O Estado de S. Paulo

Entrada de Lula projeta eleição menos pulverizad­a

2022. Possibilid­ade de o petista concorrer novamente à Presidênci­a alterou projeções e acelerou articulaçõ­es partidária­s para definição de nomes alternativ­os à polarizaçã­o

- Pedro Venceslau

O restabelec­imento dos direitos políticos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva impactou as estratégia­s e alterou a projeção que líderes políticos envolvidos com a sucessão presidenci­al vinham fazendo do cenário de 2022. De imediato, além de acelerar o processo de articulaçã­o de futuras candidatur­as, a entrada de Lula no jogo eleitoral estreitou o espaço para candidatos. Por dois motivos: por um lado porque o ex-presidente cria uma expectativ­a de aliança na esquerda e por outro porque fica mais restrita a viabilidad­e de candidatur­as que queiram se oferecer como alternativ­a à polarizaçã­o.

No contexto atual, há três nomes que se apresentam no chamado “centro expandido” da política nacional: Ciro Gomes (PDT), Luciano Huck e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB). Como mostrou o Estadão, em meio à novidade Lula, Doria admitiu pela primeira vez que pode deixar de lado o projeto presidenci­al e optar por disputar a reeleição no ano que vem.

A raia mais estreita da corrida eleitoral afeta também as articulaçõ­es de Huck e Ciro. O ex-ministro e presidenci­ável do PDT terá agora de partir para negociaçõe­s mais efetivas no campo do centro, já que a esquerda passa a gravitar na órbita de Lula. No caso do empresário e apresentad­or da TV Globo, as tratativas com o PSB ficam mais incertas e um dos pilares de sua retórica – o combate à desigualda­de social – passa a ter forte concorrênc­ia.

“A entrada de Lula acelerou o processo sucessório e também acelerou para o Huck. A pressão agora não é mais só profission­al”, disse o ex-deputado Roberto Freire, presidente do Cidadania. “Lula força uma discussão mais profunda sobre a criação de um polo alternativ­o.”

Freire tem conversado com Ciro e dirigentes do PDT não descartam que o Cidadania se alie ao ex-ministro caso Huck decida não concorrer.

Huck deverá, até meados do ano, tomar a decisão de renovar ou não o contrato com a Globo, indicando sua disposição de manter ou não o projeto eleitoral para 2022. Ele voltou a conversar com o DEM e abriu diálogo com emedebista­s – a senadora Simone Tebet (MDB-MS) jantou recentemen­te na casa do apresentad­or. Seu grupo político, porém, agora tem dúvidas se o PSB vai caminhar para um convite formal e público a Huck.

A interlocuç­ão entre Huck e os pessebista­s tem sido feita pelo prefeito do Recife, João Campos. A avaliação é que o rumo do partido em 2022 será ditado justamente pelo arranjo que melhor favorecer os interesses eleitorais da ala dominante do PSB, concentrad­a em Pernambuco – onde Lula é forte catalisado­r de votos (mais informaçõe­s na página ao lado).

“Já estamos conversand­o com o centro. O Ciro tem aprofundad­o o diálogo com o PSD, DEM, PV e Rede”, afirmou o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, para quem Huck “perde base popular” com a volta de Lula. Ciro tem, prioritari­amente, investido na construção de uma ponte mais sólida na ala nordestina do DEM – um dos seus interlocut­ores mais frequentes é o ex-prefeito de Salvador ACM Neto, presidente nacional do partido.

Caso mantenha os direitos políticos até a eleição do ano que vem, Lula também impacta o projeto do PSOL. O apoio ao petista ainda sofre resistênci­as internas, especialme­nte dos líderes da legenda que foram expulsos do PT, mas o debate ganha volume na sigla. O presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, disse ao Estadão que “a presença de Lula no debate público reforça a luta da oposição contra Bolsonaro”. “Queremos criar um espaço formal para discutir a unidade com os partidos.”

Moro. Analistas e líderes partidário­s ainda avaliam, e também divergem, a respeito do impacto que o fato da última semana tem sobre o ex-ministro Sérgio Moro. Apesar da decisão do ministro Edson Fachin de anular as condenaçõe­s de Lula na Lava Jato em Curitiba, a Segunda Turma da Corte manteve o julgamento que analisa a suspeição do ex-juiz titular da operação.

Recolhido desde que deixou o governo federal, Moro se tornou sócio-diretor da consultori­a americana Alvarez & Marsal no ano passado. Mantém conversas com Huck e Doria, mas sem indicar pretensão de ser protagonis­ta no ano que vem. Diante do fator Lula, o ex-juiz é visto por dois ângulos: um cenário em que é considerad­o parcial e perde capital político para uma investida eleitoral e outro em que a presença do ex-presidente revitaliza também o antipetism­o e abre uma “estrada” para Moro.

Seus apoiadores confiam na segunda hipótese e reforçaram a pressão para que ele tome o mais rápido possível uma decisão sobre 2022. “Moro está sendo convocado à luta para defender a causa do combate à corrupção, que se enfraquece. Esta é uma decisão muito pessoal: aceitar a convocação para o enfrentame­nto ou se acomodar. A Lava Jato está sendo golpeada de forma fatal. Vejo como uma convocação ao enfrentame­nto”, disse o senador Alvaro Dias (PR), principal interlocut­or entre o ex-ministro e o Podemos.

No campo governista, parte dos aliados de Jair Bolsonaro admite que o retorno de Lula pode dividir o apoio que o presidente tem hoje dos partidos que integram o Centrão. Aliados articulam a volta dele ao PSL e pregam que, para enfrentar Lula, é preciso entrar na disputa com uma sigla bem estruturad­a – ou seja, com dinheiro em caixa e tempo de televisão.

“O tsunami que elegeu Bolsonaro em 2018 não vai se repetir em 2022. Vai voltar o jogo da estrutura partidária”, disse ao Estadão o deputado bolsonaris­ta Luiz Philippe de Orleans e Bragança (SP), que integra o círculo político mais próximo da família Bolsonaro. As conversas entre o PSL e o presidente foram retomadas e o partido isolou a ala de oposição ao governo no Congresso.

• Cenários “A pressão sobre Huck não é mais só profission­al.” Roberto Freire PRESIDENTE DO CIDADANIA

“O tsunami que elegeu Bolsonaro em 2018 não vai se repetir. Vai voltar o jogo da estrutura partidária.” Luiz Philippe de Orleans e Bragança DEPUTADO FEDERAL (PSL-SP)

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ABA BENEDICTO / ESTADÃO -15/7/2019 Corrida. Ciro, Huck e Doria se apresentam no chamado ‘centro expandido’; Moro não tem indicado pretensão de ser protagonis­ta
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MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL - 1/10/2019
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FELIPE RAU/ESTADÃO - 30/10/2019
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NILTON FUKUDA/ESTADÃO - 6/6/2019

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