O pó das obras assentou mas ainda falta ar aos comerciantes
Câmara do Porto vota segunda tranche para compensações aos lojistas da Avenida Fernão de Magalhães. Medida é ansiada, mas há desconfiança entre os que sobreviveram à intervenção
Nelson Manuel
Restaurante Manuel Alves
“Reuniões e anúncios vejo eu... Se vier a tempo, quero é ver o dinheiro a entrar”
José Fernandes
Talho Miranda
“Ainda esta manhã veio cá o senhor da Câmara. Só acredito quando o dinheir0 vier”
José Oliveira
Nova Ferreira
“Não acredito que paguem, promessas leva-as o vento... Sinto-me lesado”
Silvana Cerqueira
Loja Silvana
“Já escrevemos à Câmara a pedir mais estacionamento. Não há onde parar”
Os comerciantes da Avenida Fernão de Magalhães, no Porto, não dão como certas as indemnizações que a Câmara do Porto anunciou. Dizem que preferem esperar para ver. Quase três anos de perdas minguaram-lhes a crença. Primeiro, foram as obras que esventraram a rua, taparam as montras e encheram o ar de pó; depois, o confinamento que esvaziou os passeios de gente.
“Esta faturação não me dá esperança para continuar”, diz, desalentado, Nelson Manuel, dono do restaurante Manuel Alves. Abriu portas na Fernão de Magalhães há 49 anos, naquele mesmo prédio e numa avenida que lembra mais iluminada e alegre. “Agora, não tem nada de convidativo. É só uma passagem”, lamenta. Sente o peso das contas que lhe vão esvaziando a almofada, valioso ensinamento do pai. Os quinhentos e tal euros de luz, os mil de gás, os salários de nove funcionários, as compras para o restaurante: “A almofada tem um limite”. Enquanto não o atingir, o “Manuel Alves” fará jus à comida que lhe deu fama: “cabritinho pequeno de antigamente; bom cozido e bom bacalhau”.
Hoje, a Câmara do Porto vota a segunda tranche de indemnizações no valor de 278 mil euros, a distribuir por 23 comerciantes da Fernão de Magalhães, a título de compensação pelos prejuízos causados pelas obras, iniciadas em setembro de 2018. Os pagamentos a outros 22 lojistas foram aprovados antes. No total, os apoios chegam quase a 600 mil euros.
“UM ABRE E FECHA”
Mais abaixo na avenida, José Fernandes, do talho Miranda, alinha pela mesma cautela: “Só acredito quando o dinheiro vier”. Fala do que lhe desagrada da obra que atrasou as contas, enquanto vai atendendo as freguesas da vizinhança: os passeios largos “só para os turistas”, a falta de estacionamento que atira a clientela para outro lado. “Estou aqui desde 2006 e esta é a segunda alteração de raiz à avenida. E, desta vez, foi um abre e fecha aqui à porta”, diz, sobre as obras apontadas para estar concluídas no terceiro trimestre deste ano.
José Oliveira, da loja de eletrodomésticos Nova Ferreira, toma o anúncio da Câmara como promessa, dessas que o vento leva. São meses de queixas e de ressentimentos de quem foi lesado sem nunca ter sido ouvido. “Alteraram a avenida sem nos ouvir... E agora, para baixo só passam autocarros, os passeios têm quatro metros, quase que parece Santa Catarina e temos de andar às voltas para chegar aqui”, enumera.
Silvana Cerqueira, da casa de miudezas Silvana, que esteve “mais de um ano bloqueada pelas obras”, não compreende “tanto passeio, quando aqui não há turismo”.