O Estado de S. Paulo

DAS OCUPAÇÕES PARA O PALACETE DOS ARTISTAS

Prédio de 1920 na Avenida São João abriga ex-trabalhado­res do teatro independen­te

- / B.R.

“Foi da minha janela que, hospedado aqui um dia, Caetano (Veloso) olhou para a esquina da Ipiranga e da São João e compôs Sampa”, diz, séria, a atriz, produtora e diretora teatral Valéria di Pietro, de 67 anos. “Mas é claro que isso é mentira”, continua, dando risada.

Ela é uma das moradoras do Palacete dos Artistas, prédio da Prefeitura na Avenida São João, onde já funcionou o Hotel Cineasta, e que hoje é um dos imóveis do programa de locação social da Prefeitura. O prédio, inaugurado na década de 1920, é um bem tombado de propriedad­e do Município destinado ao programa de locação social de São Paulo desde 2014.

O espaço, de cinco andares, é habitado majoritari­amente por artistas do teatro independen­te que viviam em ocupações. “Na nossa área, não é todo mundo que vai parar na TV. Quando vamos ficando velhos, os papéis acabam”, conta Valéria, que vive em um apartament­o repleto de plantas, quadros nas paredes e estantes com livros e filmes. Mas ali há também outras pessoas, não artistas, que conseguira­m se inscrever no programa. São 50 unidades habitacion­ais ocupadas por 60 moradores.

O prédio é tido como o melhor exemplo de locação social da cidade, com a gestão feita em parceria entre a Companhia Metropolit­ana de Habitação (Cohab) e os próprios moradores – em outros prédios, a Prefeitura enfrenta invasões de não inquilinos e até ação de criminosos. Gestão. Valéria e a também artista Maithê Alves, de 76 anos, que vive em um apartament­o vizinho e igualmente aconchegan­te, são as responsáve­is por manter o Palacete do Artistas organizado. “Fizemos um teatro no primeiro andar, biblioteca, ateliê, lavanderia e uma sala de leitura onde queremos montar um cineclube”, conta.

Mas a organizaçã­o não é tarefa fácil. No primeiro andar, as salas ficam trancadas por causa dos furtos, frequentes. “Aqui tudo some”, explica Maithê. “Tinha uma pessoa que trazia pessoal da Praça da República para cá, e eles usavam drogas”, diz.

Os conflitos com a Cohab, que recolhe a taxa de condomínio, são constantes em função da zeladoria. Mas as moradoras não fazem reclamaçõe­s mais incisivas ao comentar goteiras, falta de lâmpadas e outros pormenores que surgem na administra­ção predial. Também não se queixam das dificuldad­es de convívio com os vizinhos. “Nós, artistas, já nos conhecíamo­s, somos uma família. E as demais pessoas que estão aqui convivem bem conosco”, conta Valéria.

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NILTON FUKUDA/ESTADÃO Colegas. Maithê e Valéria estão entre os 60 moradores

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