“Bronze de Sydney foi como ouro”
Em 2000, Fernanda Ribeiro entra no grupo restrito de quatro olímpicos com duas medalhas. Foi depois de um dos piores momentos da sua vida, em Sevilha, e admite que podia ter sido ainda melhor
Em Sydney’2000 volta a ganhar uma medalha, numa altura complicada…
bbb — Em 1999, era candidata a uma medalha em Sevilha [nos Mundiais] eé das piores memórias que tenho. Desisti. Tinha dado quatro das 25 voltas e já não consegui acorrer. Aquilo deitou-me abaixo. Foi dos piores momentos da minha vida. A Ana Dias levou-me a Vila Real de Santo António para alugar um carro e ir embora e passei sete dias sem sair de casa. Tinha vergonha. Deitei fora os sapatos de bico, os meus colegas é que os foram buscar e me convenceram a voltar. Até 2000 aquilo não me saía da cabeça. Apanhei medo à competição, deixei de fazer meetings. Fiz um teste de 5000 antes dos Jogos Olímpicos, na Maia, com o Regalo e outros a ajudar-me, e fiz a minha segunda melhor marca. Estava muito bem. Mas em Sydney o medo continuava e, ao chegar lá, constipei-me, no fim de um treino comecei a sangrar do nariz… achei que estava tudo mal!
Por que correu então?
— O João já nem queria falar comigo, mas houve um dia em que me abanou, disse para fazermos uma conferência de Imprensa e assumir que não ia correr; disse-me que estava a deitar fora uma medalha e que o medo que eu tinha das outras era o mesmo que elas tinham de mim. Quando entrei na aldeia olímpica, comecei a reagir, a sentir mais confiança, até por ter sido segunda na meia-final. Falava muito com a Manuela Machado e a Ana Dias que me disseram para não levar fato de treino para a final, que se ganhasse uma medalha o iam buscar. Fui para a prova com mais confiança, mas não como em 1996.
Seria o peso do ouro?
— Nunca me pesou. Hoje, tenho quase a certeza de que pelo menos prata podia ter sido.
O João Campos acha que podia ter ganho…
— Podia, mas tive medo. Foi a única competição em que não cumpri o que ele me disse. Passámos aos cinco mil metros a 15m09s e pensei: ‘vou morrer… mas elas também’. O João disse para eu sair e ganhei vantagem, mas tive medo e esperei pela Tulu e a Wami e quando elas saíram eu fiquei. Só reagi nos últimos cem metros. Já não fui a tempo. Mas fiquei muito contente e para mim foi ouro depois do que tinha passado, que foi horrível. Eu não acreditava, mas o meu treinador sempre acreditou.
“Deixei Sevilha e passei sete dias sem sair de casa, tinha vergonha. Deitei fora os sapatos de bico”