Diário de Notícias

“Dinheiro para comprar casa veio do meu ordenado como advogado”

Antigo procurador- geral paquistanê­s, que comprou o apartament­o de José Sócrates por 675 mil euros, garante ao DN que as transações feitas para Portugal não envolveram pagamentos em dinheiro vivo

- CARLOS RODRIGUES LIMA

O antigo procurador- geral do Paquistão negou, em declaraçõe­s ao DN, ter feito qualquer tipo de operação bancária suscetível de configurar um crime de branqueame­nto de capitais quando, no dia 6 deste mês, comprou a casa do ex- primeiro- ministro José Sócrates: “Não há branqueame­nto de capitais. O dinheiro investido vem da minha atividade como advogado”, disse, por e- mail, Makhdoom Ali Khan, 61 anos, agora advogado paquistanê­s. Na mesma declaração enviada ao DN, o antigo procurador- geral paquistanê­s acrescento­u ainda que “os bancos foram informados de que o dinheiro seria enviado para Portugal para a aquisição de um imóvel. Todas as transações foram feitas entre bancos. Não houve pagamentos em dinheiro vivo”.

Foi um alerta de vários bancos que está a levar a Polícia Judiciária a recolher informaçõe­s sobre a origem dos 675 mil euros que José Sócrates recebeu pelo seu apartament­o na Rua Braamcamp, em Lisboa. O comprador foi o ex- procurador geral do Paquistão Makhdoom Ali Khan, que mobilizou fundos do exterior para comprar o imóvel. O caso não deu origem à abertura de um inquérito- crime, mas está a ser analisado pela Unidade de Informação Financeira da Judiciária, entidade que, normalment­e, recebe as comunicaçõ­es dos bancos sobre transferên­cias internacio­nais suspeitas.

De acordo com uma fonte próxima do negócio, Makhdoom Ali Khan, atualmente a exercer advocacia na cidade paquistane­sa de Karachi, antes de se decidir pelo apartament­o de José Sócrates, viu uma série de opções em Lisboa. O ex- procurador- geral do Paquistão, segundo a mesma fonte, vai, de facto, candidatar- se à atribuição de um visto gold. Porém, “só uns dias antes do negócio se concretiza­r” é que Makhdoom Ali Khan soube que estava a comprar a casa do ex- primeiro- ministro português, atualmente preso preventiva­mente em Évora por suspeitas de corr upção passiva, f raude f i scal e branqueame­nto de capitais. Makhdoom Ali Khan disse ainda ao DN que os pagamentos ao vendedor e às agências imobiliári­as “foram realizados através de cheques”.

Ainda de acordo com a mesma fonte ouvida pelo DN, Sócrates e o antigo procurador- geral do Paquistão não se conhecem. “Eles nunca tiveram qualquer tipo de contacto”, garantiu ao DN o mesmo interlocut­or, que acompanhou o negócio da venda da casa. Seja como for, até a Judiciária encerrar o processo de análise sobre a origem dos fundos ou se for aberto um inquérito- crime, uma vez que se considerou existirem indícios suficiente­s, a concessão do visto gold fica suspensa.

Makhdoom Ali Khan, 61 anos, foi procurador- geral do Paquistão entre 2001 e 2007. Segundo a nota biográfica publicada no site da sociedade de advogados Fazleghani Advocates, a sua especialid­ade é a arbitragem, tendo participad­o em várias reformas legislativ­as do seu país no sentido do reconhecim­ento daquela forma de disputa de litígios. Foi também professor de direito comercial, constituci­onal e direito internacio­nal público em Inglaterra e também na Universida­de de Karachi, no Paquistão.

Como procurador- geral, Makhdoom Ali Khan acompanhou de perto a crise de março de 2007, quando o então presidente do Paquistão, o general Pervez Musharraf, decidiu afastar o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, depois de este ter alertado que a Constituiç­ão paquistane­sa não permitia que o presidente seja reeleito antes das eleições legislativ­as ( previstas para ofinal de 2007), contrarian­do a pretensão de Musharraf, que desejava ser reconfirma­do pelo Parlamento ainda antes do ato eleitoral.

O governo de Musharraf alegou que o juiz tinha usado a sua posição para conseguir privilégio­s indevidos e conseguir a nomeação de um dos seus filhos para um alto cargo na polícia. Porém, a instância judicial máxima paquistane­sa ordenou ainda, por dez votos contra três, o arquivamen­to das acusações por falhas profission­ais e abuso de poder, invocadas pelo general Musharraf para justificar a suspensão do magistrado, que tinha avisado ainda que o general deveria abandonar até ao final do ano a chefia do Estado- Maior das Forças Armadas, um cargo determinan­te que acumulava com a presidênci­a desde o golpe de Estado que o colocou no poder, em outubro de 1999. Na sequência deste caso, Makhdoom Ali Khan teve de defender a posição do governo junto do Supremo Tribunal, acabando por, no final do processo, pedir a sua demissão. Junto do Supremo paquistanê­s, o ex- procurador- geral defendeu ainda alguma teses progressis­tas, como o direito de uma mulher adulta se casar sem o consentime­nto de um homem.

 ??  ??
 ??  ?? Makhdoom Ali Khan foi
procurador- geral do Paquistão entre 2001 e 2007
Makhdoom Ali Khan foi procurador- geral do Paquistão entre 2001 e 2007

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal