Um ano quase perdido
Assinalou-se neste mês de outubro um ano desde que voltou a repetir-se mais uma tragédia com incêndios que provocaram a morte de dezenas de pessoas, destruíram casas e empresas e dizimaram floresta um pouco por todo o país. Para um país ainda em choque com o que se tinha passado quatro meses antes nos concelhos de Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera, parecia impensável que tudo voltasse a repetir-se. Mas repetiu-se.
E a incapacidade de o governo reagir para a reparação dos enormes prejuízos de vária ordem foi flagrante. Desde logo, recorde-se que foi necessário que o PSD tivesse uma iniciativa na Assembleia da República para o governo avançar com as indemnizações às vítimas, algo que era da mais elementar justiça. As falhas do Estado tinham sido várias, como de resto veio a ser demonstrado nos relatórios técnicos produzidos a propósito da tragédia.
Mas foi também no processo de reconstrução que se verificou um atraso inacreditável. Quase um ano e meio volvido, ainda há quem tenha perdido a sua casa de primeira habitação sem que esta tenha sido reconstruída. Enquanto isso, o governo foi, no mínimo, muito pouco diligente a prevenir, a despistar ou a averiguar as alegadas irregularidades nos processos de reconstrução das casas. Ainda para mais quando a solidariedade gerada em torno da tragédia exigia que fosse exemplar a aplicação do dinheiro de todos aqueles que se mobilizaram para ajudar as vítimas.
Infelizmente, aprendeu-se pouco com o caos como foi gerido o processo de Pedrógão Grande. Nesta semana ficámos a saber que mais de 530 casas destruídas nos fogos de outubro continuam por intervencionar.
Da mesma forma, um ano depois pouco ou nada aconteceu para reparar o estado em que ficou o pinhal de Leiria. Se os especialistas apontam para que sejam necessários 150 anos para voltar a ver o pinhal conforme estava antes da tragédia de 2017, a sensação de quem olha para o pinhal de Leiria nos dias de hoje é que 2018 foi um ano perdido para o objetivo ambicioso e de tão longo prazo que temos pela frente. Junta-se a isto a crónica falta de meios a que o governo não dá resposta. Como reconheceu o próprio presidente do ICNF – Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, há pelo menos 30 operacionais e mais um técnico superior em falta no pinhal de Leiria. Acresce ainda a preocupação com as espécies invasoras que cada vez mais ocupam de forma mais preocupante o território. Está quase tudo por fazer. Desde as estradas da Mata que continuam conforme foram deixadas pelo fogo, cortadas, as casas dos guardas-florestais que continuam queimadas, aos pinheiros que por lá ficaram. Salvam a honra do convento os vários casos de iniciativas de responsabilidade social que foram já contribuindo para a reflorestação, como algumas empresas e pessoas particulares que se associaram a esta causa. Mas estas ações, infelizmente, são uma gota no oceano, se olharmos para os 11 mil hectares que compõem a Mata.
Foi, por isso, com alguma estupefação que nesta semana vi uma espécie de congratulação do governo, na sequência do Conselho de Ministros, pelo sucesso deste ano em matéria de combate aos fogos. Esquece-se o governo que de 2017 continua quase tudo por fazer. E esquece-se também que em 2018 Monchique ainda nos está bem presente na memória. Olhando para trás, 2018 foi um ano quase perdido.