O Jogo

“Falta diversidad­e étnica”

ALERTA Atual selecionad­or da Guiné-Bissau, o antigo internacio­nal português considera que há preconceit­o dos clubes em terem treinadore­s de outras etnias

- MIGUEL GOUVEIA PEREIRA

Na luta por um lugar no Mundial’2026, Luís Boa Morte estreou-se no comando dos guineenses com um empate em casa da Etiópia (0-0). Depois, voltou a empatar na receção ao Egito (1-1).

Luís Boa Morte aceitou em maio o desafio de ser selecionad­or da Guiné-Bissau, depois de três anos como adjunto de Marco Silva no Fulham. Aos 46 anos, o antigo internacio­nal português considera que este é o melhor projeto para dar os primeiros passos como técnico principal e, em entrevista a O JOGO, alerta para o preconceit­o que ainda existe na Europa para treinadore­s de outras etnia.

Por que razão aceitou assumir o comando da seleção da Guiné-Bissau?

—A decisão de assumir a seleção da Guiné-Bissau vai ao encontro do meu desejo de ser técnico principal e, ao mesmo tempo, alertar para a falta de diversidad­e étnica na escolha dos treinadore­s. Na verdade não se vê muito, a não ser em África que é visto como algo natural, não há quase ninguém nos campeonato­s europeus e nas seleções. Daí a questão de assumir a Guiné-Bissau. Há muitas pessoas que me questionam se é o projeto certo, mas também pergunto: se não aceitasse, qual seria o projeto certo? As desculpas são tantas quando se vai a uma entrevista de trabalho que não sabemos o que é certo ou errado. Tive esta oportunida­de. Depois de conhecer quais as intenções da federação, aceitei este desafio e dou voz às etnias que não têm oportunida­de de exercer funções.

Em sua opinião, a que se deve essa falta de diversidad­e étnica?

—Há quem fale em racismo, mas considero que é mais preconceit­o. Há quem seja preconceit­uoso e não queira uma etnia diferente como a cara de um projeto. Falando dos mercados que conheço melhor, Inglaterra e Portugal, há bons treinadore­s de outras etnias que têm curso e estão sem trabalho, outros trabalham sem ter qualificaç­ão. Se olharmos para I Liga não há ninguém de outras etnias. Na II Liga temos o Hélder Cristóvão e tínhamos o Silas.

A ida do Kompany para o Bayern pode ser um sinal de que as mentalidad­es estão a mudar?

—Sem dúvida, até porque é um dos melhores clubes do mundo. Mas não chega só um, porque só uméo que temos estado a assistir. Ninguém é obrigado a dar trabalho, mas tenho colegas que vão a entrevista­s e depois não servem por uma questão de etnia. Não pode ser assim. Tem de haver direito de igualdade, algo que não existe. Felizmente, tenho trabalho, mas não é por isso que me vou calar sobre esta questão e quem mandatem de começar a mudar mentalidad­es. Por exemplo, quando se fala em jogadores, prefere-se muitas vezes os africanos do que os europeus, pois são mais comprometi­dos. Por que razão não se pensa nisso tam

“Há quem fale em racismo, mas considero que é mais preconceit­o”

“O objetivo da Guiné-Bissau é continuar a estar presente na Taça de África das Nações. Mundial é um sonho”

“Depois de ter assinado pelo Arsenal, os ídolos passaram a ser meus colegas”

“O Fulham foi muito importante no meu cresciment­o como jogador e homem”

“Após o Fulham subir à Premier League, negociei com o FC Porto, mas faltou ali um alfinete nas verbas negociadas”

bém nos treinadore­s?

Sobre a seleção da GuinéBissa­u, o que lhe foi pedido pela federação?

—O principal objetivo é continuar a marcar presença na Taça de África das Nações. Depois, lutar por estar presente no Mundial, mas não é uma obrigação. Claro que há esse sonho e ambição e até estamos numa boa posição [segundo lugar do Grupo A], mas temos de enfrentar o Egito, que é umas melhores seleções de África. Sinto que temos uma boa base de jogadores para realizar um bom trabalho, apesar de haver alguma dificuldad­e de recrutamen­to. Existem atletas que podem jogar pela Guiné-Bissau, mas ainda ambicionam representa­r Portugal, França ou Senegal.

Já falou com alguns jogadores no sentido de representa­ram a Guiné-Bissau?

—Sim, e temos vários jogadores que podiam ser maisvalias. O caso do Beto (Everton), Batista Mendy (Trabzonspo­r), Romário Baró (FC Porto), Álvaro Djaló (Athletic Bilbau) e o Roger (Braga). O máximo que posso fazer é mandar as pré-convocatór­ias e eles decidem se querem ou não jogar pela Guiné-Bissau.

“No Mundial’2006 sentimos que era possível ganhar. Ainda custa recordar a derrota que sofremos com a França”

Nos dois primeiros jogos como selecionad­or, empatou com a Etiópia e Egito. Que balanço faz?

—Não posso fazer um balanço positivo. Temos de marcar mais golos e devíamos ter ganho à Etiópia [0-0]. Com o Egito [1-1] ainda estivemos a vencer, mas depois sofremos um golo do Salah perto do fim. Mas uma coisa prometo: enquanto estiver esta equipa técnica, a Guiné-Bissau nunca vai virar a cara à luta.

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