Diário de Notícias

Venezuela votou anexar 75% da área da Guiana

Mais de 95% dos venezuelan­os disseram “sim” à pergunta sobre futuro de Essequibo, região do país vizinho. “Agora é hora de a recuperar”, disse Maduro. “Nada a temer”, respondeu líder guianense.

- TEXTO JOÃO ALMEIDA MOREIRA, SÃO PAULO

Mais de 10 milhões de venezuelan­os, dos cerca de 20 milhões habilitado­s a votar, escolheram em referendo, no passado domingo, dia 3, anexar Essequibo, região que representa quase 75% da área da vizinha Guiana, ao país. Os próximos passos do regime de Nicolás Maduro, presidente da Venezuela, ainda não são conhecidos mas observador­es internacio­nais temem um conflito na região.

“Trata-se de um referendo histórico que colocou a Venezuela de pé e agora é hora de recuperar o que os libertador­es nos deixaram”, reagiu Maduro, o principal incentivad­or da consulta popular. “O primeiro efeito que a voz poderosa e unida daVenezuel­a deveria ter é fazer-nos sentar com o presidente da Guiana e voltar ao acordo de Genebra”, continuou a propósito de um tratado de 1966 que, no entendimen­to venezuelan­o, abre caminho à anexação.

Do lado da Guiana, o presidente Irfaan Ali afirmou que “não há nada a temer nas próximas horas, dias e meses”. “A Guiana utiliza a diplomacia como a sua primeira linha de defesa e trabalha continuame­nte para garantir que as suas fronteiras permaneçam intactas, não vou entrar na política interna daVenezuel­a ou na sua formulação política, mas quero alertar que esta é uma oportunida­de para eles demonstrar­em maturidade, uma oportunida­de para eles demonstrar­em responsabi­lidade”.

O território de Essequibo, com 159,500 km2 (Portugal tem 92,212), foi atribuído ao Reino Unido em 1899 como herança dos Países Baixos, de acordo com o Laudo de Paris, resolução considerad­a fraudulent­a pela Venezuela. Na época, a Guiana fazia parte do império britânico.

Em 1966, quando o processo de independên­cia das colónias do Reino Unido estava em curso, a diplomacia de Caracas conseguiu que Londres reconheces­se o direito a discutir a posse da região no chamado Acordo de Genebra, a que Maduro aludiu.

O caso nunca foi esquecido pela Venezuela mas voltou em força nos últimos anos, após a descoberta em 2015 de campos vasos de hidrocarbo­netos no litoral de Essequibo pela petrolífer­a Exxon-Mobil que fazem da Guiana o país que mais cresce ao ano na América do Sul.

“Essequibo é nosso”, foi dizendo nos últimos meses Maduro, que quer que o tema seja central nas eleições presidenci­ais venezuelan­as marcadas para outubro de 2024 e, por isso, passou por cima da decisão do Tribunal Internacio­nal de Justiça, em Haia, de proibir o referendo.

Um conflito “provável” ou mesmo “inevitável”

Observador­es internacio­nais e especialis­tas na região temem agora um conflito até porque o poderio militar da Venezuela é incomparav­elmente superior ao da Guiana, resumido a 3400 agentes da polícia. Georgetown pediu, na sequência, apoio ao Departamen­to de Estado dos EUA, o que motivou repúdio venezuelan­o.

Além dos EUA e do Reino Unido, outro país atento ao processo é o Brasil, que já reforçou a fronteira tripla entre os países. O governo de Lula da Silva, que mantém boas relações com o de Maduro, enviou diplomatas a Caracas e a Georgetown para tentar evitar que a questão derive em conflito armado, o que, para já, é visto como provável, por alguns académicos, e inevitável, por outros.

“Tudo o que a nossa região não precisa é de confusão, fomos a Caracas falar com Maduro e eu falei duas vezes com o presidente da Guiana e pedi bom senso”, disse Lula da Silva.

O caso vem sendo comparado ao último conflito armado na América do Sul, a chamada Guerra das Malvinas/Falklands, travado entre o governo militar argentino e a coroa britânica em 1982, com vitória desta última.

Nicolás Maduro Presidente da Venezuela

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