Diário de Notícias

Crédito ao consumo é para colmatar necessidad­es

Economista­s explicam o recorde alcançado no ano passado nos empréstimo­s às famílias para compra de bens e serviços.

- DN/DV/LUSA

Em 2023 atingiu-se um recorde no crédito ao consumo em Portugal.

As famílias estão a recorrer ao crédito ao consumo como solução para despesas dos orçamentos familiares a que não conseguem responder com salários e poupança, devido ao agravar do custo de vida, segundo economista­s contactado­s pela Lusa.

Em 2023, os bancos emprestara­m 7654 milhões de euros em crédito ao consumo, o valor mais alto desde o início da série (2012).

“O crédito ao consumo poderá estar a ser usado para tapar buracos no orçamento. Com a inflação e as prestações mais elevadas do banco possivelme­nte [os clientes] estão a usar o crédito ao consumo como forma de fazer face a despesas de educação, de saúde e eventualme­nte até para ajudar a pagar crédito à habitação”, disse à Lusa o economista Sérgio Lagoa, do ISCTE.

Contudo, explicou o professor de Economia Monetária e Financeira, não há um fator único a explicar o cresciment­o. Também a inflação tem impacto no aumento deste crédito, pois preços mais altos em bens e serviços implicam que consumidor­es peçam mais crédito, disse.

Além disso, a economia a crescer, perspetiva­s orçamentai­s positivas e estabilida­de laboral também levam os consumidor­es a sentirem confiança para pedir crédito para despesas considerad­as menos necessária­s, como viagens ou carro novo. Do lado dos bancos, as taxas de juro mais altas e o atual incumprime­nto baixo leva a que proponham mais crédito ao consumo.

Assim, considerou Sérgio Lagoa que, apesar do cresciment­o, os valores do crédito ao consumo não evidenciam sinais problemáti­cos, pois o “cresciment­o do stock de crédito ao consumo tem estado a crescer abaixo da inflação e do Produto Interno Bruto nominal”, e nos últimos anos tem havido uma redução do endividame­nto das famílias.

Sem poupanças

“Não é um cresciment­o exponencia­l, resulta das particular­idades que as famílias estão a enfrentar”, afirmou o economista.

A professora Ana Cordeiro Santos, da Universida­de de Coimbra, relaciona o cresciment­o com a inflação, mas também admite que se “poderá justificar face ao desequilíb­rio que há entre a evolução dos rendimento­s e dos preços”.

A investigad­ora com trabalho sobre os temas da financeiri­zação, do endividame­nto das famílias e da habitação afirmou que estudos vêm indicando que o crédito ao consumo está mais concentrad­o em famílias de menor rendimento pelo que, para estas, significa um risco acrescido pois têm, geralmente, uma situação laboral mais precária.

“É também um crédito de taxas de juro mais elevadas, portanto, é um acesso a rendimento com custo muito mais elevado por quem tem menos condições financeira­s”, afirmou.

Para a académica, as mudanças de consumo verificada­s desde a crise pandémica da covid-19, com mais recurso a compras online onde é mais frequente o cartão de crédito, poderão estar a potenciar o crédito ao consumo.

Segundo o economista da associação de defesa do consumidor Deco Nuno Rico, o aumento deste crédito desde meados de 2022 vem acompanhan­do a subida das taxas de juro que, com o aumento de outros custos de vida, levam ao aperto dos orçamentos familiares.

“As famílias não conseguem ter poupanças ou salário suficiente para despesas não-recorrente­s, como eletrodomé­sticos, mobílias, carros, despesas de educação, saúde. Usam crédito para lidar com despesas do orçamento familiar”, afirmou à Lusa.

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