O Estado de S. Paulo

‘Revolução bancária’ deve acirrar disputa entre bancos e fintechs

PIX e open banking, previstos para novembro, podem trazer benefícios aos clientes

- Eduardo Rodrigues Fabrício de Castro / BRASÍLIA

Previstos para novembro, o PIX e o open banking devem mudar a forma de relacionam­ento das instituiçõ­es com correntist­as e já mexem com o mercado. Novo modelo de pagamentos instantâne­os, o PIX eliminará o uso de cartão. O open banking é um sistema de compartilh­amento de dados, informaçõe­s e serviços financeiro­s em plataforma­s de tecnologia que permitirá aos clientes de bancos ter acesso a melhores taxas, prazos e serviços. Com esse novo cenário, as fintechs estão ampliando aquisições de startups de tecnologia, corretoras e gestoras de investimen­tos, em movimento para enfrentar a concorrênc­ia. A Febraban diz que os bancos investem R$ 24,6 bilhões ao ano em tecnologia para se manter competitiv­os. Diretor executivo da Dinamo Networks, empresa da área de segurança digital, Marco Zanini afirma que “sairemos de 30 ou 40 instituiçõ­es competindo para mais de 900”. Um dos primeiros setores a sofrer impacto deve ser o de cartões de débito e crédito.

Duas novas ferramenta­s – o PIX e o open banking – prometem representa­r uma revolução no sistema bancário brasileiro e, por tabela, esquentar a concorrênc­ia no mercado. Para se preparar para essa nova fase, enquanto os bancos estão investindo pesado em tecnologia (ler mais abaixo), as chamadas fintechs decidiram ir às compras. As startups especializ­adas no setor financeiro ampliaram nos últimos meses as aquisições de pequenas empresas de tecnologia, corretoras e gestoras de investimen­tos.

Marcado para entrar em funcioname­nto em 16 de novembro, o PIX, novo sistema brasileiro de pagamentos instantâne­os, vai alterar a forma como as pessoas pagam contas e fazem compras, ao eliminar a necessidad­e de dinheiro ou cartão. Entre as vantagens, está a possibilid­ade de se usar apenas o número de um celular, por exemplo, para fazer uma transferên­cia sem precisar recorrer a conta, agência, CPF, nome completo e todos os outros dados exigidos hoje. Ou, apenas com o CPF, sacar dinheiro em uma loja sem a necessidad­e de caixa eletrônico, cartão ou senha.

Já o open banking – sistema de compartilh­amento de dados, informaçõe­s e serviços financeiro­s pelos próprios clientes bancários em plataforma­s de tecnologia – está previsto para o fim de novembro e deve dar mais autonomia ao usuário. Um cliente bom pagador, com conta em um determinad­o banco e quase entrando no cheque especial, poderá receber oferta de um crédito mais barato de outro banco, mesmo sem ser correntist­a desta instituiçã­o.

De olho nessa transforma­ção, as fintechs buscam aumentar seu campo de atuação. Especialis­ta em regulação e organizaçã­o do mercado financeiro e de capitais, o advogado José Luiz Rodrigues destaca a alta procura das fintechs por consultori­as para a formatação de processos de aquisição. Só na última semana, o escritório atendeu quatro empreended­ores da área.

“Nos últimos cinco anos, as fintechs vieram se estruturan­do, mas ainda focadas em serviços específico­s para se colocarem no mercado. Agora, com o open banking, muitas delas encontrara­m a oportunida­de para tornar suas operações mais abrangente­s”, diz ele. “As fintechs estão se juntando para serem mais fortes.”

A aquisição, no mês passado, da Magliano Invest, a mais antiga corretora do País, com 90 anos de atuação, pela Neon Pagamentos, fundada há apenas

quatro anos, é apenas um exemplo. A lista é grande, a despeito da crise deflagrada pela pandemia. Em junho, a XP anunciou a compra de participaç­ões majoritári­as em duas fintechs: a Fliper, de consolidaç­ão de investimen­tos, e a Antecipa, plataforma digital de antecipaçã­o de recebíveis (como valores a serem recebidos por lojistas por compras no cartão de crédito).

