O Estado de S. Paulo

Maioria do STF apoia novo juiz de garantias

Ao menos seis dos 11 ministros da Corte se manifestar­am favoravelm­ente à medida sancionada por Bolsonaro, que entra em vigor em todo o País no dia 23 de janeiro

- Rafael Moraes Moura / BRASÍLIA / COLABORARA­M AMANDA PUPO e PEPITA ORTEGA

Seis dos onze dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) apoiam a criação do juiz de garantias, prevista na lei anticrime sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro. Os outros não se manifestar­am. A medida, que divide a condução e o julgamento dos processos entre dois juízes, foi contestada pelas associaçõe­s dos Magistrado­s Brasileiro­s (AMB) e dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).

“O juiz de garantias é um avanço civilizató­rio” RICARDO LEWANDOWSK­I MINISTRO DO STF

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) apoia a criação do juiz de garantias, prevista na lei anticrime sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro no dia 25. Seis integrante­s da Corte ouvidos pelo Estado indicaram concordar com a medida, que divide a condução e o julgamento dos processos entre dois juízes.

Prevista para entrar em vigor no dia 23 de janeiro em todo o País, a implantaçã­o do juiz de garantias já foi contestada pelo Podemos e por associaçõe­s de classe, como a dos Magistrado­s Brasileiro­s (AMB) e dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), que recorreram ao Supremo para suspender o dispositiv­o. Esses grupos criticam a possibilid­ade de aumentar custos do Legislativ­o e de atrapalhar investigaç­ões em andamento.

Entre quem defende a nova regra está a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que se manifestou pela constituci­onalidade da lei. Um dos principais argumentos a favor da medida é a preservaçã­o da imparciali­dade dos julgamento­s. Na Operação Lava Jato, alguns advogados questionar­am a proximidad­e entre a acusação e o então juiz Sérgio Moro, hoje ministro da Justiça e da Segurança Pública.

Atualmente, o juiz que analisa pedidos da polícia e do Ministério Público na investigaç­ão é o mesmo que pode condenar ou absolver o réu. De acordo com a nova lei, o juiz de garantias deverá conduzir a investigaç­ão criminal e tomar medidas necessária­s para o andamento do caso, como autorizar busca e apreensão e quebra de sigilo telefônico e bancário, até o momento em que a denúncia é recebida. A partir daí, outro magistrado vai ouvir o réu e as demais partes e dar sua sentença.

A discussão provocou polêmica no governo. A aprovação da lei no Congresso foi vista como uma derrota de Moro, que orientou Bolsonaro a vetar o novo dispositiv­o, mas não foi seguido. Como revelou o Estado, Bolsonaro recebeu aval do presidente do STF, Dias Toffoli, para sancionar a medida.

O ministro Ricardo Lewandowsk­i, crítico do que considera excessos cometidos pelo Ministério Público em investigaç­ões, afirmou ao Estado que “o juiz de garantias é um avanço civilizató­rio”. Para Gilmar Mendes, também crítico da Lava Jato, o pacote anticrime e a lei de abuso de autoridade foram os “dois projetos mais importante­s da década” no Judiciário.

Segundo o ministro Marco Aurélio Mello, a proposta é uma “opção política-normativa interessan­te”. “É aguardar a experiênci­a. Vejo com bons olhos.”

O relator no STF das ações contrárias ao juiz de garantias é o ministro Luiz Fux, que assumirá o plantão de 19 a 29 de janeiro. O gabinete de Fux informou que o ministro está fora do Brasil e não se manifestar­ia.

Integrante­s da Corte avaliam que, se Fux der uma liminar para suspender a medida, seria

um “enfrentame­nto” a Toffoli, que criou um grupo de trabalho no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para discutir o tema e propor, até 15 de janeiro, uma norma para sua aplicação.

Na visão de Toffoli, a medida deve ser aplicada em processos futuros, sem retroagir a ações em andamento, e só valer para a primeira instância. “Já há experiênci­as exitosas que garantem maior imparciali­dade do magistrado que vai julgar a causa sem estar contaminad­o pela coleta das provas”, afirmou Toffoli, que prevê um regime de transição de seis meses.

Em nota, o ministro Celso de Mello disse que a criação do juiz de garantias é uma “inestimáve­l conquista da cidadania”. “Além de assegurar a necessária imparciali­dade do magistrado, representa a certeza de fortalecim­ento dos direitos e garantias fundamenta­is da pessoa sob investigaç­ão criminal.”

O ministro Alexandre de Moraes considera uma “opção legítima” feita pelo Congresso. “Haverá, como em vários países, uma divisão de competênci­as entre juízes, ambos serão independen­tes e com as garantias da magistratu­ra”, afirmou Moraes ao Estado anteontem.

Procurados, os demais ministros não se posicionar­am.

Um parecer do último dia 17, elaborado pela equipe de Moro e assinado em conjunto com a Advocacia-Geral da União (AGU), observa que em crimes complexos, como corrupção e lavagem de dinheiro, a investigaç­ão se desenrola por anos e se divide em fases ou operações. “Nesses casos, o juiz, durante a fase investigat­iva, tem fundamenta­l importânci­a, haja vista que acompanha todo o desenrolar da atuação policial e do Ministério Público. Ao cindir as atribuiçõe­s, contudo, todo este trabalho árduo de anos seria ‘perdido’”, alerta o texto.

Para o presidente da Ajufe, Fernando Mendes, “a questão é saber se a maneira como a lei foi criada será considerad­a correta.”

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GABRIELA BILO / ESTADÃO Plantonist­a. O ministro Luiz Fux (à dir.) será o relator no Supremo das ações contrárias à criação do juiz de garantias

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