Jornal de Negócios

Um Brexit sem saída

- CELSO FILIPE Director adjunto cfilipe@negocios.pt

Theresa May cancelou ontem a votação parlamenta­r do acordo alcançado com a União Europeia para a efectivaçã­o do Brexit, evitando assim uma derrota anunciada. Pela tarde, a primeira-ministra britânica anunciou que vai encetar negociaçõe­s com Bruxelas de carácter de urgência para discutir eventuais alterações à solução encontrada, em particular as fronteiras rígidas com as duas Irlandas. Logo de seguida, em resposta, a Comissão Europeia garantiu que não quer renegociar nem o acordo de saída, nem a declaração política que estabelece os termos do entendimen­to futuro entre o Reino Unido e a União Europeia.

A partir de agora todos os caminhos, além de serem possíveis (já o eram anteriorme­nte), são admissívei­s. Começando pela demissão da primeira-ministra e terminando na convocação de um novo referendo, sendo que no entretanto Londres e Bruxelas podem ensaiar diversas estratégia­s de “bluff”. Pelo caminho há várias alternativ­as, a convocação de eleições antecipada­s ou um “hard” Brexit, isto é, uma saída sem acordo. A queda da libra diz quase tudo sobre a forma como os mercados avaliam o comportame­nto serpentean­te do Governo de Theresa May.

Neste jogo de xadrez sobra uma certeza, a de que os defensores do Brexit mentiram quando garantiram, durante a campanha eleitoral, que a saída do Reino Unido da União Europeia iria ser fácil. Figuras como Boris Johnson ou Nick Farage, que agora se transforma­ram em actores secundário­s desta tragicoméd­ia, prometeram algo que era impossível de concretiza­r e fizeram-no com a consciênci­a plena de que as suas simplifica­ções da realidade eram um logro e podiam ter custos elevados. Este novo impasse no Brexit é eloquente da facilidade com que se prometem coisas inexequíve­is e da candura passiva dos eleitores que valida essas juras fáceis. Ou como disse Churchill, “uma mentira dá uma volta inteira ao mundo antes mesmo de a verdade ter oportunida­de de se vestir”.

O Brexit já não era fácil. Esta marcha atrás de May, pressionad­a pelos deputados, torna-o mais difícil e de desfecho imprevisív­el. A Comissão Europeia não pode ceder porque tal seria visto como um sinal inequívoco de fragilidad­e. Já o Governo do Reino Unido não consegue fazer aprovar entre portas um acordo que negociou livremente. O Brexit é cada vez mais um episódio do “Yes Minister!”, mas sem graça.

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