O Estado de S. Paulo

Ex-presidente diz que é vítima de ‘pacto’

A uma plateia formada por militantes e sindicalis­tas, Lula diz que decisão lhe deu uma ‘coceirinha’ para continuar pré-candidato ao Planalto

- Vera Rosa Juliana Diógenes Marcelo Osakabe

Em discurso, Lula disse que é vítima de “pacto” entre Judiciário e imprensa e que não vai desistir da disputa. “Quero avisar a elite: esperem, vamos voltar.”

Três horas depois de ser condenado pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) a 12 anos e um mês de prisão, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse, em palanque montado na Praça da República, que não vai desistir da disputa ao Palácio do Planalto porque uma “coceirinha” o faz seguir adiante. “Pobre daqueles que acham que, prendendo o Lula, acaba a luta. Quero avisar a elite: esperem que vamos voltar”, gritou ele.

Diante de uma plateia formada por militantes do PT, parlamenta­res, sindicalis­tas e integrante­s de movimentos sociais, o ex-presidente afirmou ser vítima de um “pacto” entre o Judiciário e a imprensa para acabar com seu partido e tirá-lo do jogo eleitoral. “Se me condenaram, me deem pelo menos o apartament­o”, ironizou Lula, em referência ao triplex no Guarujá, alvo da Lava Jato. “Quero que eles digam qual foi o crime que cometi. Estou condenado outra vez por um apartament­o que eu não tenho. Já pedi para o Guilherme Boulos (líder do MTST) mandar o pessoal dele ocupar. Já que é meu, que ocupem.”

A estratégia de Lula consiste em adotar o discurso da perseguiçã­o política. Hoje, ele participar­á da reunião da Executiva Nacional do PT, que vai lançá-lo candidato ao Planalto e baterá nessa mesma tecla. “Eu nem precisava voltar, já estava aprovado, mas agora percebo que eles estão fazendo isso para evitar que eu seja candidato. Essa provocação é de tal envergadur­a que me deu uma coceirinha e, agora, quero ser candidato a presidente da República”, insistiu. Na Praça da República, muitos petistas não continham as lágrimas.

Chamado pelo público de “guerreiro do povo brasileiro”, Lula citou Tiradentes e se comparou ao ex-presidente da África do Sul Nelson Mandela, que era tido como terrorista e passou quase três décadas na cadeia. “Mandela ficou preso 27 anos. Nem por isso a luta dele diminuiu. Voltou e foi presidente.”

O ex-presidente acompanhou parte do julgamento na sede do Sindicato dos Metalúrgic­os do ABC, em São Bernardo do Campo – berço político do PT –, ao lado de aliados. Lula presidiu a entidade de 1975 a 1981 e dali comandou várias greves, desafiando o regime militar. Antes do veredicto, disse aos militantes que esperava ser absolvido por 3 a 0. A portas fechadas, porém, não escondeu o abatimento.

A decisão do TRF-4 fez o PT convocar ainda ontem uma reunião de emergência com alguns dirigentes e parlamenta­res, na

sede do partido, em São Paulo. Todos saíram de São Bernardo e foram para lá.

O PT pretende registrar a candidatur­a de Lula à Presidênci­a em 15 de agosto no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e tentar reverter a decisão que deve torná-lo inelegível pela Lei da Ficha Limpa, mas, nos bastidores, considera remota a possibilid­ade de mudar o quadro. Pior: o

partido foi alertado que ele pode ser preso antes disso.

Guerra. “A partir deste momento, é radicaliza­ção da luta”, afirmou a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), em Porto Alegre (RS). Em nota, ela disse que o julgamento configura “farsa judicial”. “Se pensam que a história termina com a decisão de hoje, estão muito

enganados, porque não nos rendemos diante da injustiça”.

Assim que o voto do desembarga­dor João Pedro Gebran Neto, relator do processo, foi lido, alguns petistas que estavam com Lula no sindicato caíram no choro. “Muita gente se emocionou”, disse o senador Humberto Costa (PE). “Mas vamos até as últimas consequênc­ias com Lula. Se houver impugnação, isso deve acontecer por volta de setembro.”

O ex-ministro da Casa Civil e ex-governador da Bahia Jaques Wagner, um dos cotados para ser o plano B do PT na eleição, foi dar um abraço em Lula e almoçou com ele. No cardápio, carne com cogumelo, arroz, feijão e macarrão japonês, servidos em quentinhas. A televisão, segundo ele, estava desligada. “Para quê acompanhar o julgamento ?”, perguntou .“Ele ficou naquela sala reservada do segundo andar conversand­o com amigos.”

Um telão foi instalado no auditório do sindicato para que os militantes assistisse­m à sessão. “Comecei aqui e aqui vou recomeçar”, afirmou o ex-presidente a amigos, ao chegar ao sindicato, pouco depois das 10 horas. “Você vota em mim, Devanir?”, perguntou ele ao ex-deputado Devanir Ribeiro, que foi diretor do sindicato.

O bom humor foi terminando à medida que o julgamento prosseguia. Apesar de esperarem a condenação, os petistas tinham esperanças no revisor, Leandro Paulsen. Acreditava­m que Lula poderia ter um voto favorável, abrindo divergênci­a na Corte, o que lhe daria direito amais um recursona Justiça. “Recebemos com muita perplexida­de esse resultado”, afirmou o senador petista Jorge Viana (AC). “Fico chocado de ver essa caçada contra Lula. Não é possível que um tribunal tenha se partidariz­ado dessa forma.”

‘Provocação’

“Eu nem precisava voltar, já estava aprovado, mas agora percebo que eles estão fazendo isso para evitar que eu seja candidato. Esta provocação é de tal envergadur­a que me deu uma coceirinha. Agora, eu quero ser candidato.”

“Quero que peçam desculpas pela quantidade de mentiras sobre mim. Fui condenado por um apartament­o que não é meu.” Lula

EX-PRESIDENTE DA REPÚBLICA

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JF DIORIO / ESTADÃO Apoio. Após resultado do julgamento, Lula participou de ato na Praça da República, em São Paulo; petista acompanhou sessão do TRF-4 na sede do Sindicato dos Metalúrgic­os do ABC

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