Trocas e baldrocas
Ao contrário de anos anteriores, o Benfica tem estado ativo neste mercado de inverno. Faz sentido: o plantel para esta temporada era ligeiramente sobredimensionado, pecava por excesso em algumas posições e por defeito noutras.
Em janeiro, já saiu um jogador excedentário (Conti) e outro que, por força das suas características e do sistema de jogo dominante, estava a desvalorizar-se e a comprometer a sua carreira num momento decisivo (Gedson). Acima de tudo, o Benfica deu um passo para resolver um problema que vinha do defeso: a equipa ficou sem Jonas e João Félix, enquanto manteve o único ‘9’ de raiz (Seferovic) e, para compensar, reforçou-se com dois substitutos naturais do suíço (Carlos Vinícius e Raul de Tomas). Tendo em conta o sistema dominante, fazia pouco sentido ter três ‘9’. Aliás, o principal entrave à afirmação de Raul de Tomas poderá ter sido jogar numa posição que não era a sua e, quando o fez, foi em jogos de segunda ordem, com um onze com muitas alterações e sem rotinas.
Com a saída do espanhol, estão criadas as condições para corrigir o equívoco inicial e investir num avançado com características distintas das de Seferovic e Vinícius. Mas, uma vez mais, só vale a pena contratar se se tratar de um valor seguro, capaz de contribuir para a equipa esta temporada. Caso contrário, é sempre mais avisado esperar pelo defeso. Se estas trocas são racionais, é escusado virem acompanhadas das já proverbiais baldrocas – explicações pouco convincentes ou narrativas promovidas na comunicação social sem qualquer adesão à realidade.
Partindo do bom princípio de que o funcionamento dos mercados obedece a alguma racionalidade, torna-se difícil compreender o mundo do futebol. Pensemos no caso de RDT: um jogador com qualidade e números interessantes, mas pelo qual o Benfica pagou um preço inflacionado. Aliás, foi o próprio Luís Filipe Vieira quem o reconheceu quando, num encontro com sócios, em declarações nunca desmentidas, afirmou que o Benfica pagara mais ao Real Madrid pois as relações entre os clubes tinham azedado após a venda de Garay. Ora, depois de uma passagem sem relevo pelo Benfica, o passe do jogador é vendido por um valor superior para o Espanyol (o mesmo clube que, no mercado de janeiro de 2019, tinha acomodado Ferreyra e Alfa Semedo).
Custa a crer nesta ficção, como custa a crer em muitas outras, às quais nenhum dos grandes escapa: de Imbula que foi do FC Porto para o Stoke por 24 M€ – depois de ter sido contratado por 20 – e que agora se arrasta no Lecce, a Nakajima, que saiu do sempre solícito Portimonense por 35 milhões, para depois ir parar ao FC Porto por 12 milhões (por 50% do passe), passando pelo extraordinário Thierry Correia que foi para Valência por 12 milhões. Verdadeiras baldrocas, que escapam à racionalidade, mas que vão funcionando no mundo do futebol. Até ao dia em que deixarem de funcionar.