Evelise Veiga “Posso beneficiar com o adiamento dos Jogos Olímpicos”
Especialista em salto em comprimento, disciplina em que ainda ambiciona bater o recorde nacional de Naide Gomes, Evelise Veiga está qualificada há mais de ano e meio para os Jogos de Tóquio e, à beira dos 25 anos, diz que o adiamento da sua estreia olímpi
“Em março, quando entrámos em confinamento, fiquei sem instalações para treinar e tive de improvisar um miniginásio em casa.”
Está qualificada para os Jogos Olímpicos de Tóquio desde 1 de junho de 2019. Como tem sido a sua preparação em tempos de pandemia?
Não tem sido fácil, pois vivemos num período de grande incerteza. No meio de tantas restrições, que considero extremamente importantes para tentarmos controlar a pandemia, o facto de não saber se terei instalações para treinar, competições e meios de recuperação, causa uma grande instabilidade, mas temos feito os possíveis para que a preparação siga dentro da normalidade.
É fácil manter o foco e a motivação quando esse objetivo está tão distante?
Quando o nosso principal objetivo é estar presente nos Jogos Olímpicos e vemos que esse momento está para chegar, não é difícil manter o foco, visto que se realizam de quatro em quatro anos e, no meu caso, já aguardo este momento há alguns anos. O facto de já estar qualificada permite fazer uma gestão mais equilibrada do calendário competitivo, focando-me nas minhas obrigações com o Sporting e noutras competições de nível internacional.
Que medidas de segurança sanitária tem adotado nos seus treinos?
Existe o cuidado na desinfeção tanto a nível pessoal como dos materiais utilizados, a utilização da máscara sempre que não estou a treinar e evitar ao máximo a partilha de materiais.
Ao longo destes meses de covid-19, esteve algum tempo sem treinar ou com treinos condicionados? De que forma tentou contornar o confinamento e o encerramento de alguns locais para manter a forma?
Em março, quando entrámos em confinamento, fiquei sem instalações para treinar e tive de improvisar um miniginásio em casa onde fazia musculação, mas procurando sempre fazer a maior parte do treino no exterior. Pouco tempo depois tive a sorte de poder voltar a fazer os treinos no centro nacional de lançamentos, mas em momento algum parei de treinar. Entrámos agora em novo confinamento. Tem instalações desportivas disponíveis para treinar? Quando não estou em estágios costumo treinar no Estádio Municipal de Leiria. Ainda não tenho nenhuma indicação se as instalações onde treino vão ou não fechar. O facto de ser atleta de alto rendimento permite-me, à partida, treinar dentro da normalidade. Desde que a pandemia começou têm existido menos provas. Isso é bom ou mau tendo em conta o objetivo Tóquio?
Penso que isso varia de atleta para atleta. Tentei ver as coisas do lado positivo, ou seja, aproveitei o facto de haver poucas competições para trabalhar e focar-me nos meus pontos fracos. Porém, para a modalidade é extremamente penalizador, porque a competição é que alimenta o sonho. Infelizmente, muitos jovens atletas podem desmotivar e desistir da modalidade. Em relação à data dos Jogos, preferia que tivessem sido em 2020 pelo momento que atravessava ou julga que está melhor e mais madura para os enfrentar em 2021? Infelizmente em 2020 não havia condições para se realizarem os Jogos, pois não conseguiam manter os atletas nem os espectadores em segurança. A meu ver posso beneficiar com mais um ano de treino e preparação para me poder apresentar ao meu melhor nível. Certamente estarei uma atleta mais experiente e mais bem preparada do que em 2020.
Como é que tem gerido a ansiedade tendo em conta toda esta indefinição?
Os grandes atletas são pacientes por natureza ou acabam por aprender a ser. Neste momento não ganhamos nada em estar a sofrer por antecipação, temos de continuar a fazer o nosso trabalho e esperar para que esta situação se torne mais clara. Não tenho perdido muito tempo a pensar no que vai acontecer amanhã, mas sim no que posso controlar, que neste momento é continuar a treinar de forma a estar preparada para as competições.
