Jornal de Notícias

Portugal Telecom: tragédia com seis capítulos e um fim em aberto

- Mariana Mortágua Deputada do BE

Estamos a tempo de travar esta afronta da Altice e impedir o despedimen­to fraudulent­o

Se fosse preciso escolher uma empresa para contar a história do capitalism­o português, seria a Portugal Telecom (PT). A trama é intensa, os suspeitos são os do costume, e o final, ainda em aberto, já é trágico. A história começa pelos anos 90 e introduz-se, simbolicam­ente, com José Penedos, do Governo Guterres, a dizer, orgulhoso, “por cada empresa que privatizo, abro uma garrafa de champanhe”.

Capítulo primeiro: “Os centros de decisão nacional”. O Governo esforça-se para atrair investidor­es nacionais, sendo o maior o Grupo Espírito Santo.

Capítulo segundo: “A loucura da Bolsa”. Belmiro de Azevedo lança-se numa tentativa de compra hostil, com o plano de fundir a Optimus com a TMN. Os acionistas dividem-se, mas acabam por impedir a operação, com apoio do BES e também do Governo de Sócrates.

Capítulo terceiro: “A descapital­ização”. A PT paga o apoio contra a venda com dividendos chorudos e instrument­alizações políticas.

Capítulo quarto: “O supergesto­r”. Zeinal Bava, estrela em ascensão, apresenta ao país os maiores negócios do século: a venda da brasileira Vivo por uma fortuna e a gigantesca fusão da PT com a brasileira Oi.

Neste ponto paramos para introduzir uma outra personagem – a Comissão Europeia – que, em 2011, pressionou Vítor Gaspar para vender a última participaç­ão do Estado na PT.

No capítulo cinco – “A crise” - tudo complica. Os acionistas nacionais tinham canibaliza­do a empresa. O BES cai e a PT perde todo o dinheiro que tinha emprestado ao seu acionista. A Oi aproveita para ganhar poder e anuncia que vai vender a PT Portugal à Altice. O Governo de Passos Coelho podia ter travado a venda, usando a participaç­ão do Novo Banco, mas não o fez.

Capítulo sexto – “Os fundos abutre”. É aqui que estamos. A Altice, para além de acabar com as marcas Portugal Telecom e Meo, dedica-se agora a uma operação de razia de direitos laborais, com o objetivo de expulsar centenas de pessoas. Para isso ficciona “transmissõ­es de estabeleci­mento”, ou seja, envia trabalhado­res para empresas falidas, alegando depois que não pode pagar as indemnizaç­ões. É a selvajaria total.

Ainda sem fim, história da PT já é uma tragédia, enredada nas mentiras da nossa economia, das privatizaç­ões à mistificaç­ão dos “investidor­es externos”. Estamos a tempo, no entanto, de travar esta afronta da Altice e impedir o despedimen­to fraudulent­o. Não será um final feliz, mas terá, pelo menos, dignidade.

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