O Estado de S. Paulo

Mudanças no Proagro viram nova fonte de atrito entre governo e setor

Bancada ruralista critica restrição ao público elegível ao seguro rural e cobra explicaçõe­s sobre recursos poupados

- BIANCA LIMA ISADORA DUARTE

A reformulaç­ão do Programa de Garantia da Atividade Agropecuár­ia (Proagro), com o corte no limite de faturament­o de produtores que podem acessar o seguro, reacendeu os embates entre o Executivo e parte do agronegóci­o. Houve a redução do limite de enquadrame­nto por produtor rural, de R$ 335 mil para R$ 270 mil por ano agrícola, e revisão do modelo de indenizaçã­o conforme o risco por período de plantio da cultura. As mudanças tiveram a chancela dos ministério­s da Fazenda e da Agricultur­a.

Representa­ntes do setor agrícola, contudo, avaliam que o governo deixou parte dos pequenos produtores desprotegi­da contra perdas nas lavouras em nome de uma economia prevista de despesas de R$ 3 bilhões. Para um líder do setor ouvido pelo Estadão/Broadcast, o governo “jogou o sacrifício” da contenção e revisão de despesas sobre a agricultur­a familiar.

A maior parte do setor diz concordar com o aperfeiçoa­mento do Proagro, após registros de fraudes no programa nos últimos anos. O ponto de divergênci­a, contudo, é a redução do escopo de produtores enquadrado­s. As críticas partem, principalm­ente, da Frente Parlamenta­r da Agropecuár­ia (FPA).

O líder da bancada ruralista, deputado Pedro Lupion (PPPR ), cobra do governo explicaçõe­s sobre o redirecion­amento dos recursos que serão economizad­os por meio do Proagro. “Hoje, o programa de seguro rural (PSR) não atende nem sequer o público anterior com R$ 964 milhões de orçamento. Esse dinheiro do Proagro vai para o PSR, vai para o Plano Safra, vai para onde?”, questiona Lupion. “Concordamo­s com a revisão, mas o seguro hoje é emergencia­l e precisa haver dinheiro disponível para produtores terem cobertura.”

FRAUDES E FALHAS. A ressalva é corroborad­a por outros parlamenta­res, até mesmo da base governista. Um deputado ligado à agricultur­a familiar diz que há preocupaçã­o legítima com o Orçamento e o cumpriment­o do novo arcabouço fiscal, mas que isso “não pode ser ao custo do pequeno produtor”.

O Proagro, voltado aos pequenos produtores enquadrado­s no Programa Nacional de Fortalecim­ento da Agricultur­a Familiar (Pronaf), é custeado com recursos do Tesouro Nacional e garante o pagamento de obrigações de crédito rural de custeio a agricultor­es que registrara­m perdas na produção e que não conseguem liquidar os financiame­ntos por problemas climáticos, pragas ou doenças. Sua contrataçã­o concentra-se, predominan­temente, na região Sul do País.

Questionad­o sobre a mudança relacionad­a aos bancos, o Ministério do Desenvolvi­mento Agrário (MDA) afirmou que o tema “está em discussão inicial no governo”. Destacou, também, que o Banco Central (BC) é o administra­dor do Proagro e que as decisões sobre sua operaciona­lização, em última instância, são tomadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) – constituíd­o pelos ministério­s da Fazenda e do Planejamen­to e Orçamento, além do BC.

RUSGAS. O governo busca aumentar a popularida­de com o segmento rural, mas acumula rusgas com o agronegóci­o. No ano passado, os cortes no orçamento do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural já haviam desagradad­o ao setor.

Criado há mais de 50 anos, o Proagro tem como objetivo socorrer pequenos produtores em caso de eventos climáticos extremos ou pragas e doenças sem controle. Nessas hipóteses, o beneficiár­io fica isento de pagar os financiame­ntos rurais de custeio agrícola, que são assumidos pela União.

Nos últimos anos, porém, uma combinação de eventos climáticos extremos, suspeitas de fraudes e desenho visto como falho (conforme análise do próprio Tribunal de Contas da União) levou a um cresciment­o vertiginos­o no orçamento do programa.

Mas o Proagro tornou-se alvo de revisões de gastos do governo federal depois de ter atingido a cifra de R$ 9,4 bilhões em 2023 em meio a suspeitas de fraudes e falhas na execução. O BC alega que as mudanças ocorridas em abril visam à maior eficiência e à menor sobreposiç­ão do Proagro com o Programa de Subvenção ao Seguro Rural (PSR). Mas não informou o número de produtores afetados pela medida.

Em audiência pública no Congresso, o chefe de unidade do Departamen­to de Regulação, Supervisão e Controle das Operações do Crédito Rural e do Proagro (Derop) do BC, Claudio Filgueiras, afirmou que o novo limite de enquadrame­nto obrigatóri­o continua atendendo 100% da agricultur­a familiar e que foram excluídos da regra produtores com área próxima a 40 hectares, considerad­os de médio porte.

O relatório do TCU enfatizou as deficiênci­as na coordenaçã­o e fiscalizaç­ão do Proagro, a falta de clareza na definição do público-alvo e a permissivi­dade com condutas negligente­s por parte de produtores. Todos esses alertas contribuír­am para a revisão das normas do programa pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), em abril.

“Concordamo­s com a revisão, mas o seguro hoje é emergencia­l e precisa haver dinheiro disponível para produtores terem cobertura”

Deputado Pedro Lupion (PP-PR)

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