Diário de Notícias

Lee era Singapura e levou- a do terceiro para o primeiro mundo

Morreu aos 91 anos o pai fundador da Cidade- Estado asiática. Primeiro- ministro entre 1959 e 1990, transformo­u país num centro financeiro. Governo decretou sete dias de luto

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S USANA S A LVA DOR “Não tenho arrependim­entos. Passei a minha vida, grande parte dela, a construir este país. Não há mais nada que precise de fazer.” O homem que esteve por detrás da transição de Singapura “do terceiro mundo para o primeiro” ( o nome que deu ao livro sobre a Cidade- Estado asiática) morreu no domingo à noite, aos 91 anos. Lee Kuan Yew, que foi primeiro- ministro durante mais de três décadas, será lembrado por ter tornado Singapura um importante centro financeiro, mas também pela mão de ferro contra a oposição e a liberdade de imprensa.

Lee morreu no Hospital Geral de Singapura, onde estava internado há semanas devido a uma pneumonia. O governo, liderado pelo seu filho mais velho, Lee Hsien Loong, decretou sete dias de luto, ficando o corpo em câmara- ardente entre amanhã e sábado. O funeral de Estado será no domingo. “Ele inspirou- nos, deu- nos coragem, manteve- nos unidos e trouxe- nos até aqui. Lutou pela nossa independên­cia, construiu uma nação onde não havia nenhuma e tornou- nos orgulhosos de ser singapuren­ses. Não conhecerem­os outro homem como ele. Para muitos, Lee Kuan Yew era Singapura”, disse, emocionado, o filho, numa declaração televisiva.

De todo o mundo chegam as condolênci­as à morte de Lee: o presidente norte- americano, Barack Obama, considerou- o um “verdadeiro gigante” e o primeiro- ministro britânico, David Cameron, disse que ele garantiu “o seu lugar na história” lembrando que, tal como outros chefes do governo, beneficiou dos seus conselhos. Percurso Filho da terceira geração de imigrantes chineses em Singapura, Lee nasceu a 16 de setembro de 1923. Durante a ocupação japonesa na II Guerra Mundial, aproveitou a sua fluência em inglês – estudou numa escola britânica – para trabalhar para a propaganda do Japão. Depois da guerra, estudou Direito em Cambridge, no Reino Unido. No regresso a casa, tornou- se advogado sindical e em 1954 fundou e tornou- se o primeiro secretário- geral do Partido de Ação Popular ( PAP), que governa até hoje.

Eleito primeiro- ministro em 1959, liderou o processo de independên­cia do Reino Unido em 1963 e a união com a Malásia – assim

Homenagem em Singapura ao pai fundador, que morreu no domingo como a separação dois anos depois. Com uma área de 697 km2 ( inferior à da ilha da Madeira), o território não tinha petróleo ou espaço para grandes plantações. Tinha, contudo, infraestru­turas deixadas pelos britânicos ( que foram melhoradas) e uma localizaçã­o estratégic­a.

Nos anos 1960, quando Lee chegou ao poder, Singapura tinha um PIB per capita de 427,9 dólares. Em 1990, quando deixou o cargo de primeiro- ministro, ia a caminho dos 20 mil dólares. Em 2013, o valor tinha subido para 55 182 dólares. Pelo meio, a Cidade- Estado tinha apostado na educação, criara um programa de alojamento que permitiu à população passar de viver em bairros degradados a ser proprietár­ia de pequenos apartament­os, e soubera atrair as empresas estrangeir­as que aí instalaram as sedes re- gionais. Transforma­ra Singapura num centro tecnológic­o ( a Texas Instrument­s instalou uma fábrica de chips em 1968) e tornara- se um próspero porto ( a sua marinha mercante é a sexta maior do mundo). Ataques à oposição “Entre ser amado e ser temido, sempre acreditei que [ Nicolau] Maquiavel tinha razão. Se ninguém tem medo de mim, sou insignific­ante”, afirmou Lee em 1997, que não tinha paciência para a oposição – há apenas nove deputados da oposição no Parlamento, contra 79 do PAP. “Os governos eleitos são apenas tão bons quanto as pessoas que os escolhem”, afirmou o ex- primeiro- ministro, que assumiu depois a pasta de ministro sénior e de ministro mentor, quando o filho chegou ao poder, em 2004.

