O Estado de S. Paulo

Escoamento sofre com a falta de investimen­to

Setor de concessões se mostra otimista com discurso do presidente eleito de atrair mais capital privado para solucionar gargalos

- Marleine Cohen ESPECIAL PARA O ESTADO / COLABOROU LETÍCIA FUCUCHIMA

Ano a ano, os gargalos que resultam da falta de investimen­tos em infraestru­tura – que não ultrapassa­m 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil – têm comprometi­do a capacidade de escoamento da produção agrícola pelas rodovias do País. O nó logístico, decorrente da insuficien­te malha rodoviária instalada, da falta de manutenção ou do elevado custo das operações, é um dos fatores que contribuem para que o Brasil ocupe o 72.º lugar no Ranking Global de Competitiv­idade do Fórum Econômico Mundial, entre 140 países, ficando longe da “fronteira de competitiv­idade”. No Brics – Brasil, Índia, China e Rússia –, está em último lugar. A China segue em primeiro no bloco, embora no ranking geral detenha a 28.ª posição.

Com a matriz de transporte nacional baseada sobretudo nas rodovias (60%) – ante 20% por ferrovia e 13% por hidrovia –, o custo médio do deslocamen­to da tonelada de grãos no Brasil chega a ser até seis vezes maior do que nos Estados Unidos (1.º no ranking do Fórum Mundial). De acordo com comparação do Movimento Pró-Logística, o transporte, por caminhão, de uma tonelada de soja de Sorriso, município mato-grossense que figura entre os maiores produtores da oleaginosa no País, em direção ao Porto de Santos (SP) e daí até a China custa US$ 111. A mesma tonelada, nos Estados Unidos, sai de Illinois por hidrovia até o Porto de Nova Orleans e de lá para o país asiático por US$ 56. Ou seja, o frete brasileiro é 98% maior.

O transporte rodoviário pesa ainda mais na safra total e no bolso do produtor quando se leva em consideraç­ão que a produção de grãos se deslocou, nos últimos anos, para longe dos centros logísticos bem estruturad­os do Sul-Sudeste. Conforme levantamen­to de safra da Companhia Nacional de Abastecime­nto (Conab), do início de novembro, o Centro-Oeste será responsáve­l pela produção de 53,69 milhões de toneladas de soja na atual safra, ou 45% da colheita total, de 119,26 milhões de toneladas. Ou seja, o principal produto da pauta de exportaçõe­s brasileira terá de se deslocar por rodovias ainda deficitári­as, seja para os portos do SulSudeste ou do Norte, agravando a competitiv­idade brasileira.

Em entrevista ao Estadão/Broadcast, o presidente da Associação Brasileira de Concession­árias de Rodovias (ABCR), César Borges, recomenda, por isso, ser fundamenta­l que o novo governo não só mantenha a agenda de concessões rodoviária­s, mas também acabe com o “apagão das canetas”, situação que tem paralisado decisões importante­s em diversos segmentos, principalm­ente no rodoviário.

Iniciativa privada. Borges lembra que o presidente eleito, Jair Bolsonaro, tem destacado a necessidad­e de atrair capital privado para os projetos que propõem melhorar os marcos regulatóri­os para garantir segurança jurídica aos investimen­tos. “Ele está se colocando como um governo liberal que entende a importânci­a do setor privado no desenvolvi­mento do País e, de forma bem objetiva, na infraestru­tura”, disse.

Para Borges, o País ficou “paralisado” e até mesmo “andou para trás” no setor rodoviário durante o governo de Michel Temer, muito em função do “apagão das canetas” – conflito entre Poderes que acabou travando a agenda de infraestru­tura. Uma das maiores evidências dessa situação é a lei que permite a “devolução amigável” das concessões, que aguarda decreto para regulament­á-la há mais de um ano. “O governo faz uma medida provisória, transforma em lei e depois não regulament­a. É uma lei morta até agora, sem uso, inócua”, frisa.

Parcerias. Além da regulament­ação das relicitaçõ­es, a ABCR defende a manutenção do cronograma de licitações do Programa de Parcerias de Investimen­tos (PPI). Entre os projetos que deveriam ser prioritári­os, ele menciona as rodovias cujos estudos estão sendo assessorad­os pelo IFC, braço do Banco Mundial, e a Empresa de Planejamen­to e Logística (EPL). É o caso do trecho da BR-153 entre Anápolis (GO) e Aliança do Tocantins (TO), que havia sido arrematado pela Galvão Engenharia na terceira etapa da concessões rodoviária­s federais, mas acabou abandonado e voltou às mãos do governo em meados do ano passado.

“É importante que o próximo governo se qualifique e se fortaleça para levar a mensagem da importânci­a e das soluções (do setor) para os órgãos de controle. Para o TCU, Ministério Público Federal e também para os órgãos ambientais”, afirma Borges.

Com transferên­cia da base da produção do Sul e Sudeste para Norte e Centro-Oeste, há maior demanda por infraestru­tura

É importante que o próximo governo se qualifique e se fortaleça para levar mensagem da importânci­a e das soluções do setor para os órgãos de controle. Para o TCU, MPF e também para os órgãos ambientais” César Borges

PRESIDENTE DA

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA

DE CONCESSION­ÁRIAS

DE RODOVIAS

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DIDA SAMPAIO/ESTADÃO–27/6/2016 Quase finalizada. Ferrovia Norte-Sul, que foi lançada ainda durante o governo de José Sarney, nos anos 80, tem obras praticamen­te concluídas; o trecho acima passa por Anápolis (GO)
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