“Falta diversidade étnica”
ALERTA Atual selecionador da Guiné-Bissau, o antigo internacional português considera que há preconceito dos clubes em terem treinadores de outras etnias
Na luta por um lugar no Mundial’2026, Luís Boa Morte estreou-se no comando dos guineenses com um empate em casa da Etiópia (0-0). Depois, voltou a empatar na receção ao Egito (1-1).
Luís Boa Morte aceitou em maio o desafio de ser selecionador da Guiné-Bissau, depois de três anos como adjunto de Marco Silva no Fulham. Aos 46 anos, o antigo internacional português considera que este é o melhor projeto para dar os primeiros passos como técnico principal e, em entrevista a O JOGO, alerta para o preconceito que ainda existe na Europa para treinadores de outras etnia.
Por que razão aceitou assumir o comando da seleção da Guiné-Bissau?
—A decisão de assumir a seleção da Guiné-Bissau vai ao encontro do meu desejo de ser técnico principal e, ao mesmo tempo, alertar para a falta de diversidade étnica na escolha dos treinadores. Na verdade não se vê muito, a não ser em África que é visto como algo natural, não há quase ninguém nos campeonatos europeus e nas seleções. Daí a questão de assumir a Guiné-Bissau. Há muitas pessoas que me questionam se é o projeto certo, mas também pergunto: se não aceitasse, qual seria o projeto certo? As desculpas são tantas quando se vai a uma entrevista de trabalho que não sabemos o que é certo ou errado. Tive esta oportunidade. Depois de conhecer quais as intenções da federação, aceitei este desafio e dou voz às etnias que não têm oportunidade de exercer funções.
Em sua opinião, a que se deve essa falta de diversidade étnica?
—Há quem fale em racismo, mas considero que é mais preconceito. Há quem seja preconceituoso e não queira uma etnia diferente como a cara de um projeto. Falando dos mercados que conheço melhor, Inglaterra e Portugal, há bons treinadores de outras etnias que têm curso e estão sem trabalho, outros trabalham sem ter qualificação. Se olharmos para I Liga não há ninguém de outras etnias. Na II Liga temos o Hélder Cristóvão e tínhamos o Silas.
A ida do Kompany para o Bayern pode ser um sinal de que as mentalidades estão a mudar?
—Sem dúvida, até porque é um dos melhores clubes do mundo. Mas não chega só um, porque só uméo que temos estado a assistir. Ninguém é obrigado a dar trabalho, mas tenho colegas que vão a entrevistas e depois não servem por uma questão de etnia. Não pode ser assim. Tem de haver direito de igualdade, algo que não existe. Felizmente, tenho trabalho, mas não é por isso que me vou calar sobre esta questão e quem mandatem de começar a mudar mentalidades. Por exemplo, quando se fala em jogadores, prefere-se muitas vezes os africanos do que os europeus, pois são mais comprometidos. Por que razão não se pensa nisso tam
“Há quem fale em racismo, mas considero que é mais preconceito”
“O objetivo da Guiné-Bissau é continuar a estar presente na Taça de África das Nações. Mundial é um sonho”
“Depois de ter assinado pelo Arsenal, os ídolos passaram a ser meus colegas”
“O Fulham foi muito importante no meu crescimento como jogador e homem”
“Após o Fulham subir à Premier League, negociei com o FC Porto, mas faltou ali um alfinete nas verbas negociadas”
bém nos treinadores?
Sobre a seleção da GuinéBissau, o que lhe foi pedido pela federação?
—O principal objetivo é continuar a marcar presença na Taça de África das Nações. Depois, lutar por estar presente no Mundial, mas não é uma obrigação. Claro que há esse sonho e ambição e até estamos numa boa posição [segundo lugar do Grupo A], mas temos de enfrentar o Egito, que é umas melhores seleções de África. Sinto que temos uma boa base de jogadores para realizar um bom trabalho, apesar de haver alguma dificuldade de recrutamento. Existem atletas que podem jogar pela Guiné-Bissau, mas ainda ambicionam representar Portugal, França ou Senegal.
Já falou com alguns jogadores no sentido de representaram a Guiné-Bissau?
—Sim, e temos vários jogadores que podiam ser maisvalias. O caso do Beto (Everton), Batista Mendy (Trabzonspor), Romário Baró (FC Porto), Álvaro Djaló (Athletic Bilbau) e o Roger (Braga). O máximo que posso fazer é mandar as pré-convocatórias e eles decidem se querem ou não jogar pela Guiné-Bissau.
“No Mundial’2006 sentimos que era possível ganhar. Ainda custa recordar a derrota que sofremos com a França”
Nos dois primeiros jogos como selecionador, empatou com a Etiópia e Egito. Que balanço faz?
—Não posso fazer um balanço positivo. Temos de marcar mais golos e devíamos ter ganho à Etiópia [0-0]. Com o Egito [1-1] ainda estivemos a vencer, mas depois sofremos um golo do Salah perto do fim. Mas uma coisa prometo: enquanto estiver esta equipa técnica, a Guiné-Bissau nunca vai virar a cara à luta.