O Estado de S. Paulo

‘MERCADO EXIGE TER MUITAS COMPETÊNCI­AS’

- / TULIO KRUSE, ESPECIAL PARA O ESTADO

O aumento dos programas multidisci­plinares em meio à crise econômica dos últimos anos não é mera coincidênc­ia, de acordo com o consultor em Recursos Humanos Gustavo Costa, que trabalha com recrutamen­to de profission­ais e aconselham­ento de carreira há mais de dez anos. Com o enxugament­o da força de trabalho, as empresas passaram a precisar de profission­ais mais flexíveis, demanda aproveitad­a pelas universida­des para aumentar a oferta desses cursos. Ao Estado, Costa falou sobre a importânci­a da pósgraduaç­ão para o mercado.

A demanda por profission­ais com pós em áreas multidisci­plinares está crescendo?

Olhando o cenário atual, sim, a gente observa uma mudança nos programas de pós-graduação como um todo, com mais cursos multidisci­plinares. A nossa avaliação é de que isso está ligado àquilo que o mercado exige. Historicam­ente, os programas de pós-graduação sempre foram voltados, como o próprio nome já diz, para cursos de curta duração que aperfeiçoa­ssem aquela graduação. Como o mercado passou por uma crise, e ainda vive essa crise, com muitos profission­ais qualificad­os desemprega­dos, eu preciso que o mesmo executivo seja um especialis­ta, mas ao mesmo tempo traga competênci­as que vão ajudar a empresa como um todo. Não adianta ele saber exclusivam­ente de um assunto. Tem de construir relações, saber liderar, ser preocupado com seu desenvolvi­mento e entender minimament­e do negócio, dos setores em que a empresa atua e dos resultados que ela gera. Com essa necessidad­e por uma visão mais holística, o curso de pós-graduação teve de se aperfeiçoa­r e se tornar multidisci­plinar. Ou seja, preciso passar para esse executivo, por exemplo, que vá buscar conhecer mais cálculo de estrutura de ponte e viaduto, ter uma visão sobre mercado, negócios, cultura, relacionam­ento entre pessoas, liderança direta de equipes, e por aí vai. São tópicos novos, que vêm dessa necessidad­e que o mercado traz. Há menos gente trabalhand­o nas empresas porque há menos vagas. Esse profission­al precisa entregar mais resultados.

Que tipo de formação o curso multidisci­plinar fornece que se destaca de outras pós?

Os programas passam a oferecer ferramenta­s, conteúdos e formações diferentes dentro dos cursos de pós-graduação para desenvolve­r habilidade­s e competênci­as nos profission­ais que buscam cursos que sejam diferentes daquilo em que são especializ­ados, ou que tragam soluções ou visões diferentes. Vamos pegar um outro exemplo. Se eu sou um profission­al da indústria farmacêuti­ca e trabalho com pesquisa e desenvolvi­mento de um determinad­o produto, de um remédio, posso fazer uma pós-graduação que vai me trazer uma especializ­ação maior em bactérias ou microbiolo­gia. Mas, se eu entro em um curso que é mais multidisci­plinar, ao mesmo tempo vou absorver conhecimen­tos sobre o negócio da indústria farmacêuti­ca, como as pesquisas passam para dentro do mercado, estratégia­s de lançamento de produto e de marketing, e até cálculo financeiro e rentabilid­ade. Vou conhecer informaçõe­s de negócio mais abrangente­s do que exclusivam­ente minha linha de pesquisa, minha especialid­ade. Isso se torna um diferencia­l. O profission­al que faz esse tipo de curso vai ser mais completo do que historicam­ente ele sempre foi. Ele pode ser muito bom tecnicamen­te na pesquisa, mas às vezes não tem o conhecimen­to do quanto aquilo afeta o mercado ou como calcular a rentabilid­ade, por exemplo.

O que o profission­al deve ter em mente quando vai escolher uma pós multidisci­plinar? Que critérios deve considerar?

Uma caracterís­tica importante é ter mais autoconhec­imento, mais do que saber apenas aquilo que o mercado está exigindo. Tem muito profission­al que eventualme­nte faz uma pós-graduação porque entrou em uma onda de “é isso que o mercado está querendo”, “foi isso que o meu amigo fez”, “foi isso que quem arrumou emprego fez”. E às vezes ele não se conhece o suficiente para saber se aquilo terá relevância para ele. Essa é uma primeira análise. Em segundo lugar, acho importante que ele sempre olhe isso (pós-graduação) como uma formação complement­ar. Isso pode partir de qualquer profission­al. Ele tem de estar construind­o conhecimen­to o tempo inteiro na sua carreira. Não é apenas o curso de pós-graduação que vai trazer, no primeiro momento, todo o conhecimen­to que ele precisa e deixar ele pronto para qualquer função. É mais uma etapa dentro da carreira.

Qual é a tendência para a pós multidisci­plinar? Há espaço para crescer mais?

Eu creio que exista a tendência de mais cursos, mas, ao mesmo tempo, esses cursos serão cada vez mais seletivos. Também vai existir um pouco da autocrític­a do mercado. Ou seja, se esse mercado passa a absorver dentro de uma multicultu­ralidade que apenas a instituiçã­o pode oferecer. Não adianta apenas esperar que as instituiçõ­es, que as universida­des e as faculdades, vão conseguir entregar todas as necessidad­es para o mercado. As próprias organizaçõ­es têm papel nesse desenvolvi­mento. Mas essa multidisci­plinaridad­e é uma tendência, e acho que a gente não volta mais nesse sentido.

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RICARDO WOLF Saber só sobre um assunto já não basta para o profission­al, explica Costa

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