Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Isabel Furtado “Temos jovens mulheres a querer desafiar o mundo industrial”

- —ROSÁLIA AMORIM

A presidente da TMG e CEO da Cotec é a vencedora da terceira edição do prémio BPI Mulher Empresária. Um galardão que visa reconhecer gestoras. Nesta conversa, fala da liderança no feminino e de como é gerir negócios em pandemia.

É uma grande honra, é um prémio que distingue mulheres notáveis em todo o mundo, em 43 países. E um prémio que distingue as pessoas que venceram pelo seu sucesso, pelo seu empenho, e servem de inspiração a outras mulheres.

Têm sido dados passos no sentido certo para a igualdade?

Estamos no percurso correto. É um percurso em que as mulheres vieram do nada para estarem à frente de grandes empresas. E em Portugal temos exemplos de mulheres à frente de grandes empresas. É óbvio que para uma mulher chegar ao topo tem mais entraves que um homem. Há imensos obstáculos que as mulheres têm que superar, com mais dificuldad­e que os homens. No entanto Portugal tem, em gestão de topo, números muito interessan­tes a nível europeu.

E nos cargos políticos e instituiçõ­es públicas?

Penso que os cargos de igualdade, na gestão estão mais no privado do que no público. Os cargos políticos estão maioritari­amente entregues homens... Mas também não sei se as mulheres se candidatar­am ou se escolheram uma carreira política.

O setor público não dá o exemplo na promoção da igualdade?

Não me sinto confortáve­l em ajuizar se é o Estado que não lhes dá poder ou se elas não o querem. Penso que há, no setor privado, uma maior oportunida­de para as mulheres. Há mais equidade entre homem e mulher em cargos de gestão – e não estou a falar só de gestão de topo, estou a falar das primeiras linhas e nas segundas linhas das empresas.

Como o teletrabal­ho tem afetado as lideranças?

Teletrabal­ho é uma questão social muito interessan­te. Porque o teletrabal­ho é muito inclusivo. No entanto, também é complicado. Se nós pensarmos que as pessoas estão em casa, isoladas dos seus companheir­os de trabalho – e a socializaç­ão dentro do local de trabalho também é importante – e se têm filhos com ensino à distância é uma sobrecarga brutal. O teletrabal­ho, para mim, tem uma ameaça grande. É que pode gerar mais desemprego, quando alguém chegar à conclusão que pode ir buscar teletrabal­ho a qualquer parte do mundo, temos de ter cuidado para que sejamos nós, os portuguese­s, a ocupar esses lugares antes de outros.

E as ameaças para uma líder?

O teletrabal­ho não é possível em todas as profissões. As máquinas precisam de pessoas para trabalhar. Nós optámos por fazer uma semana de teletrabal­ho e uma presencial, para não perdermos o contacto. Troca de ideias é importante. Para mim, o teletrabal­ho não é uma solução generaliza­da. Retina-nos alguma capacidade imaginativ­a. É muito cansativo levar reuniões em cima de reuniões por meios telemático­s. E as casas não foram preparadas para isso, o teletrabal­ho pode ser um pouco invasor dessa nossa privacidad­e.

Como é que a TMG se reinventou? Começou a fazer máscaras?

Nós fazemos de tudo um pouco e do que é preciso. No têxtil, temos a TMG dividida em áreas de workwear, moda e saúde e há uma disparidad­e grande. A moda está praticamen­te parada e há grupos de têxtil a sofrer muito com isso, é uma área quase parada. É preciso que se apoie muito bem a indústria, porque as empresas que fecharem agora não abrem mais. Na área do workwear e da saúde fazemos o que todos têm vindo a fazer: máscaras. Temos uma diversidad­e de máscaras e exportamos. Mas não vai durar muito tempo, toda a gente está a fabricar máscaras. Além disso, as costureira­s portuguesa­s são altamente qualificad­as para fazer máscaras, que não lhes ensinam nada de grande valor acrescenta­do. Está a ajudar neste momento a indústria têxtil a sobreviver, mas não é solução para durar muito mais. Não é um negócio que se queira ter.

As empresas têm lamentado a lentidão na certificaç­ão máscaras. Como comenta?

É preciso ver que as nossas estruturas de controlo e de experiment­ação e de acreditaçã­o para máscaras não existiam. De repente houve uma invasão para testes e aprovação de máscaras. Em Famalicão, o CITEVE foi pioneiro. Era interessan­te ver que a fila era maior para o CITEVE do que para o teste Covid mesmo ao lado. O CITEVE não estava preparado para a enchente. E, por isso, é longo e é demorado. E depois uma máscara está inicialmen­te certificad­a para cinco lavagens, e depois para 20 e depois para 50. O que significa que a mesma máscara tem de ir a uma máscara de lavar 50 vezes. Portanto, a capacidade esgota-se.

Quando assistimos a sessões no Parlamento vemos muitos dos deputados com máscara descartáve­l. Deveria o governo promover uma campanha de sensibiliz­ação para o uso de máscaras reutilizáv­eis? Não só pela indústria têxtil, mas pelo ambiente...

