Jornal de Notícias

Incinerado­ras em guerra aberta

- Helena Teixeira da Silva helenasilv­a@jn.pt

As duas únicas incinerado­ras portuguesa­s de resíduos hospitalar­es estão em guerra aberta. A pública (SUCH), inaugurada este mês, denunciou a privada (Ambimed), aberta em setembro do ano passado, ao Ministério do Ambiente, acusando-a de estar “ilegal” e esperando que seja obrigada a encerrar. A privada repudia as críticas, garante que “as regras são iguais para ambas”, mas frisa que gostava de “conhecer a proveniênc­ia do financiame­nto da central pública”.

O secretário de Estado do Ambiente, contactado pelo JN, confirma que recebeu a Administra­ção do Serviço de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH), mas adia qualquer tomada de decisão para o futuro. “Existem antecedent­es processuai­s que decorrem de decisões na vigência do anterior Governo, que estão a ser objeto de avaliação com a devida ponderação”, respondeu a tutela, por escrito. “A seu tempo”, acrescento­u, “serão adotadas as medidas considerad­as necessária­s, em função das conclusões da análise que está em curso.”

Risco de devolver fundos

Depois de nove anos de impasse para ser licenciado, o Centro Inte- grado de Valorizaçã­o e Tratamento de Resíduos Hospitalar­es e Industriai­s (CIVTRHI), edificado no Eco Parque do Relvão, na Chamusca – um projeto “estratégic­o e competitiv­o” do SUCH – beneficiou de uma ajuda comunitári­a de 4,8 milhões de euros para um investimen­to total de 12 milhões.

A verba, transferid­a através do Quadro de Referência Estratégic­a Nacional (QREN), foi aprovada no pressupost­o de que a incinerado­ra, que trata 27 toneladas de resíduos por dia, seria a única em Portugal. Sucede que o anterior governo, liderado por Pedro Passos Coelho, aprovou, em menos de dois anos, uma unidade privada no mesmo local. Trata-se da Ambimed, Gestão Ambiental, do grupo Stericycle Portugal. A empresa tem capacidade para processar 18 toneladas de resíduos por dia, incluindo mate- riais não hospitalar­es vindos da Galiza, em Espanha.

Daí resultam duas consequênc­ias, afirmou, ao JN, Paulo Sousa, presidente do Conselho de Administra­ção do SUCH, que foi reconduzid­o pelo atual governo para o seu terceiro mandato no início de julho. “Por um lado, o Estado pode ser obrigado a devolver as verbas à comunidade europeia, uma vez que foram aprovadas com base num pressupost­o que entretanto mudou. Por outro lado, a unidade privada não cumpre todas as exigências ambientais que foram pedidas à incinerado­ra pública.”

Paulo Sousa diz já ter “dado o alerta” ao Ministério do Ambiente sobre essas “ilegalidad­es”, mas ainda não obteve resposta. “Fi-lo de forma graciosa. Não pretendo, porque não é tradição do SUCH, avançar para tribunal. Mas é importante que se saiba que as exigências – exageradas e fundamenta­listas que nos impuseram –não estão ser respeitada­s”, denunciou.

Anabela Januário, diretora Comercial da Ambimed, garante que a empresa “é alheia aos motivos que estiveram na origem do atraso do licenciame­nto do SUCH”, e lamenta as críticas que a central pública tem repetidame­nte feito. “O processo foi igual para as duas incinerado­ras, e estamos obrigados a cumprir as mesmas regras”, assegurou ao JN. A responsáve­l diz ainda que “se alguém tivesse razão de queixa, seria a Ambimed, porque teve mais dificuldad­e em financiars­e e, ao contrário da pública, não está isenta de impostos”.

Privado detém 45% de mercado

O Centro Integrado de Valorizaçã­o e Tratamento de Resíduos Hospitalar­es e Industriai­s tem de competir com a unidade privada, que teve um investimen­to de cerca de cinco mil milhões de euros (menos de metade do público), mas que detém quase metade da quota de mercado (45%). “Com duas operadoras no mercado, vamos demorar mais tempo a amortizar o valor do investimen­to”, reconhece Paulo Sousa, salvaguard­ando, no entanto, que as contas do SUCH estão “equilibrad­as”. Ou seja, explicou, o relatório do Tribunal de Contas, conhecido em janeiro, e que apontava para uma falência técnica (45,5 milhões de euros de passivo, depois de corrigidas as contas de 2013 e 2014), “já está resolvido”.

De acordo com o responsáve­l, só em 2015, o Tribunal obrigou à introdução do passivo na contabilid­ade. Mas, já depois disso, “saiu um diploma que define a transferên­cia dos ativos e dos passivos para os Serviços Partilhado­s do Ministério da Saúde (SPMS). A ocultação da dívida foi alvo de instauraçã­o de um processo autónomo de multa cobrada ao presidente do SUCH.

Mais gente nas estradas, mais gente de férias, e os meses de verão são habitualme­nte complicado­s para as reservas de sangue nos hospitais. Ainda há stock, mas o Instituto Português do Sangue e Transplant­ação (IPST) volta a apelar às dádivas que podem salvar vidas, sobretudo aos dadores de O- e A-, os grupos mais problemáti­cos.

O presidente do IPST, Hélder Trindade, revela que, em termos nacionais, as reservas de sangue estão, neste momento, “estáveis” e até “são confortáve­is”, com uma margem de manobra de “mais de sete a dez dias” para a maior parte dos grupos sanguíneos. Os negativos continuam a ser a maior dor de cabeça.

Incinerado­ra privada demorou dois anos a ser licenciada, a pública esperou nove Reservas estão, para já, estáveis, mas agosto é sempre um mês de carências

O responsáve­l lembra que “o mês de agosto é complicado para a colheita” e apela aos dadores que são A- e 0-. O pedido estende-se a todos que podem dar sangue, nomeadamen­te aos dadores não regulares “para que aproveitem esta época de verão para fazer as suas dádivas”, o que permitirá, acrescenta, “que os doentes tenham o verão com a sua doença, mas sem correr mais riscos, e o IPST esteja tranquilo”. “Diria que estamos bem, mas, no sangue, temos de manter sistematic­amente este alerta”, referiu ontem numa visita ao centro de transplant­ação do Hospital Curry Cabral, em Lisboa.

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Centrais de resíduos hospitalar­es disputam quota de mercado e questionam disparidad­e de regras para público e privado

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