AMBIENTE ENTRA NA AGENDA DE CANDIDATOS
Antes restrita a ecologistas, ideia de ação sustentável conquista espaço nas legendas
Tema antes restrito a políticos identificados com a militância ecológica, o desenvolvimento sustentável da cidade entrou na pauta de candidatos à Prefeitura de SP. Há projetos que mesclam atividade verde, inclusão social e geração de empregos para o combate à crise e à pobreza.
O desenvolvimento sustentável da cidade com projetos que visam a combater a crise econômica do pós-pandemia entrou na pauta das principais candidaturas que disputam a Prefeitura de São Paulo. Antes circunscrita a políticos identificados com a militância ecológica, a chamada pauta verde – e suas conexões com o combate à pobreza e à desigualdade social – começa a ganhar ares suprapartidários nos planos de governo que estão sendo desenhados pelas campanhas.
Diretor regional do grupo C40 para a América Latina, Ilan Cuperstein avalia, porém, que a formação de um consenso neste tema entre as forças políticas ainda é uma tarefa difícil. O C40 é uma articulação internacional – liderada pelo ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg – de grandes cidades para promover políticas de combate às mudanças climáticas. “A mudança climática não é um tema partidário. Ela é um tema que todo prefeito, seja de direita, de esquerda ou de centro, vai ter de enfrentar, pois as chuvas vão aumentar, vai ter mais gente com as habitações em risco, vamos ter mais ondas de calor com impacto na provisão de alimentos.”
No Brasil, 96 prefeitos aderiram ao grupo, entre eles Bruno Covas (PSDB), de São Paulo; Rafael Greca (DEM), de Curitiba; e ACM Neto (DEM), de Salvador. “Não dá para um município que vê explodir a quantidade de moradores de rua, por conta de cinco anos de recessão, deixar de atuar na busca de desenvolvimento econômico”, afirmou Covas, pré-candidato à reeleição. A cidade deve lançar até o fim do ano um projeto que planeja a cidade para os próximos 20 anos. “O foco será na vocação da economia criativa como uma área ( de atuação) de baixo carbono, mas também para poder gerar emprego e renda e reduzir desigualdade.”
Uma centena de municípios assinou a carta de compromissos do C40, defendendo que a retomada econômica seja mais verde e sustentável. “Soluções para o clima em geral acompanham as soluções para a desigualdade. Energia renovável, por exemplo, gera muito mais emprego do que a indústria dos combustíveis fósseis”, disse Cuperstein. Outro compromisso é de que os prefeitos orientem a retomada após a pandemia pelo conhecimento científico em nome da segurança da população.
É a necessidade de buscar na ciência soluções para as demandas da sociedade o centro do trabalho do biólogo Marcos Buckeridge, coordenador do programa USP Cidades Globais. Para ele, as cidades têm seu “urbsistema”, uma espécie de ecossistema urbano no qual as deficiências e desigualdades de seu funcionamento teriam o efeito de comorbidades, agravando os reflexos de crises, como a provocada pela pandemia de covid-19. Segundo Buckeridge, é importante “que as políticas públicas sejam baseadas em método científico”. “Os políticos e a população devem se apropriar das soluções da ciência para gastar os recursos.”
Propostas. O Estadão procurou todas as pré-campanhas de partidos com representação no Congresso. Há projetos que mesclam inclusão social, geração de emprego e atividade verde – como nos casos de Andrea Matarazzo (PSD), Filipe Sabará (Novo), Bruno Covas e Jilmar Tatto (PT). Outras pré-candidaturas estão preocupadas com ações ligadas à renda emergencial – Eduardo Jorge (PV), Guilherme Boulos (PSOL) e Márcio França (PSB) – ou propõem ações de retomada do crescimento e do emprego locais – Arthur do Val (Patriota), Joice Hasselmann (PSL), Marcos da Costa (PTB) e Orlando Silva (PCdoB).
Apesar da inclusão dos temas relacionados à sustentabilidade ambiental e econômica, especialistas apontam a necessidade de essa pauta ter espaço central no programa de governo, e não ser tratada como apêndice. “O que temos observado, embora esse processo ( de elaboração de propostas) esteja no começo, é que a pandemia escancarou problemas que já eram esperados. A política ainda não incorporou essa visão integrada da política ambiental, ela trabalha o ambiente como uma caixinha, como uma questão que pode estar apartada desse processo”, disse Jorge Abrahão, coordenador-geral da Rede Nossa São Paulo.
‘Tendência’. Para Eduardo Jorge, pré-candidato do PV, a incorporação de propostas ambientais nas demais campanhas é positiva. “É uma tendência mundial. Tanto em partidos à esquerda e à direita, a incorporação do conceito de sustentabilidade é crescente. Essa pauta não é propriedade dos partidos ambientalistas, é uma necessidade da forma de viver da humanidade.”
Os pré-candidatos admitem que a crise sanitária colaborou para a entrada do tema nas campanhas. Matarazzo é um exemplo. “Tive de acrescentar um ponto emergencial ao programa por causa da pandemia. Prevê refinanciamento de impostos, suspensão de taxas, sobretudo para pequenas empresas manterem seus funcionários.” O que eles discutem é qual deve ser o papel do Estado nessa retomada.
Para Sabará, cabe à gestão pública elaborar políticas para incentivar o setor privado a criar produtos sustentáveis e estimular a geração de empregos para pessoas em situação de vulnerabilidade social. Citou como exemplo o projeto Horta Social Urbana, da ONG Arcah, do qual é um dos fundadores. A ação usa espaços ociosos da cidade para produção de alimentos orgânicos com mão de obra de albergues e abrigos da Prefeitura. “A iniciativa privada é a solução da sustentabilidade. Já vi milhares de hectares serem protegidos por causa de negócios sustentáveis”, disse.
Tatto estuda fazer na Prefeitura um cadastro para cooperativas trabalharem para o poder público no lugar de empresas concessionárias, distribuindo renda. “A Lei de Concorrência dispensa licitação de cooperativas, como as de catadores que já estão credenciadas”, disse Simão Pedro, ex-secretário de Serviços na gestão do petista Fernando Haddad.
Boulos e França trabalham com a ideia de implementar uma espécie de renda básica aos munícipes com baixa renda. “Todos da periferia estão com os R$ 600 (do governo federal). Aí você pergunta: ‘E quando não tiver os R$ 600?’. Vamos ter que inventar uma alternativa para quando eles forem cortando e que tem que ser para janeiro”, afirmou França.