Chumbo às listas transnacionais mas presidente francês não desiste da ideia
Eurodeputados aprovaram ontem em Estrasburgo a nova composição do Parlamento pós-brexit
O Parlamento Europeu aprovou ontem a sua composição pós-brexit, mas chumbou a controversa proposta de criar listas transnacionais de eurodeputados e a ideia foi eliminada do texto que vai ser enviado para análise no Conselho Europeu. Mas isso não significa que tenha morrido de vez. Pode ficar apenas à espera de melhores dias. Até porque um dos seus principais defensores, o presidente francês, Emmanuel Macron, insiste nela, mesmo depois de conhecer o resultado da votação dos eurodeputados em Estrasburgo. “A França vai continuar a defender esta ideia nos próximos meses e anos, porque ela irá contribuir para fortalecer a democracia europeia ao provocar discussão sobre os desafios europeus e não apenas sobre assuntos nacionais durante as eleições europeias”, afirma um comunicado, divulgado pelo Eliseu.
A nova composição da eurocâmara reduz o número de eurodeputados de 751 para 705 após a saída do Reino Unido da União Europeia, prevista para março de 2019. As europeias são em maio. Dos 73 lugares de deputados atribuídos aos britânicos, 27 serão redistribuídos por países que se considerou estarem sub-representados, como França, Espanha ou Holanda, 46 ficarão em espera, disponíveis para quando novos países aderirem ao clube europeu. Portugal mantém os atuais 21. A proposta chumbada, com 368 votos a favor, 274 contra e 34 abstenções, previa que parte dos lugares britânicos fosse direcionada para listas transnacionais com deputados de vários Estados membros agrupados por famílias partidárias. Mas a ideia está longe de ser consensual e, se não chumbasse agora no Parlamento, provavelmente chumbaria depois no Conselho, onde há divisão entre blocos de países, como os do Sul e os do Grupo de Visegrado, por exemplo, tornando praticamente impossível a necessária decisão unânime.
“Após esta decisão do Parlamento é altamente improvável que o Conselho avance nessa direção. Não vejo que esta ideia tenha futuro, num horizonte próximo pelo menos”, disse aos jornalistas o eurodeputado português Pedro Silva Pereira, que com a polaca Danuta Hübner é relator da proposta da nova composição da eurocâmara. O texto foi aprovado e a decisão final recolheu 431 votos a favor, 182 contra e 61 abstenções. “Estou satisfeito porque o relatório foi aprovado pela larguíssima maioria do Parlamento e isso dirige uma mensagem clara ao Conselho sobre a proposta para nova distribuição dos lugares depois do brexit. É uma proposta justa e que preserva os interesses de Portugal”, disse o socialista, esclarecendo que sempre defendeu que a decisão sobre a criação de listas transnacionais cabia ao Conselho. E que a sua opinião sobre o assunto sempre coincidiu com a do primeiro-ministro, António Costa.
Um dos críticos das listas transnacionais era Paulo Rangel. “Usámos o método do Congresso norte-americano, que é o de fazer campanha entre os deputados”, disse aos jornalistas, à saída do plenário, enquanto ia trocando com Silva Pereira umas frases mais provocatórias e humoradas. Para o eurodeputado do PSD “é um disparate afirmar que quem é contra as listas transnacionais não é europeísta. Eu sou federalista e é por isso que sou contra. Não há nenhuma federação que tenha um círculo único. Pelo menos nesta altura, penso que isto será a morte das listas transnacionais porque envia um sinal forte ao Conselho. Os Estados que são contra têm agora um argumento forte em relação aos que são a favor”. Para Rangel, as listas transnacionais são um “Frankenstein constitucional”.
Nuno Melo, do CDS-PP, disse-se satisfeito com o resultado da votação. “Desde 2015 que fomos sempre contra as listas transnacionais que são, em si, um processo pouco democrático”, afirmou, referindo-se à proposta sobre a nova lei eleitoral europeia votada em novembro de 2015 pelo Parlamento e que, já na altura, falava em listas transnacionais. Na terça-feira, em Estrasburgo, a líder do CDS-PP, Assunção Cristas, afirmara que, nas europeias de 2019, concorrerá sem o PSD. Em sentido oposto, José Inácio Faria, do Partido da Terra, disse-se favorável às listas pan-europeias e recusou o argumento de que beneficiariam os grandes países ou os populistas. “É preciso ver que eu sou um eurodeputado, não um deputado português, sou um português eleito para um parlamento transnacional que é o Parlamento Europeu.”
Já João Ferreira, do PCP, afirmou que o debate sobre as listas “é um biombo para esconder o resto e o resto é a injustiça na repartição de lugares. Portugal e outros países deveriam ser compensados pelos eurodeputados que perderam”. O eurodeputado comunista lembrou que o país já chegou a ter 25 eleitos e, com os sucessivos alargamentos, viu o número reduzido.
“A proposta de redistribuição de lugares que foi apresentada é séria e traduz mais justiça em relação ao que deveria ser o Parlamento Europeu”, considerou Marisa Matias, do Bloco de Esquerda, esclarecendo que, mesmo assim, é contra a manutenção dos 751 deputados no pós-brexit. Quanto às listas transnacionais constatou que “a partir do momento em que o Parlamento tem uma posição contra isso não há condições para o Conselho recuperar a ideia”. É esperar para ver. A jornalista viajou a convite do Parlamento Europeu