Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
Cadete de Matos “No 5G, o país não pode estar refém de nenhuma empresa”
O presidente da Anacom afiança que “não há ilegalidade no leilão de 5G” e que “o prazo vai ser cumprido”. Quanto à concessão dos CTT, diz ser “possível uma solução transitória”.
A Altice anunciou que por causa das regras do leilão de 5G vai suspender investimentos em Portugal. A Vodafone e a NOS vão tentar impugnar o leilão. Admite que estas regras são demasiado penalizadoras para estas operadoras?
Não são penalizadoras, até pelo contrário. Vamos ter um leilão de frequências para a quinta geração móvel mas também para desenvolver o setor das comunicações eletrónicas em Portugal, que é muitíssimo atrativo para as empresas que queiram investir nestas frequências. E vamos ter um leilão com muito espetro, vai ser o leilão na Europa com maior espetro. Esse espetro está disponível para todas as empresas que queiram investir, sejam atuais operadores sejam outros que queiram entrar no mercado português. Todos são bem-vindos, todos são necessários para a economia de mercado.
Mas a questão passa exatamente por aí: as operadoras que já cá estão queixam-se que estas regras são discriminatórias e dão vantagem a quem quer entrar.
É fácil demonstrar que não é assim. Primeiro, porque os três operadores que estão no mercado têm rede móvel própria e estão há 22 anos. O último que entrou foi em 1998 e portanto tem uma carteira de clientes vasta, consolidação do negócio e enorme vantagem competitiva. Uma empresa que queira entrar terá, necessariamente, dificuldades, tem de desenvolver a rede, fazer investimentos avultados, é um negócio que não é fácil. No leilão do 4G, a Anacom seguiu regras análogas às que foram definidas – algumas até eram mais vantajosas à entrada de operadores e não houve entrada. Os investimentos são muito avultados, portanto quem está no mercado, quem tem os clientes fidelizados, não é fácil que mudem. As empresas que estão instaladas têm portanto uma enorme vantagem competitiva e a entrada de outros é gradual e não disputa de um dia para o outro uma cota de clientes relevante. A segunda razão é que o espetro que vai a leilão é muito vasto, a componente que está reservada para quem queira licitar sendo novo é uma muito pequena percentagem face ao que os operadores hoje detêm. No 5G todos vão licitar em pé de igualdade. Mas no 3G e no 4G os espetros reservados são 8% da quantidade total de espetro que os operadores têm, portanto também aí há uma vantagem óbvia de quem está no mercado. Em terceiro lugar, o espetro do 5G, que é a maior quantidade, vai estar disponível na totalidade para todos os operadores em pé de igualdade, não há reserva. Num ponto de vista objetivo não há nenhuma razão para contestar as regras deste leilão.
Então porque é que há tanto descontentamento?
Por dificuldade em aceitar as regras da concorrência. Quem está instalado não quer ter concorrência de outros operadores. Nós ouvimos a contestação mas depois perguntamos os motivos e não são apresentados. E de facto a única razão é esta ideia de que está a haver uma facilidade para a entrada de novos concorrentes. Não sabemos se neste leilão haverá concorrentes para entrar pela primeira vez no mercado de comunicação português, mas achamos isso importante, desejável – tem acontecido noutros países europeus também com contestação. Quem está no mercado nunca quer ter a concorrência de novos operadores, é natural. Se houver três empresas que formam o oligopólio preferem que não haja mais concorrentes. Mas no caso da economia portuguesa e desta situação do setor das telecomunicações, estamos a fazer o que aconteceu na generalidade dos países europeus. E também com esta certeza: quem quiser entrar no mercado vai ter de investir, vai ter obrigações exigentes uma vez que o mercado já está dominado pelas empresas instaladas. Em três anos tem de cobrir 25% da população e em seis 50% – o que obriga a investimentos avultados e parte de uma situação muito desfavorável que é ter de captar clientes. Isso vai obrigar a que a empresa que entra no mercado tenha ofertas competitivas e customizadas. Hoje, a população portuguesa, se quiser ter um contrato só de internet competitivo, com preços equiparáveis aos de outros países europeus, não tem. Os contratos obrigam a ter telefone fixo e 65% da população portuguesa não o utiliza – paga por uma coisa que não utiliza. Paga por 200 canais de televisão e a maioria dos portugueses só vê cinco ou seis... Um novo operador vai com
“Quem está instalado não quer outros operadores a fazer concorrência, não quer reduzir margens.”
“Um novo operador terá de investir e ser competitivo na oferta. E terá obrigações exigentes.”
Os operadores estão a fazer contas ao preço de aquisição do espetro e ao investimento necessário para suprir as suas obrigações. Isso vai depender de cada operador, mas terá de haver aí um maior coinvestimento e partilha. Porque há zonas menos populosas onde é preciso chegar internet de qualidade, nalguns casos até voz móvel. É preciso fazer chegar isto a todo o território e os operadores podem fazê-lo investindo ou partilhando as suas redes e o roaming nacional.
Vamos falar de partilha. O leilão obriga as telecom a dar acesso a concorrentes durante 10 anos. Não é uma espécie de ajuda de Estado aos novos operadores?
em Portugal, como não houve em França, na Alemanha, em Itália, com condições análogas. Essa acusação não tem qualquer fundamento. A autoridade reguladora das comunicações existe para promover a concorrência e proteger os consumidores. E contribuir para o desenvolvimento do setor.
Está a dizer que as operadoras não protegem o consumidor?
Obviamente que seria mais fácil do ponto de vista de rendibilidade da empresa ter menos carteiros, estações, entregar o correio uma vez por mês... Mas tudo isso levava a uma degradação inaceitável da qualidade do serviço postal. Se a empresa demonstrou no passado que cumpria esses indicadores, não há razão para que no futuro não cumpra.
A decisão política ainda não foi tomada e estamos em novembro. Para a Anacom esta demora é indiferente?