Tem como melhor registo no triplo salto 14,32 metros, está a
33 centímetros do recorde nacional. Tornar-se recordista nacional é uma das principais metas a breve prazo?
Como atleta tenho consciência de que os recordes são feitos para serem batidos, portanto vejo isso como algo alcançável.
Esse salto de 14,32 metros no Meeting da Maia foi o que a levou aos Jogos Olímpicos. O que sentiu quando percebeu que tinha assegurado a qualificação?
Já era um objetivo traçado tentar a qualificação para os Jogos, no entanto, não esperava que fosse acontecer tão cedo. De certa forma, foi um alívio.
O meu principal objetivo passa, sem dúvida, por conseguir um lugar na final do triplo salto. A partir daí, estando na final, tudo pode acontecer. O meu maior adversário pode ser o facto de ser a minha estreia, mas sou uma atleta muito competitiva e certamente estarei ao nível das melhores.
No Sporting tem ao seu lado a recordista nacional Patrícia Mamona. Treina com ela? Tê-la ao seu lado teve algum impacto no seu crescimento?
Tenho o privilégio de partilhar alguns treinos com ela quando estamos em estágio e disputar algumas competições juntas, o que tem sido bastante enriquecedor.
O triplo salto do Sporting sofreu recentemente uma baixa de peso, Nélson Évora, que rumou ao Barcelona. Ficou triste com a saída dele? Costumava estar e treinar com ele?
Nunca tive a oportunidade de treinar com o Nélson Évora, mas tive o prazer de partilhar alguns momentos com ele, nomeadamente em
competições nacionais e internacionais. Desejo-lhe as maiores felicidades.
Como descobriu que tinha jeito para o atletismo, para os saltos e mais especificamente para o triplo salto?
O atletismo na minha vida surgiu através de uma colega da escola. Decidi experimentar e acabei por gostar. Comecei mais nas provas de estrada e corta-mato. Descobri a pista quando fui fazer uma competição e foi aí que acabei por descobrir as disciplinas técnicas. Gostei muito e pedi ao meu treinador para nos dedicarmos um pouco mais a elas. Mais tarde, fui para a Juventude Vidigalense e aí surgiu o triplo salto.
Com esta aposta no triplo salto, o salto em comprimento vai ficar para trás?
Depois da marca de qualificação para os Jogos no triplo salto, comecei a dedicar-me mais a esta disciplina, mas o salto em comprimen
to é uma grande paixão. Sinto que ainda não consegui concretizar alguns dos meus objetivos no salto em comprimento. Espero conseguir conciliar ambas as disciplinas por mais alguns anos. Sonho em bater o recorde nacional da Naide Gomes [7,12 m], que é uma marca extraordinária, nada fácil, mas que desde que comecei que gostaria de lá chegar. Por isso, penso que não é o momento de me dedicar só ao triplo salto.
A julgar por algumas declarações suas, até prefere o salto em comprimento...
Tenho uma enorme paixão pelo salto em comprimento, porque foi onde comecei a dar os meus primeiros passos a nível nacional e internacional, onde já obtive grandes resultados. Tenho ainda muitos objetivos por cumprir, não quero ficar por aqui. O triplo salto é uma disciplina técnica mais exigente do que o salto em comprimento e claro que também requer muito treino. Se há uns anos o meu corpo não estava tão preparado para os impactos do triplo salto, agora tenho mais anos de trabalho.
Está a tirar uma licenciatura em Gestão no Politécnico de Leiria. Como concilia com o atletismo e o que gostava de fazer profissionalmente quando a carreira terminar?
Conciliar o desporto de alta-competição com uma licenciatura nem sempre é fácil, mas infelizmente a carreira de um atleta tem um prazo de validade. Quando esse dia chegar temos de ter um plano B. O segredo é a força de vontade, a organização, e perceber qual é a nossa prioridade a cada momento. Tenho a consciência de que nem sempre será fácil, mas com paciência e dedicação tudo se consegue. Gostava de trabalhar e explorar algo na área de gestão.
“Nos Jogos Olímpicos, o meu principal objetivo, sem dúvida, passa por conseguir um lugar na final do triplo salto. A partir daí, estando na final, tudo pode acontecer.”