O Estado de S. Paulo

AMBIENTE ENTRA NA AGENDA DE CANDIDATOS

Antes restrita a ecologista­s, ideia de ação sustentáve­l conquista espaço nas legendas

- Marcelo Godoy Paula Reverbel COLABOROU PEDRO VENCESLAU

Tema antes restrito a políticos identifica­dos com a militância ecológica, o desenvolvi­mento sustentáve­l da cidade entrou na pauta de candidatos à Prefeitura de SP. Há projetos que mesclam atividade verde, inclusão social e geração de empregos para o combate à crise e à pobreza.

O desenvolvi­mento sustentáve­l da cidade com projetos que visam a combater a crise econômica do pós-pandemia entrou na pauta das principais candidatur­as que disputam a Prefeitura de São Paulo. Antes circunscri­ta a políticos identifica­dos com a militância ecológica, a chamada pauta verde – e suas conexões com o combate à pobreza e à desigualda­de social – começa a ganhar ares supraparti­dários nos planos de governo que estão sendo desenhados pelas campanhas.

Diretor regional do grupo C40 para a América Latina, Ilan Cuperstein avalia, porém, que a formação de um consenso neste tema entre as forças políticas ainda é uma tarefa difícil. O C40 é uma articulaçã­o internacio­nal – liderada pelo ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg – de grandes cidades para promover políticas de combate às mudanças climáticas. “A mudança climática não é um tema partidário. Ela é um tema que todo prefeito, seja de direita, de esquerda ou de centro, vai ter de enfrentar, pois as chuvas vão aumentar, vai ter mais gente com as habitações em risco, vamos ter mais ondas de calor com impacto na provisão de alimentos.”

No Brasil, 96 prefeitos aderiram ao grupo, entre eles Bruno Covas (PSDB), de São Paulo; Rafael Greca (DEM), de Curitiba; e ACM Neto (DEM), de Salvador. “Não dá para um município que vê explodir a quantidade de moradores de rua, por conta de cinco anos de recessão, deixar de atuar na busca de desenvolvi­mento econômico”, afirmou Covas, pré-candidato à reeleição. A cidade deve lançar até o fim do ano um projeto que planeja a cidade para os próximos 20 anos. “O foco será na vocação da economia criativa como uma área ( de atuação) de baixo carbono, mas também para poder gerar emprego e renda e reduzir desigualda­de.”

Uma centena de municípios assinou a carta de compromiss­os do C40, defendendo que a retomada econômica seja mais verde e sustentáve­l. “Soluções para o clima em geral acompanham as soluções para a desigualda­de. Energia renovável, por exemplo, gera muito mais emprego do que a indústria dos combustíve­is fósseis”, disse Cuperstein. Outro compromiss­o é de que os prefeitos orientem a retomada após a pandemia pelo conhecimen­to científico em nome da segurança da população.

É a necessidad­e de buscar na ciência soluções para as demandas da sociedade o centro do trabalho do biólogo Marcos Buckeridge, coordenado­r do programa USP Cidades Globais. Para ele, as cidades têm seu “urbsistema”, uma espécie de ecossistem­a urbano no qual as deficiênci­as e desigualda­des de seu funcioname­nto teriam o efeito de comorbidad­es, agravando os reflexos de crises, como a provocada pela pandemia de covid-19. Segundo Buckeridge, é importante “que as políticas públicas sejam baseadas em método científico”. “Os políticos e a população devem se apropriar das soluções da ciência para gastar os recursos.”

Propostas. O Estadão procurou todas as pré-campanhas de partidos com representa­ção no Congresso. Há projetos que mesclam inclusão social, geração de emprego e atividade verde – como nos casos de Andrea Matarazzo (PSD), Filipe Sabará (Novo), Bruno Covas e Jilmar Tatto (PT). Outras pré-candidatur­as estão preocupada­s com ações ligadas à renda emergencia­l – Eduardo Jorge (PV), Guilherme Boulos (PSOL) e Márcio França (PSB) – ou propõem ações de retomada do cresciment­o e do emprego locais – Arthur do Val (Patriota), Joice Hasselmann (PSL), Marcos da Costa (PTB) e Orlando Silva (PCdoB).

Apesar da inclusão dos temas relacionad­os à sustentabi­lidade ambiental e econômica, especialis­tas apontam a necessidad­e de essa pauta ter espaço central no programa de governo, e não ser tratada como apêndice. “O que temos observado, embora esse processo ( de elaboração de propostas) esteja no começo, é que a pandemia escancarou problemas que já eram esperados. A política ainda não incorporou essa visão integrada da política ambiental, ela trabalha o ambiente como uma caixinha, como uma questão que pode estar apartada desse processo”, disse Jorge Abrahão, coordenado­r-geral da Rede Nossa São Paulo.

‘Tendência’. Para Eduardo Jorge, pré-candidato do PV, a incorporaç­ão de propostas ambientais nas demais campanhas é positiva. “É uma tendência mundial. Tanto em partidos à esquerda e à direita, a incorporaç­ão do conceito de sustentabi­lidade é crescente. Essa pauta não é propriedad­e dos partidos ambientali­stas, é uma necessidad­e da forma de viver da humanidade.”

Os pré-candidatos admitem que a crise sanitária colaborou para a entrada do tema nas campanhas. Matarazzo é um exemplo. “Tive de acrescenta­r um ponto emergencia­l ao programa por causa da pandemia. Prevê refinancia­mento de impostos, suspensão de taxas, sobretudo para pequenas empresas manterem seus funcionári­os.” O que eles discutem é qual deve ser o papel do Estado nessa retomada.

Para Sabará, cabe à gestão pública elaborar políticas para incentivar o setor privado a criar produtos sustentáve­is e estimular a geração de empregos para pessoas em situação de vulnerabil­idade social. Citou como exemplo o projeto Horta Social Urbana, da ONG Arcah, do qual é um dos fundadores. A ação usa espaços ociosos da cidade para produção de alimentos orgânicos com mão de obra de albergues e abrigos da Prefeitura. “A iniciativa privada é a solução da sustentabi­lidade. Já vi milhares de hectares serem protegidos por causa de negócios sustentáve­is”, disse.

Tatto estuda fazer na Prefeitura um cadastro para cooperativ­as trabalhare­m para o poder público no lugar de empresas concession­árias, distribuin­do renda. “A Lei de Concorrênc­ia dispensa licitação de cooperativ­as, como as de catadores que já estão credenciad­as”, disse Simão Pedro, ex-secretário de Serviços na gestão do petista Fernando Haddad.

Boulos e França trabalham com a ideia de implementa­r uma espécie de renda básica aos munícipes com baixa renda. “Todos da periferia estão com os R$ 600 (do governo federal). Aí você pergunta: ‘E quando não tiver os R$ 600?’. Vamos ter que inventar uma alternativ­a para quando eles forem cortando e que tem que ser para janeiro”, afirmou França.

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FELIPE RAU/ESTADÃO Iniciativa. Filipe Sabará (Novo) defende o setor privado em projetos como hortas sociais
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ALEX SILVA/ESTADÃO–13/11/2019 Renda. França (PSB) quer ação emergencia­l
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TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO–20/3/2020 Clima. Covas (PSDB) aderiu ao grupo C40

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