“A imprensa foi enfraqueci­da até se tornar dócil, os opositores foram processado­s até à bancarrota, ativistas dos direitos humanos foram empurrados para a prisão. Os traficante­s de droga foram enforcados, estudantes desordeiro­s foram vergastado­s”, escreveu Donald Morrison, ex- editor da revista Time para a Ásia. “Mas a corrupção desenfread­a era virtualmen­te desconheci­da. As pessoas tinham medo de falar sobre coisas controvers­as, mas a economia crescia e o rendimento pessoal atingia os valores dos EUA. Singapura tornou- se um país que os jornalista­s ocidentais adoravam odiar e odiavam deixar”, referiu.

Entre as medidas mais invulgares está o facto de Lee ter proibido, na década de 1970, os homens de usar os cabelos compridos. Uma medida que levou ao cancelamen­to de concertos por parte dos Bee Gees e de Led Zeppelin. Os graffiti foram considerad­os atos de vandalismo e os seus autores punidos com vergastada­s – uma pena que é parte integrante do sistema judicial de Singapura. Já depois de Lee ter deixado a chefia do governo, o país proibiu também as pastilhas elásticas.

“Sou muitas vezes acusado de interferir nas vidas privadas dos cidadãos. Sim, se não o fizesse não estaríamos aqui hoje. E digo- o sem o mínimo remorso, não estaríamos aqui, não teríamos progresso económico, não tivéssemos interferid­o em matérias pessoais, quem é o vosso vizinho, como vocês vivem, quanto barulho fazem, como cospem, que linguagem usam. Decidimos o que é certo. Não importa o que as pessoas pensem”, afirmou Lee no Dia Nacional, em 1986. Um tribunal do Senegal condenou ontem o antigo ministro de Estado, da Cooperação e dos Transporte­s, filho do ex- presidente Abdoulaye Wade, a seis anos de prisão e ao pagamento de uma multa de 210 milhões de euros por enriquecim­ento ilícito. Karim Wade, que está preso desde abril de 2013 e no sábado foi designado pelo Partido Democrátic­o Senegalês ( PDS) como candidato às próximas presidenci­ais, vai recorrer da sentença.

“A condenação é política. Há muito tempo que querem impedir um candidato, o nosso candidato, de se apresentar às eleições presidenci­ais”, afirmou um dirigente do PDS, Oumar Sarr. As eleições estão marcadas apenas para 2019, mas o presidente Macky Sall ( da Aliança para a República) quer fazer um referendo no próximo ano para convocar novas eleições para 2017.

De acordo com o juiz Henri Gregoire Diop, durante o julgamento ficou provado que Wade escondeu fundos em empresas offshore nas ilhas Virgens Britânicas e no Panamá. Em causa está uma diferença de pelo menos cem milhões de euros entre o suposto património de Wade e os seus rendimento­s legais. O dinheiro teria sido angariado através de vários processos financeiro­s complexos, durante o tempo em que era conselheir­o e depois ministro do pai.

Apoiantes de Karim Wade que estavam dentro da sala do tribunal gritaram em protesto ao ouvir a decisão do juiz, denunciand­o o veredicto como “vergonhoso”. Junto à universida­de de Dakar vários manifestan­tes foram afastados pela polícia com gás lacrimogén­eo, segundo um fotógrafo da AFP. O ex- presidente ( 2000- 2012), de 88 anos, não assistiu a nenhuma das audiências do processo, mas estava ontem no tribunal. Contudo, por causa dos protestos, acabou por não comentar o veredicto.

Wade, de 46 anos, era conhecido como “ministro do céu e da terra” devido ao número de pastas que acumulava. A sua detenção, em abril de 2013, surgiu depois de o novo governo – que chegou ao poder em abril de 2012 – ter prometido acabar com a corrupção. Na abertura do processo, a 31 de julho de 2014, Wade tinha- se apresentad­o como “prisioneir­o político” e durante os oito meses do processo chegou a fazer greve de fome. S. S.

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