Agronegócio do País fatura com guerra comercial
Consultor americano destaca que exportadores de soja do País ganharam ‘uma fortuna’ com briga entre Estados Unidos e China
A guerra comercial entre Estados Unidos e China é uma excelente oportunidade para o Brasil ampliar suas exportações para o país asiático, principalmente de soja e carnes, aproveitando o vácuo deixado pelos americanos, defendeu o vice-presidente da ED&F Man Capital Markets, o americano Michael McDougall. Durante o Summit Agronegócio Brasil 2018, promovido pelo Estado no dia 13 de novembro, em São Paulo, ele se debruçou sobre o tema e avaliou as chances criadas pelo entrave entre os dois gigantes do comércio global, que se arrasta há meses. “A negociação entre eles vai demorar. Assim, o Brasil tem oportunidade de exportar mais para a China e deve aproveitar isso, ampliando, por exemplo, o plantio de soja, pois levará anos para os chineses diversificarem o fornecimento da oleaginosa”, explicou.
Ele estima uma expansão de 4,5% na área brasileira de soja este ano, avanço que só não será maior por causa do aumento de custos de produção, principalmente com o transporte rodoviário após a adoção da tabela de fretes mínimos. Já os Estados Unidos devem cortar em 7,4% sua área cultivada. Segundo McDougall, os exportadores de soja brasileira já obtiveram “uma fortuna” com a guerra comercial, ganho que os americanos “nunca vão recuperar”.
Carnes. Quanto ao mercado de proteína animal, o executivo disse que a guerra comercial rende lucros adicionais aos produtores brasileiros, que têm agora mais competitividade sobre os americanos. McDougall citou o contrato recente de uma companhia do Brasil com a China, em referência à negociação entre a JBS e o gigante chinês do e-commerce, o grupo Alibaba, anunciada há duas semanas.
Ainda neste setor, porém, também há aumento de custos de produção – com as exportações mais volumosas de soja para a China e o consequente aumento das cotações, os preços internos do milho também subiram. “Aqui no Brasil, o valor do cereal já chegou a ficar 20% acima da cotação da Bolsa de Chicago”, lembrou o executivo, aumentando o custo dos pecuaristas com ração, cuja base é milho e farelo de soja.
‘Dicas’ a Bolsonaro. McDougall mencionou que, assim como os EUA utilizam seu Departamento de Agricultura (USDA) para promover os produtos agrícolas do país para o mundo, o novo governo, de Jair Bolsonaro, que toma posse no dia 1.º de janeiro, deve fazer o “marketing” do agronegócio brasileiro para o mercado global. McDougall deu outra “dica” ao futuro presidente: observar como os EUA têm se relacionado com os parceiros comerciais, para não repetir os mesmos erros. “Estamos vendo, pelos EUA, como não tratar os clientes”, falou, referindo-se à imposição de tarifas americanas à China, equivalentes a dezenas de bilhões de dólares, o que levou à retaliação chinesa e à redução das exportações de soja americana.
A tendência de Trump, explicou, é fazer acordos bilaterais, onde os EUA podem demonstrar mais força, a depender do país parceiro. “Em acordos multilaterais, uns perdem e outros ganham e Trump só quer ganhar”, disse ele. Para o especialista, o problema dessa estratégia é que, depois, surge a necessidade de negociar com cada país individualmente, algo que não ocorre com facilidade. McDougall acrescentou que no governo Trump acordos multilaterais têm sido encerrados ou evitados. E exemplificou com o Acordo de Paris (que os EUA deixaram de ser signatários na gestão Trump) e também o Nafta. “Em dois anos de gestão Trump, só temos um acordo, com a Coreia do Sul. Já o Nafta 2, com o México, ainda tem de passar por aprovação do Congresso americano”, continuou. “União Europeia, Japão, Índia e Brasil, estão todos esperando.”
Além do comércio. Sobre a disputa com a China, o especialista informou que se trata de um problema multifacetado, e não apenas de comércio. Atualmente, as exportações chinesas para os EUA representam 4,1% do PIB americano. “Há na questão a necessidade de reduzir o déficit comercial, abrindo o mercado chinês para mais produtos dos EUA, mas também garantir o direito de propriedade intelectual, evitando que a China progrida com a próxima geração de tecnologias, e impedir a expansão chinesa para mercados ao sul do mar da China.”
De todo modo, no caso específico da soja, a China vem buscando diversificar seus parceiros, sem criar dependência da oleaginosa sul-americana. Nesse sentido, firmou acordo de desenvolvimento recentemente com a Rússia, para expandir o plantio do grão lá. Outra questão que tem sido observada na gestão de Trump é o aumento dos orçamentos para militares, segmento em que o presidente americano quer ter o domínio. Com isso, McDougall acredita que a tendência é que conflitos envolvendo os americanos sejam solucionados com a atuação de militares. “O orçamento militar dos EUA já é maior que o da China e da Rússia”, citou. “Em vez de investir em diplomacia, Trump investe em armas.”