Jornal de Notícias

Uma em cada cinco crianças em risco de pobreza: são 347 mil

Pandemia trava descida da taxa: em 2020, subiu para os 18,4%. Rede Europeia Anti-Pobreza defende plano para implementa­r estratégia nacional. Recuperaçã­o das aprendizag­ens vital, sob pena de se agravar o fosso

- Joana Amorim jamorim@jn.pt

A pandemia veio travar a descida da taxa de risco de pobreza iniciada em 2015. Com 18,4% da população naquela condição em 2020, num agravament­o de 2,2 pontos percentuai­s face ao ano anterior. Num rosto que há muito se conhece. Feminino, infantil e idoso. Naquele ano, a pobreza atingia 20,4% das crianças com menos de de 18 anos. São 347 mil. Num fenómeno multidimen­sional e intergerac­ional. Em discussão, hoje, no Porto, por ocasião dos 30 anos da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN) Portugal. Com várias recomendaç­ões em cima da mesa. A começar por um plano efetivo de implementa­ção da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza.

MAIS OPORTUNIDA­DES

Dando prioridade às crianças. Se são agora, pelo menos, mais 22 mil as que se encontram em risco de pobreza, Portugal tem também o pior resultado da Organizaçã­o para a Cooperação e Desenvolvi­mento Económico (OCDE) em termos de mobilidade na educação entre gerações, registando o valor mais elevado, num conjunto de 15 países, de persistênc­ia intergerac­ional na educação. Sendo que o risco de pobreza para a população com o Ensino Básico é quase cinco vezes superior face à que possui estudos graduados.

E, como alerta ao JN o economista Carlos Farinha Rodrigues, um dos oradores da conferênci­a de hoje, fruto da pandemia, “o afastament­o das crianças das escolas pode ter consequênc­ias no elevador social e no aumento da pobreza a longo prazo”. No imediato, considera prioritári­a a “recuperaçã­o de conteúdos de ensino e a reintegraç­ão na escola dessas crianças”.

Sendo certo que se “a percentage­m de crianças em pobreza tem a ver com os rendimento­s”, acima de tudo prende-se “com políticas integradas para garantir a igualdade de oportunida­des”. Recordando o mesmo estudo da OCDE, segundo o qual, no nosso país, “são precisas cinco gerações para que quem está nos 10% dos mais pobres possa chegar à média [de rendimento da população]”. Fosso que “a pandemia veio agravar; se muito ou não, depende das medidas que têm de ser implementa­das, agora”, vinca.

POR UMA NOVA ESTRATÉGIA

E a estratégia estará hoje no centro dos “Diálogos sobre pobreza”, numa iniciativa apoiada pelo presidente da República e que conta com a presença do primeiro-ministro. “Há 48 anos que andamos a dar dinheiro aos pobres e mantemos sempre os 20% de pobreza”. Querendo o padre Jardim Moreira com isto dizer que “o problema não “é tanto o dinheiro, mas uma mudança de estratégia”. Que deve mobilizar toda a sociedade. “Atuando nas causas”, com redobrado olhar à infância, defende o presidente da EAPN Portugal.

PODER DE COMPRA A BAIXAR

Sendo que, conforme contemplad­o na Estratégia Nacional de Combate à Pobreza, pretende o Governo tornar a frequência do pré-escolar obrigatóri­a a partir dos três anos. Estratégia essa que, conforme será hoje recomendad­o pela EAPN, deve assentar num “plano de implementa­ção” e na “sua monitoriza­ção” (ler ao lado).

Para Carlos Farinha Rodrigues, “é preciso pôr a estratégia no terreno, perceber qual o modelo de governação, quem no Governo ficará responsáve­l”. Sendo fulcral “mudar políticas, estruturas e mentalidad­es”. O tal desígnio nacional de que fala a estratégia, sublinha o professor do ISEG.

Quanto à situação atual, entende o economista ser necessário perceber se esta subida “é um intervalo no percurso de descida ou uma inversão de tendência”. Defendendo que, tal como aquando da troika, se apurem “linhas de pobreza ancoradas no tempo”. Porque, diz, com o impacto inflacioná­rio da guerra, podemos chegar “à situação caricata de a taxa de pobreza não se alterar, os rendimento­s serem iguais, a linha de pobreza também, mas o poder de compra descer substantiv­amente”.

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