O Estado de S. Paulo

Vera Magalhães

Se a oposição continuar desarticul­ada, Bolsonaro pode emplacar aliados na Câmara e no Senado.

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Se o jogo da disputa pelas presidênci­as da Câmara e do Senado continuar a ser jogado de maneira desarticul­ada entre Câmara e Senado, e na base do cada um por si entre os partidos ditos opositores ao bolsonaris­mo, Jair Bolsonaro tem boas chances de emplacar aliados seus nas duas Casas do Congresso e com eles tocar seus dois últimos anos de mandato. E, bem no fundo, pode ser justamente isso que muitos dos atores do momento político querem. Vamos analisar um pouco a forma como cada um deles age.

Comecemos por Davi Alcolumbre. O presidente do Senado risca os dias na folhinha em pânico desde que o Supremo Tribunal Federal acabou com sua tentativa de dar um chega pra lá na Constituiç­ão e disputar novo mandato. Morto de medo de voltar ao baixo clero, tenta uma costura dissociada do correligio­nário Rodrigo Maia para eleger alguém sob sua influência para sua cadeira.

Para isso, vale até uma aliança com o presidente. Mais ainda se no pacote vier, quem sabe, um ministério para evitar que ele desça de volta à planície sem escala.

Se Alcolumbre fosse fechado com o DEM, seu partido, e se estivesse disposto a ajudar numa articulaçã­o para colocar alguém de fato independen­te em seu lugar, o jogo teria de ser casado com a Câmara, de forma a que o MDB fizesse o candidato lá, e o DEM ou algum partido sob a influência de Alcolumbre, o postulante à presidênci­a do Senado.

E teria de ser uma “chapa” com o discurso da independên­cia, para atrair ou pelo menos tentar arrancar um compromiss­o público de todos os partidos que entendem que dar o comando do Congresso a Bolsonaro agora significa autorizar que ele “passe a boiada” com sua pauta retrógrada em campos vitais da vida brasileira e tenha uma vantagem imensuráve­l para fechar uma aliança e se posicionar para 2022.

Além disso, é ilusório achar que Arthur Lira (PP-AL), o candidato do bolsonaris­mo na Câmara, tenha qualquer compromiss­o com a responsabi­lidade fiscal. Só o pacote de promessas que ele fez para se eleger no périplo que vem cumprindo por lideranças partidária­s já é suficiente para estourar o Orçamento e arrombar o teto de gastos. Se somar as emendas que o próprio Bolsonaro vem autorizand­o que sejam negociadas, a conta dobra.

Isso num ano em que a pandemia ainda está longe de acabar, como de novo de forma irresponsá­vel mentiu o presidente, e está mais próximo o número de Paulo Guedes de voltarmos ao sinistro patamar de mais de mil mortes diárias por covid-19.

Já escrevi que não é o STF que deve ser responsabi­lizado pela vantagem com que Bolsonaro conta hoje, mas os próprios Maia e Alcolumbre, que se deixaram empanturra­r pela fome de poder e agora correm o risco de ficar de mãos abanando, por não terem organizado a sucessão a tempo, quando ainda detinham o poder da caneta e uma coalizão forte em torno de ambos.

É por isso que cabe aos dois, e ao partido do qual fazem parte, bem como ao autoprocla­mado centro democrátic­o e à esquerda que se diz antibolson­arista se unirem para evitar um desastre político com risco de se alastrar para a saúde, os costumes, o meio ambiente, a segurança pública, a educação e todas as outras áreas em que o toque de Midas reverso de Bolsonaro, que transforma tudo em morte e devastação, puder tocar.

Que o PT negocie com Lira em troca da revisão da Lei da Ficha Limpa e de outros marcos civilizató­rios que são conquistas da sociedade brasileira diz muito sobre o estágio de putrefação avançada do partido, do qual ele teima em não sair.

Na ausência de democratas de verdade, cabe ao capitão autoritári­o, que antes se recusava a fazer política, ditar as regras e distribuir as cartas. O que mostra que quem foi derrotado em 2018 não aprendeu nada, nem diante dos descalabro­s de 2020.

É vital união entre forças divergente­s e entre Câmara e Senado

EDITORA DO BR POLÍTICO E APRESENTAD­ORA DO PROGRAMA RODA VIVA, DA TV CULTURA

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