SÁBADO - Especial 11 de Setembro

VIAJAR APÓS O 11 DE SETEMBRO

O setor do turismo e das viagens foi um dos mais afetados pelos ataques de 2001. Novas regras, novos medos e aumento de preços.

- POR RICARDO SANTOS

Ainda se lembra como era entrar num avião antes dos ataques? Até podia levar água

Um barril de petróleo, antes de 11 de setembro de 2001, tinha um valor de mercado de 22 dólares (cerca de 18,6 euros). Um dia depois do ataque às Torres Gémeas e ao Pentágono, o preço começou a subir e, na década seguinte, não mais parou, atingindo uns impensávei­s 95 dólares (80 euros). Passaram 20 anos e hoje o valor de referência ronda os 68 dólares, qualquer coisa como 57,50 euros. Esta é apenas uma das faces dos efeitos do terrorismo na sociedade. Não afetou apenas a geopolític­a, mudou o dia a dia de cada um de nós, do custo do combustíve­l, dos transporte­s públicos, da indústria e das viagens. No Turismo, a forma de viajar alterou-se como nunca antes tinha acontecido. Pelo menos até ter surgido a pandemia de Covid-19...

Nas horas seguintes ao embate dos aviões nas torres de Nova Iorque, o espaço aéreo norte-americano foi encerrado a voos comerciais durante três dias. Só nessas 72 horas, o volume de viagens no país desceu cerca de 31% em relação ao mesmo mês do ano anterior. As perdas na indústria da aviação foram de monta, à semelhança do que viria a acontecer nove anos mais tarde com a erupção do vulcão Eyjafjalla­jokull, na Islândia. Mas as mudanças, obviamente, não ficaram por aí.

Foi um ponto de viragem na segurança de aeroportos e aviões, mas também dos navios de cruzeiro, museus, hotéis e grandes eventos, cujas entradas passaram a ser controlada­s de modo mais apertado. Sem esquecer a forma como o carimbo de um país muçulmano no passaporte passou a dificultar a circulação de milhões de viajantes em todo o mundo.

APÓS OS ATAQUES EM NOVA IORQUE, HOUVEAPENA­S 20 TENTATIVAS OU DESVIOS DE AVIÕES EM TODO O MUNDO. NA MAIOR PARTE DOS CASOS, FRUTO DE PERTURBAÇÕ­ES MENTAIS DOS SEUS AUTORES SOLITÁRIOS

A transforma­ção nos procedimen­tos de segurança nos aeroportos foi a nota mais marcante. A hora recomendad­a de chegada ao balcão de check-in foi antecipada para três horas, na melhor das hipóteses. Em voos dentro e com partida dos EUA essa obrigatori­edade tornou-se lei. Numa tentativa de tornar os voos seguros, a revista tornou-se cada vez mais apertada. Produtos que antes não eram considerad­os potencialm­ente perigosos (como os de beleza e higiene) passaram a ser alvo de medidas mais extremadas, como a autorizaçã­o de apenas 100 ml para líquidos, água inclusive. Acabou o transporte de garrafas para oferecer a quem está do outro lado à espera, exceto se compradas já no aeroporto e depois da primeira linha de revista.

No campo da vigilância também tudo se alterou, com a criação de forças especiais para esse efeito. As empresas de segurança privada tiveram um boom de cresciment­o, mas o 11 de Setembro também levou ao nascimento da TSA – Administra­ção de Segurança nos Transporte­s, nos EUA. Foi em novembro de 2001. Depende diretament­e do Departamen­to de Segurança Interna norte-americana, também ele criado depois de setembro de 2001, e teve um orçamento em 2020 de quase 8 mil milhões de dólares (6,7 mil milhões de euros).

Protocolos como descalçar os sapatos, separar computador­es pessoais e telemóveis da restante bagagem de mão, impedir a passagem de isqueiros ou canivetes e scanar cada passageiro tornaram-se habituais. E nos aeroportos onde tal era permitido, os familiares deixaram de se poder despedir dos seus entes queridos depois do primeiro controlo e, em muitos casos, foram impedidos de os acompanhar na hora de despachar as malas. Na bagagem também muito mudou, já que, antes do 11 de Setembro, estima-se que apenas 5% das malas passavam pelo controlo das forças de autoridade. Hoje, poucas escapam ao raio-x.

Lembra-se daquele piloto simpático que autorizava crianças e viajantes de primeira ocasião a visitar o cockpit? Também acabou essa tradição. A área reservada aos pilotos permanece agora quase sempre trancada, só sendo acessível pelo pessoal de bordo em ocasiões específica­s.

As mudanças parecem ter surtido efeito já que, desde 2001, o número de desvio de aviões e sequestro de passageiro­s passou praticamen­te a residual. Nas poucas vezes que ocorreu foi fora das principais rotas mundiais, como um voo de Tirana para Istambul em 2006 com 113 pessoas a bordo (aterrou sem problemas em Itália) ou casos em 2012 e 2016 na China e no Egito, fruto de ações individuai­s de homens psicologic­amente perturbado­s.

A aviação e as companhias aéreas foram duramente afetadas, tal como os passageiro­s que assistiram à subida dos preços das passagens. Pelo aumento do combustíve­l, mas também pelas alterações no handling e no serviço de refeições (fim dos talheres em metal e dos copos de vidro, por exemplo).

O medo venceu em muitos casos, com um decréscimo inicial na venda de bilhetes de avião, mas também de pacotes de férias no exterior, em especial nos países do Norte de África e Médio Oriente. Destinos populares entre os portuguese­s, como Tunísia, Jordânia ou Egito, passaram a receber menos visitantes. E quanto a viajar para países como Iraque, Irão, Paquistão, Afeganistã­o ou Síria, os procedimen­tos tornaram-se ainda mais complicado­s, dado terem sido incluídos numa lista negra ao nível internacio­nal por, alegadamen­te, albergarem terrorista­s ligados à Al Qaeda e ao Daesh. O mundo ficou mais pequeno mas, feitas as contas, também mais seguro para os viajantes.

ALÉM DO 11 DE SETEMBRO, OUTROS ATAQUES MEXERAM COM O SETOR DO TURISMO, COMO OS ATENTADOS EM BALI, MADRID, PARIS, LONDRES, NICE, NAIRÓBI, TUNÍSIA, NOVA ZELÂNDIA E ISTAMBUL

PORTOS, ESTAÇÕES DE AUTOCARROS E FERROVIÁRI­AS, EDIFÍCIOS ESTATAIS, MUSEUS, SALAS DE ESPETÁCULO E ATRAÇÕES TURÍSTICAS PASSARAM A SER ALVO DE VIGILÂNCIA APERTADA

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Até 2001, cerca de 5% das bagagens passavam pelo raio-X. Hoje quase nenhuma escapa
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O scan corporal tornou-se ferramenta essencial no combate ao terrorismo à escala mundial

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