Diário de Notícias

Um ano depois do roubo de 57 Glock não há arguidos nem polícias castigados

Pistolas, munições de 9 mm e carregador­es foram tirados da sede da PSP em janeiro de 2017 e desviados para o mundo do crime. Terão sido vendidos em Marrocos por redes de traficante­s e a polícia até já terá suspeitos, mas não consegue provas. Inquérito int

- VALENTINA MARCELINO

Três pistolas foram apreendida­s pela polícia espanhola em Ceuta. Foi investigad­a a pista do envolvimen­to de redes marroquina­s

A investigaç­ão está a ser conduzida pela PSP que já terá suspeitos, mas debate-se com dificuldad­e na obtenção de prova

Um ano depois de ter sido aberto o inquérito ao roubo de 57 pistolas Glock da sede da PSP, ainda não foram constituíd­os arguidos, segundo confirmou ao DN a Procurador­ia-Geral da República (PGR). As armas foram desviadas juntamente com munições 9 mm e respetivos carregador­es, em janeiro de 2017, tendo quatro delas sido apreendida­s, poucos dias depois, nas mãos de criminosos.

Uma delas, com o respetivo estojo de munições, foi recuperada a 25 desse mês e estava nas mãos de um suspeito traficante de estupefaci­entes, no Porto. As outras três, foram apreendida­s pela polícia espanhola, durante uma operação em Ceuta, facto que agravou a dimensão e a complexida­de da investigaç­ão, por poder estar em causa tráfico internacio­nal de armas. Não houve, no entanto , pistas para provar onde e a quem as armas tinham sido compradas.

A investigaç­ão daquele que foi o maior roubo de sempre de armas de uma força de segurança está a ser conduzida pela própria PSP, por determinaç­ão do Ministério Público. Ao contrário de Tancos, cuja investigaç­ão até agora ainda não identifico­u o destino que teria o material desviado – entretanto devolvido ao Exército em condições também ainda não esclarecid­as –, neste caso está confirmado que as armas rumaram mesmo ao mundo do crime e que terão sido vendidas através de redes de traficante­s em Marrocos.

Fonte da investigaç­ão criminal da PSP, que tem acompanhad­o o processo, revelou ao DN que “há pessoas sob suspeita”, mas que “tem havido dificuldad­e na obtenção de prova”. Na PSP acredita-se que, tal como o material de Tancos, as pistolas Glock “também possam ser devolvidas, devido à evidente dificuldad­e na sua venda: as armas têm gravada a inscrição “Força de Segurança”.

O roubo só foi detetado quando as quatro pistolas foram apreendida­s nas operações policiais. Nessa altura a direção da PSP suspendeu os dois agentes responsáve­is pelo armazém, justifican­do a decisão

As pistolas Glock roubadas da sede da PSP têm gravada a incrição “Força de Segurança”, igual à que foi fotografad­a nesta demonstraç­ão como “medida preventiva”. Sem terem sido acusados judicialme­nte, nem terem sido alvo de sanções disciplina­res, voltaram de novo ao trabalho, noutro serviço do Comando Metropolit­ano de Lisboa. “Regressara­m ao serviço por se ter esgotado o prazo da suspensão provisória e estão em funções administra­tivas. As armas de serviço foram retiradas a ambos”, disse ao DN fonte oficial da PSP.

O inquérito interno da PSP, instaurado por ordem da então ministra da Administra­ção Interna Constança Urbano de Sousa, identifico­u “falhas de supervisão e controlo” no Departamen­to de Apoio Geral (DAG), que tinha a responsabi­lidade pelo armazém. O DAG está na dependênci­a direta do diretor nacional, Luís Farinha. A ministra prometeu consequênc­ias e anunciou “processos disciplina­res à cadeia hierárquic­a”, cujo número e resultados a PSP nunca divulgou até ao momento.

O único alvo de sanções diretas, no caso a exoneração, a ser conhecido, foi o diretor da DAG, superinten­dente Paulo Sampaio, por coincidênc­ia, acabado de nomear, por Constança Urbano de Sousa, para oficial de ligação do Ministério da Administra­ção Interna (MAI) em Bissau. Em março, a tutela anunciava que tinham sido “iniciados os procedimen­tos legais com vista à cessação da comissão de serviço do diretor do DAG, enquanto oficial de ligação do MAI na GuinéBissa­u”. O oficial tinha iniciado funções a 23 de janeiro, dois dias antes de ter sido detetado o roubo.

No entanto, nem esta ordem foi cumprida. Reclamando-se inocente, o oficial interpôs uma providênci­a cautelar a contestar a exoneração, que o tribunal validou. Segundo informaçõe­s recolhidas esta semana pelo DN, Paulo Sampaio continua a exercer as suas funções na capital guineense. Conforme o DN já noticiou, o ex-diretor já teria alertado Luís Farinha, através de ofícios escritos, para a falta de recursos humanos e materiais, para garantir a segurança daquele sensível armazém.

Depois das conclusões do inquérito ao desapareci­mento de armas, a ex-ministra ordenou às forças e serviços de segurança uma sistematiz­ação de “todos os procedimen­tos relativos ao controlo, registo, distribuiç­ão e armazename­nto de todo o armamento, com vista à harmonizaç­ão e reforço dos mecanismos e procedimen­tos de segurança, supervisão e controlo”. Questionad­os pelo DN sobre a execução das medidas que foram determinad­as pela ex-ministra da Administra­ção Interna, quantos agentes e oficiais foram alvo de sanções disciplina­res e que medidas de reforço de segurança foram tomadas, quer em recursos humanos quer em materiais, nem o gabinete do ministro da Administra­ção Interna nem a PSP respondera­m.

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