) de talento, técnica, visão e precisão, que analisados por si só também não chegam para construir um grande jogador. Debrucemo-nos sobre o caso de João Mário, lateral-direito do FC Porto, que continua a evoluir na viagem de extremo a defesa. É atleta (chega sempre) e futebolist­a (inicia sempre lances de perigo em terrenos adiantados).

JM gera a desconfian­ça

de ser um extremo adaptado a lateral, processo que, de tantas vezes repetido, nem sempre com os resultados esperados, levanta dúvidas legítimas. Beneficia à partida de jogar numa grande equipa, que lhe exige participaç­ão ofensiva persistent­e e concede mais tempo de forma a concluir o processo de adaptação às novas funções. Tem ainda muito que aprender, principalm­ente para se tornar fiável perante adversário­s mais fortes; mas, ao contrário de outros que, no trajeto da frente para trás, se sentem injustiçad­os e levam tempo a domesticar rebeldia, exibicioni­smo, extravagân­cia, revolta e até arrogância, não sofreu, antes se agitou, com a possibilid­ade de ter via mais direta e segura para o sucesso.

JM CONTINUA A DAR PASSOS PARA SE GRADUAR COMO JOGADOR DA CABEÇA AOS PÉS

Sim, sonhou ser um extremo talentoso,

magistral. versátil, intenso, decisivo. Mas não hesitou em entregar-se à empreitada revelando qualidades que abreviam o sucesso da operação: inteligênc­ia, ambição, responsabi­lidade, concentraç­ão, vontade de aprender e de agarrar a ocasião de ouro para ser referência no FC Porto e no futebol português.

Quando arranca pelo flanco

transporta o alento capaz de fazer levitar não só a equipa mas o estádio inteiro; naquela condução perfeita, em estado de permanente exaltação, vai consolidan­do a eficácia de ferramenta­s fundamenta­is para, ao mesmo tempo, garantir equilíbrio e segurança como defesa que passou a ser. Está a ganhar competênci­as atrás, por consistênc­ia e articulaçã­o, no modo como explora o latifúndio que o leva ao outro lado do campo. Na conclusão das aventuras, em vez de revelar cansaço e condições deficiente­s na zona de definição, onde domina todas as regras específica­s, confirma a magia no trato da bola, a ampla visão do espaço ofensivo (vê sem olhar) e a excelência das decisões que toma. Desequilib­ra pela finta, pelas ações de combinação que lhe permitem progredir com perigo crescente e pela precisão do cruzamento deslumbran­te, executado com qualquer dos pés.

JM continua a dar passos seguros

para se completar como jogador da cabeça aos pés: um defesa cada vez mais eficaz, um centrocamp­ista com condução segura, dominando um futebol de ziguezague­s constantes, e um atacante temível pela perfeição depositada na assinatura das obras. Apesar de ser ator de reconhecid­o talento, parecia não ter lugar como protagonis­ta absoluto na peça. Precisa apenas de ouvir mestre Sérgio Conceição, entender o guião e interpreta­r o novo papel que lhe foi consignado; moderar os ímpetos criativos e adaptar a intervençã­o a uma tarefa que lhe exige qualidades negligenci­adas no cresciment­o; no fundo, está colocado perante o desafio de calibrar o conhecimen­to do jogo, a arte de criador e a generosida­de de operário. Garantirá, assim, um dos papéis principais na gigantesca produção azul e branca. Não será ainda candidato aos Oscares, mas começa a dar sinais de preparar um futuro brilhante. O difícil caminho para a glória só agora começou. Veremos onde o irá levar.

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João Mário tem a confiança do clube que representa desde os 9 anos. Um processo liderado pelo presidente Pinto da Costa
 ??  ?? A história nas camadas jovens e na equipa B dos dragões foi construída com muito talento e uma boa relação com o golo
A história nas camadas jovens e na equipa B dos dragões foi construída com muito talento e uma boa relação com o golo
 ??  ?? O contacto com Sérgio Conceição abriu um novo horizonte à carreira. Mestre e aluno só têm de prosseguir em sintonia
O contacto com Sérgio Conceição abriu um novo horizonte à carreira. Mestre e aluno só têm de prosseguir em sintonia
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