Diário de Notícias

Procura- se

- ALBERTO GONÇALVES Sociólogo Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo acordo ortográfic­o

Nas últimas eleições britânicas alguma imprensa discutiu os prós e os contras dos outdoors políticos. Concluiu- se que os primeiros são escassos ( que espécie de tontinho decide o voto fundamenta­do num cartaz?) e que os segundos são imensos ( na época das “redes sociais”, os cartazes são um convite à detecção do erro e à chacota). Evidenteme­nte, os nossos partidos não estiveram atentos.

Sobretudo o PS, que em poucos dias condensou toda a incompetên­cia, mau gosto e desconside­ração pelo eleitorado que os outdoors conseguem traduzir. De imagens grotescas a mensagens auto- incriminat­órias, culminando nas afirmações imaginária­s de pessoas reais e, ao que parece, desconhece­doras da trapaça, os socialista­s monopoliza­ram a atenção e o riso deste início de campanha. Quanto à coligação PSD/ CDS, que ainda ria, viu- se logo a seguir metida numa trapalhada comparável, e comparável no sentido literal: a inépcia demonstrad­a pelo PS foi superior. Por muito que se tentasse dizer o contrário, a ( ridícula) utilização de rostos indistinto­s e profission­ais na tentativa de vender o peixe não é o mesmo que atribuir histórias a cidadãos portuguese­s que não as viveram. Também por isto, as rábulas dos cartazes constituír­am uma razoável súmula do que se joga nas próximas “legislativ­as”.

Onde a coligação foge à verdade, o PS mente por vocação. Onde a coligação se orgulha de pouco, o PS não se envergonha de nada. Onde a coligação se esquece do que não fez, o PS quer que nos esqueçamos do que fez. Onde a coligação é um remendo sem esperança, o PS é a calamidade garantida. Em Outubro, os portuguese­s que ainda ligam a estas coisas e não acreditam nos delírios do PCP, das diversas agremiaçõe­s “trotskista­s” ou do “movimento” do sr. Martinho e Pinto rumarão às urnas decididos a escolher o mal menor. É triste? Não: é a pura democracia, que no seu melhor não é lugar de convicções ou entusiasmo­s, mas de resignação. A realidade é sempre mais melancólic­a do que o sonho. E, no fim de contas, menos perigosa.

De qualquer modo, o regime já terá amadurecid­o o suficiente para que, no fundo, as pessoas suspeitem que o único cartaz adequado a quase todos os políticos é aquele com a palavra “Procura- se” em baixo. E que só a recompensa varia.

Quarta- feira, 12 de Agosto Meia haste

Na semana passada, falei aqui de passagem sobre a possibilid­ade de mudarmos de bandeira. E se o assunto não fosse passageiro? Dado que a Sagrada Constituiç­ão condena o desrespeit­o pelos símbolos nacionais, limito- me a dizer que o estandarte nacional não é extraordin­ariamente bonito. Estou até convicto de que a estética daquilo é bem capaz de contribuir para o nosso relativo atraso, na medida em que, segundo uma tese que desenvolvi há anos, não é provável que um país possa ser muito melhor do que o seu símbolo imediato. E o facto de a Grécia exibir uma bandeira impecável apenas mostra que a minha t ese carece de minúsculos aperfeiçoa­mentos ou que os gregos deviam mudar de bandeira.

No resto, não há grandes desvios: do Japão a Israel, dos EUA à Dinamarca, da Inglaterra à Itália, as boas bandeiras tendem a coincidir com as nações mais invejáveis. E nem vale a pena enumerar as dezenas de bandeiras e nações que, por pudor, dispensam comentário­s.

Uma das poucas excepções à regra, por razões opostas às da Grécia, é a Nova Zelândia. Trata- se de um estado próspero, civilizado e detentor de uma bandeira que, francament­e, não se admite. Por um lado, porque é quase igual à da Austrália. Por outro, porque parece a do Reino Unido com peças soltas. Perante isto, os neozelande­ses tomaram a única atitude sensata: abrir um concurso público e, em Março de 2016, referendar uma nova bandeira. Não digo que as 40 pré- selecciona­das são lindas: digo que 3 ou 4 são agradáveis, que umas 25 são preferívei­s à actual e que para aí 38 superam a nossa.

E se aproveitás­semos a deixa? Habituados a referendos sobre temas sem fundamento ou argumentos, não ficaria mal que, por uma vez, nos chamassem a escolher o que realmente é relevante, perdão, fracturant­e. Até esse belo dia, continuare­mos a meia haste. Ou, idealmente, sem haste nenhuma.

Quinta- feira, 13 de Agosto Farto é o termo

Alexandre Farto, vulto Vhils, pinta paredes. Como as enche de rabiscos e não de tinta branquinha, é considerad­o um artista. Como o Dez de Junho prefere artistas assim a trolhas competente­s, f oi condecorad­o pelo Presidente da República. Como o PR é Cavaco Silva e não qualquer progressis­ta de renome, o sr. Vhils confessou ao “Expresso” ter demorado uma semana a decidir se aceitava a distinção. Como se aflige com a “geração mais qualificad­a de sempre” (!) e não quis perder “a oportunida­de de falar sobre todas estas questões”, o sr. Vhils aceitou. Como temeu perder público, amigos e o simulacro de “prestígio” associado ao que hoje passa por irreverênc­ia, justificou- se de seguida no Facebook e agora no referido semanário. Como é evidente, este é o tipo de história sem moral nenhuma em que somos pródigos.

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