“As paixões não pagam contas”
Sara Moreira associa a “falta de investimento” nos jovens à crise no fundo a que se assiste há vários anos
Não há fundistas portuguesas com êxitos como os de Sara Moreira, Jéssica Augusto e Dulce Félix há vários anos. Para a atleta do Feirense, “tem de existir uma maior facilidade na conciliação de carreiras”.
Não é novidade que o ●●● fundo português, depois de muitos e grandes êxitos até à entrada neste século, atravessa uma longa crise. Este ano, Portugal não teve maratonistas no Mundial e a Eugene (EUA) foram apenas três atletas para as provas de meio-fundo e fundo – Isaac Nader e Marta Pen no meiofundo e Mariana Machado no fundo –, não tendo sido chamados seniores para o último Europeu de crosse. São sinais de alerta que preocupam atletas como Sara Moreira, que, apesar de acreditar que “a qualidade não se perdeu em Portugal”, vê muitos jovens a desistir do sonho de serem profissionais porque “não vêm futuro” na modalidade.
O fundo português atravessa uma longa crise. Porquê?
— É uma questão delicada e que me preocupa. Acredito que se prende com vários fatores, desde logo a falta de investimento
que há desde uma fase inicial, os anos em que os jovens atletas estão a estudar. Teria que existir uma maior facilidade na conciliação de carreiras e obviamente que isso depois se reflete no topo. Isto é como uma pirâmide. Se a base estiver preenchida, a probabilidade de chegarem mais atletas ao topo é maior. Nós não conseguimos cativar pessoas para a prática da modalidade. Quando conseguimos, numa fase inicial, chamar alguns jovens, depois começam a perceber qual é o futuro no atletismo. Como não vêm futuro, desistem. Se, na minha altura, não existissem clubes que investiam e proporcionavam aos atletas a possibilidade de serem profissionais, se calhar eu nem sequer tinha pensado nisto. Neste momento, há poucos clubes que podem proporcionar aos atletas a oportunidade de viverem a tempo inteiro do atletismo.
Sara, Jéssica Augusto e Dulce Félix marcaram uma geração. Há novas fundistas que ocupem o vosso lugar?
—Acredito que há valores e que a qualidade não se perdeu em Portugal, mas se calhar não se podem dedicar como nós podíamos. Nós não precisávamos de nos preocupar em ter que trabalhar para conseguir pagar contas, éramos recompensadas pela nossa dedicação. O que recebíamos dava-nos alguma estabilidade e, infelizmente, neste momento isso não acontece, o que acaba por se refletir nos resultados. Se o meu filho fosse atleta, provavelmente dizia-lhe para pensar bem no futuro. As paixões não pagam contas.
“Nós não conseguimos cativar pessoas para a prática da modalidade. Os jovens acabam por desistir”
“Acredito que há valores e que a qualidade não se perdeu em Portugal”
Sara Moreira CD Feirense