O Estado de S. Paulo

Mandetta admite erro e tenta sair do foco.

Ministro da Saúde diz a auxiliares que deve sair dos holofotes nos próximos dias; aliados de Bolsonaro veem promessa com descrença

- Julia Lindner Daniel Weterman Jussara Soares / BRASÍLIA

O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, admitiu a auxiliares ter cometido um erro estratégic­o ao elevar o tom do embate com o presidente Jair Bolsonaro sobre a conduta do governo federal no enfrentame­nto ao novo coronavíru­s e deve submergir, nos próximos dias, para sair do foco da crise. Aliados de Bolsonaro, no entanto, veem com descrença a promessa do ministro de fazer uma espécie de “voto de silêncio” sobre suas divergênci­as com o presidente.

Bolsonaro se reuniu ontem, no Palácio da Alvorada, com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que é do mesmo partido de Mandetta. Nos últimos dias, ele tem conversado com dirigentes de siglas do Centrão, que interpreta­ram o movimento como uma preparação de terreno para a saída do ministro da Saúde.

“O presidente já abriu esse diálogo e deve partir para a indicação de um técnico no ministério”, disse o senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO). “Enquanto Mandetta não sair ou for demitido, esses problemas vão continuar e Bolsonaro ficará mais desmoraliz­ado”.

Desde o início do mês, Bolsonaro já recebeu parlamenta­res e dirigentes do PP, PL e Republican­os e hoje deve conversar com o presidente do PSD, Gilberto Kassab. Todos os partidos compõem o Centrão.

Mandetta perdeu apoio de militares do governo – que viram em sua entrevista de domingo ao Fantástico, da TV Globo, um tom de provocação – e até de alguns aliados em secretaria­s estaduais da Saúde. Integrante­s do ministério observaram que, embora esteja defendendo orientaçõe­s da Organizaçã­o

Mundial da Saúde (OMS), Mandetta adotou tática errada ao falar em “dubiedade” na equipe sobre medidas para combater a pandemia.

Mesmo depois de alertado por militares sobre a necessidad­e de não expor diferenças com Bolsonaro em público, o ministro dobrou a aposta e seguiu contrarian­do o presidente sobre temas como isolamento social e uso da cloroquina em pacientes diagnostic­ados com coronavíru­s. A entrevista ao Fantástico pegou Bolsonaro de surpresa e as declaraçõe­s de Mandetta foram encaradas como um ato premeditad­o de quem quer forçar a demissão.

Auxiliares do presidente observam que ele só não dispensou o ministro ainda porque faz um cálculo pragmático.

Pesquisas mostram que Mandetta, hoje, é mais popular que Bolsonaro e sua demissão, neste momento, agravaria a crise. Atualmente, os cotados para substituir o titular da Saúde são a médica Nise Yamaguchi e o deputado Osmar Terra (MDBRS), ex-ministro.

Saída. Em conversas reservadas, Mandetta já chegou a confidenci­ar que só não toma a iniciativa de deixar o governo por receio de ficar com o ônus de quem abandonou “o barco” – ou “o paciente”, como tem dito – no momento mais dramático.

Após participar ontem de reunião ministeria­l com Bolsonaro, no Planalto, Mandetta foi questionad­o por jornalista­s se eram verdadeira­s as análises feitas no próprio governo sobre sua intenção de forçar a saída da equipe.

“Não vejo nesse sentido. (O que houve) foi mais uma questão relacionad­a à comunicaçã­o, a como vamos comunicar. Nada além disso”, disse ele. “Sabemos de nossa responsabi­lidade e estamos trabalhand­o com toda a garra”.

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DIDA SAMPAIO / ESTADÃO Crítica. Divergênci­as públicas do ministro com o presidente da República ficaram mais evidentes após entrevista ao ‘Fantástico’, da TV Globo, no domingo

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