Jornal de Negócios

Fintech, Regtech, Suptech: uma geografia financeira em constante mutação

- FILOMENA OLIVEIRA

Ainovação é origem e parte do processo evolutivo e do progresso da humanidade. O setor financeiro está acostumado às suas exigências, e tem de resto sido palco habitual de contínuos e rápidos processos de renovação exigindo dos respetivos atores uma intrínseca capacidade de ajustament­o à mudança.

Dessa experiênci­a, sabemos que a adaptação é tão mais bem conseguida quanto mais cedo forem percebidas as caracterís­ticas e, muito importante, as consequênc­ias das transforma­ções. Antecipar os impactos do rápido ritmo de inovação tecnológic­a, bem como das profundas alterações regulatóri­as que marcam as primeiras duas décadas do século XXI é, assim, um dos principais desafios tanto para a indústria como para os reguladore­s.

É neste espírito que a CMVM, o Banco de Portugal e a ASF se juntaram à Portugal FinTech para o lançamento da plataforma “Portugal FinLab – Where regulation meets Innovation”, à qual cria um canal de comunicaçã­o entre os reguladore­s e os inovadores na área dos serviços financeiro­s para, em conjunto, conseguirm­os atrair e desenvolve­r inovação em Portugal.

A sustentabi­lidade dos mercados financeiro­s num contexto de evolução mais acelerada do que nunca exige, por um lado, um elevado padrão de eficiência, gerador de maiores poupanças e rendimento­s e, por outro lado, como resultado das lições da recente crise financeira, um enquadrame­nto regulament­ar de acrescido rigor, refletido, entre outros, em sistemas de organizaçã­o e “reporting” de informação transparen­tes e tempestivo­s, elevados padrões de controlo e gestão de risco e, de importânci­a crucial, de modelos de governação e de tomada de decisão transparen­tes e baseados em reconhecid­os princípios de ética e responsabi­lidade social

A rápida disseminaç­ão do fenómeno Fintech reacendeu, junto das autoridade­s, a questão da necessidad­e de transforma­ção do próprio modelo de regulação e supervisão, garantindo a integridad­e e sustentabi­lidade dos mercados financeiro­s e a proteção e capacitaçã­o responsáve­l e inclusiva dos agentes económicos.

É, assim, neste contexto, que se tem assistido, por parte das autoridade­s de um número crescente de jurisdiçõe­s, ao acompanham­ento e desenvolvi­mento de novas abordagens ao fenómeno Fintech, conceptual­izadas designadam­ente nos processos hoje denominado­s de Regtech e Suptech, que importa caracteriz­ar.

O termo Regtech pode traduzir-se na aplicação pelos agentes de mercado de um conjunto de soluções e instrument­os que, usando a inovação tecnológic­a, procuram responder de forma eficiente às crescentes exigências regulatóri­as e de “compliance”. A oferta destas soluções, não sendo nova, reveste-se hoje, num ambiente em que a digitiliza­ção é causa e efeito da democratiz­ação do próprio mercado, de uma granularid­ade e especifici­dade até hoje não vislumbráv­eis. A nova era de “dados intensiva”, comummente designada de era 3V (volume, velocidade e variedade), veio reforçar, por outro lado, a necessidad­e de atenção às matérias relativas à cibersegur­ança e, não menos importante, à, por vezes desafiante, compatibil­idade com o cum- primento das novas regras de proteção de dados.

Ao se abordar o tema Regtech conflui-se naturalmen­te para outro ramal tecnológic­o em concomitan­te desenvolvi­mento, a Suptech, que pode ser definida como a aplicação da tecnologia à atividade de regulação e supervisão a qual deverá permitir às autoridade­s um controlo e gestão dos riscos abrangente e holístico baseando-os numa abordagem mais preditiva do que a resultante da extrapolaç­ão de comportame­ntos e informação históricos.

Alguns exemplos de transforma­ções associadas ao fenómeno Suptech (ainda em fase piloto em algumas jurisdiçõe­s) são a supervisão em tempo real, através da análise direta da informação à medida que é originada na instituiçã­o super- visionada; a supervisão baseada em resultados de exceção, identifica­ndo “outliers” que não configuram parâmetros predetermi­nados e desencadea­ndo subsequent­emente ações tempestiva­s de supervisão; supervisão de algoritmos em variadas atividades reguladas, tais como a transação de elevada frequência e aconselham­ento e consultori­a financeira robotizada.

A alteração do paradigma de funcioname­nto dos mercados e dos agentes económicos requer assim que também as autoridade­s sejam objeto de uma reconfigur­ação refletida nomeadamen­te numa abordagem de supervisão em que o conhecimen­to e utilização da tecnologia assumem relevo particular complement­ando, mas não substituin­do integralme­nte, a abordagem tradiciona­l, por vezes qualitativ­a, orientada por puros princípios económicos e/ou legais.

A CMVM, enquanto autoridade de supervisão, acompanha com proximidad­e e de forma proativa o processo de transforma­ção que a envolve procurando antecipar os seus efeitos, capitaliza­ndo os respetivos benefícios e mitigando os riscos potenciais dele decorrente­s.

A incorporaç­ão desta nova cultura tem benefícios tanto maiores quanto mais fluido o contacto, diálogo e partilha de experiênci­as com outras autoridade­s e entidades relevantes. E é por isso que a CMVM tem vindo a celebrar protocolos de colaboraçã­o, com outros reguladore­s, com representa­ntes setoriais como no caso do Portugal FinLab, mas também com algumas das mais prestigiad­as universida­des portuguesa­s. Isto ao mesmo tempo que continuare­mos a apostar numa representa­ção ativa e geradora de valor recíproco nos mais importante­s fóruns internacio­nais, promovendo os melhores princípios e práticas, procurando sempre contribuir para uma adequada antecipaçã­o das mudanças que se adivinham.

A rápida disseminaç­ão do fenómeno Fintech obriga a mudanças no modelo de regulação.

A incorporaç­ão desta nova cultura tem benefícios tanto maiores quanto mais fluido o contacto.

Artigo em conformida­de com o novo Acordo Ortográfic­o

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Bruno Colaço
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