Eu sou completame­nte contra as máscaras descartáve­is. Para os profission­ais de saúde deixemos as máscaras descartáve­is. Eu tenho uma máscara reutilizáv­el [na mão mostrou uma portuguese mask amarela] e é isto que eu preciso de ter. Até porque tenho uma máscara que me pode custar 3 euros, ou 4 euros, e lavá-la pelo menos 50 vezes. O que quer dizer que se, por exemplo, tivéssemos gasto 10 euros por cada aluno do ensino eles ficariam com quatro máscaras e servia praticamen­te o ano inteiro, pelo menos um semestre.

É um problema gravíssimo o que está a acontecer com as máscaras descartáve­is. Portugal já gastou 200 milhões de euros em máscaras. Se nós formos ver quantas dessas se poderiam reconverte­r em máscaras reutilizáv­eis, salvaria muito da indústria têxtil neste momento. Nós temos vindo a batalhar para um ambiente mais limpo, para evitar o single use, e agora, de repente, estamos a usar descartáve­is – duas, três por dia – que além de ser um custo imenso, vai ter um grande impacto ambiental. Não há necessidad­e nenhuma de usar máscaras descartáve­is na população. Eu sou contra, mesmo.

Nas exportaçõe­s, em agosto o indicador melhorou mas as encomendas caíram em setembro e outubro. É o vosso caso?

É verdade que houve ali um ânimo em julho e agosto e em setembro realmente arrefeceu. Porque com a Europa a confinar as pessoas voltam a casa, as lojas voltam a fechar menos horas e, portanto, a indústria têxtil tradiciona­l tem vindo a ter algum desacelera­mento e mesmo, eu diria, adiar encomendas. O período começou a ser verdadeira­mente complicado. Os meus parceiros da indústria têxtil queixam-se, com razão, que têm as encoporque mendas paradas, suspensas ou adiadas.

E estão suspensas por tempo indetermin­ado?

Ninguém sabe dizer. Uma coisa... a única coisa que esta pandemia nos ensinou é que nada é certo. Tudo depende se a recuperaçã­o, que estávamos à espera que fosse em V, depois estava a ser em U e, de repente, voltou para W. Antes de haver uma vacina eficaz não sabemos e é muito difícil fazer previsões de como será a recuperaçã­o.

No dia em que estamos a conversar o primeiro-ministro anunciou mais uma série de apoios para PME. Os apoios que têm sido lançados são suficiente­s ou é preciso mais?

“Usar mais máscaras reciclávei­s pode salvar a indústria têxtil.” “Encomendas de têxtil para exportação estão a ser adiadas, sem data. No automóvel está animado.”

Se são suficiente­s? Nunca são. Porque nós estamos a viver um momento extremamen­te complexo e eu penso que só temos duas alternativ­as: ou realmente injetamos dinheiro na economia e nas em

Eu não sei se é o TGV, exatamente. Eu digo que tem que melhorar a ligação Porto/Lisboa.

Considera que Portugal se atrasou a preparar a segunda vaga?

É fácil dizer que Portugal não se preparou, mas e os outros países? Também não se prepararam? Ninguém se preparou. Nós todos achamos que isto ia ser curto e já tínhamos passado o pior. Não sei se é uma questão de antecipar ou se é de uma questão de ... nem sequer ponderar o risco que ia acontecer.

O estado de emergência suave será suficiente? Vai ao encontro das preocupaçõ­es das empresas?

Nós não podemos ter um lockdown da economia. Porque senão, não morremos da doença morremos da cura. Nós temos de ter grande responsabi­lidade social e com regras, que nós não gostamos, mas que sejam, mais ou menos, justas para todos.

Não faz sentido fechar – e não podemos fechar por completo – porque a restauraçã­o, o turismo, está muito mal e não pode ficar pior. Mas, também não podemos ter, e basta olharmos e passearmos nas grandes cidades que vemos os jovens, todos em grandes grupos, sem grandes cuidados a conviver. Temos que ter uma maior responsabi­lidade social. E realmente penso que é importante focarmo-nos na solução, porque senão vamos mesmo de ter, obrigatori­amente, o confinamen­to agravado.

Conhece bem a China, onde costumava viajar em negócios. Como tem acompanhad­o a recuperaçã­o económica da China? O que podemos aprender com isso?

covid. Eu acho que isso nos veio ajudar um pouco. Não sabemos é se esta grande procura momentânea se irá traduzir em grandes negócios posteriore­s. Também não sabemos se as empresas estão a armazenar produto para uma eventual desacelera­ção, ou eventual shutdown da economia outra vez.

Como estão os números das exportaçõe­s da TMG Automotive?

Vamos acabar o ano 15% abaixo do orçamento inicial, o que é um número agradável. Mas, é como eu digo, preocupa-me mais se isto é sustentáve­l, se é para continuar.

Como presidente da COTEC que apelo deixa aos empresário­s?

Os operadores interessad­os em obter licenças do 5G têm 15 dias, a partir desta segunda-feira, para apresentar as respetivas candidatur­as à Anacom, segundo o regulament­o do leilão da quinta geração móvel publicado hoje em Diário da República. O presidente da Anacom, Cadete Matos, disse esperar que o leilão do 5G encerre em janeiro e que as licenças sejam atribuídas no decorrer do primeiro trimestre d2 2021.

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