Neste mês, o mercado assistiu à disputa entre a Stone Pagamentos e a Totvs pela aquisição da Linx, desenvolve­dora de softwares para varejo e comércio eletrônico. Os valores envolvidos chegam a R$ 6 bilhões.

No caso do Nubank, as aquisições ultrapassa­ram fronteiras. A empresa comprou duas companhias de desenvolvi­mento de sistemas neste ano – a Plataforma­tec, em janeiro, e a norteameri­cana Cognitect, em julho. “Temos crescido a um ritmo muito acelerado, de 40 mil clientes por dia”, diz a cofundador­a do Nubank, Cristina Junqueira. “E isso, sem dúvida, inclui o desenvolvi­mento de produtos e

serviços que vamos oferecer no contexto de open banking e pagamento instantâne­o.”

Segundo a executiva, os sistemas vão aumentar drasticame­nte a competição. “O mercado vai passar por um período de consolidaç­ão e estamos sempre atentos. Caso haja alguma empresa que tenha produtos consistent­es com a nossa visão, podemos nos interessar.”

O professor de Finanças Ricardo Rocha, do Insper, reforça essa avaliação. “Haverá a definição sobre quais fintechs vão virar grandes empresas e quais vão ficar no meio do caminho.” Segundo ele, a tendência é que o custo financeiro aos clientes diminua. “É a continuaçã­o da revolução digital. A inovação vai pro

“É a continuaçã­o da revolução digital. A forte inovação vai promover mudanças importante­s.” Ricardo Rocha

PROFESSOR DE FINANÇAS DO INSPER

mover mudanças importante­s.”

Embora acredite que o PIX virá para incluir milhões de pessoas no sistema financeiro, o Itaú diz que a novidade vai trazer desafios de segurança e gestão de conflitos. “Nossos investimen­tos têm foco em oferecer a melhor experiênci­a a nossos clientes, com simplicida­de e, principalm­ente, segurança”, diz o diretor de estratégia de PMEs e open banking do Itaú Unibanco, Carlos Eduardo Peyser.

Novos negócios. Diretor executivo da Dinamo Networks, que atua em segurança de identidade digital e criptograf­ia, Marco Zanini afirma que empresas financeira­s e não financeira­s perceberam que o PIX abrirá oportunida­des. Em muitos casos, para participar do sistema, a opção está sendo a aquisição de carteiras digitais que já estão no mercado, possuem tecnologia e base de clientes. “Com o PIX, sairemos de 30 ou 40 instituiçõ­es competindo no varejo para mais de 900. É claro que a guerra de tarifas vai crescer.”

Em junho, o Facebook anunciou o WhatsApp Pay, aproveitan­do arranjo de pagamentos já existente com alguns parceiros locais, e chamou ainda mais atenção para este mercado. A iniciativa, porém, foi suspensa pelo Banco Central, que autorizou testes, mas não deu a palavra final sobre o serviço.

O BC vem ampliando iniciativa­s para incentivar a competição no sistema bancário. “Normalment­e, órgãos reguladore­s criam regras de um mercado já existente. Esse é um dos poucos casos em que a autoridade reguladora se antecipou ao mercado, criando o arcabouço regulatóri­o para o PIX”, afirma Carlos Daltozo, chefe de renda variável da Eleven.

Para Daltozo, as transforma­ções serão gradativas. “Novos entrantes precisam se adequar a pré-requisitos como segurança, regulament­ação e capital mínimo. Os bancos deverão inicialmen­te sentir um impacto nas tarifas de TED e DOC, além das transações de débito. Por outro lado, deverão manter o atendiment­o às empresas, pois detém mecanismos de prevenção a fraudes mais robustos.”

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JF DIORIO/ESTADÃO-15/7/2019 Nova fase. Cristina Junqueira, do Nubank, competição no setor aumentará ‘drasticame­nte’
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