O Estado de S. Paulo

Pasadena não terminou

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Depois de tudo o que já foi revelado, nada explica que o caso não seja apreciado pelo Judiciário.

Na quarta-feira passada, o Tribunal de Contas da União (TCU) reconheceu que a ex-presidente Dilma Rousseff e os demais integrante­s do Conselho de Administra­ção da Petrobrás – Antonio Palocci, Sergio Gabrielli, Claudio Haddad, Fabio Barbosa e Gleuber Vieira – foram responsáve­is pela compra da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA), em 2006. O tribunal decidiu que os ex-conselheir­os devem responder pelo prejuízo decorrente da aquisição, estimado em US$ 580 milhões. Os seus bens, em conjunto com os dos membros da diretoria executiva da empresa, foram decretados indisponív­eis, cautelarme­nte, pelo período de um ano.

Ao responsabi­lizar os autores de uma compra tão prejudicia­l e tentar ressarcir o prejuízo à Petrobrás, a decisão do TCU chega com imenso atraso. Mais de uma década j á transcorre­u desde a desastrosa aquisição e são escassas as chances de reparação dos danos provocados pela gestão irresponsá­vel. Conforme declarou em seu voto o ministro Vital do Rêgo, “a diretoria executiva apreciou a aquisição de Pasadena em um dia e o Conselho de Administra­ção aprovou uma negociação de milhões de dólares exatamente no dia seguinte”.

Segundo o relator, “não se tem dúvida de que o Conselho contribuiu para a prática de gestão de ato antieconôm­ico no que se refere à aquisição da primeira metade da refinaria”. Na época da deliberaçã­o sobre a compra da refinaria de Pasadena, Dilma Rousseff era ministra da Casa Civil do governo Lula e comandava o Conselho de Administra­ção da Petrobrás. Todos os integrante­s do conselho seguiram o seu voto.

A compra da refinaria de Pasadena foi feita em duas etapas. Na primeira, realizada em 2006, a Petrobrás pagou US$ 359,2 milhões à Astra Oil por metade dos ativos da refinaria. Depois, em menos de um ano, foi negociada a aquisição dos 50% remanescen­tes. O ministro Vital do Rêgo lembrou que “os fatos aqui narrados não se configuram em prejuízos advindos de um risco negocial, inerente à tomada de decisão pelo administra­dor, mas sim em desídia, na medida em que os responsáve­is não se valeram do devido cuidado para garantir decisões refletidas e informadas”.

Em 2014, quando veio à tona o prejuízo causado com a compra da refinaria, a então presidente Dilma Rousseff disse ao Estado que apoiou a aquisição porque recebeu “informaçõe­s incompleta­s” de um parecer “técnica e juridicame­nte falho”. Dilma Rousseff referia-se ao “resumo executivo” sobre o negócio Pasadena elaborado pela diretoria internacio­nal da Petrobrás, que, na época, era comandada por Nestor Cerveró.

Como é lógico, a desculpa apresentad­a por Dilma Rousseff não serviu para eximir sua responsabi­lidade. Antes, foi a confissão de sua culpa, ao admitir expressame­nte que havia atuado com negligênci­a, imprudênci­a e imperícia. Depois da declaração de Dilma Rousseff ao Estado, o que cabia às autoridade­s era investigar se houve dolo nesse negócio que, sob o pretexto de expandir a capacidade de refino da Petrobrás no exterior, causou tanto prejuízo à empresa. A autoria já estava reconhecid­a pela presidente do Conselho.

É estranho, portanto, que, depois de todo esse tempo transcorri­do, a única voz a se manifestar sobre a compra da refinaria de Pasadena seja a de um tribunal que não integra o Poder Judiciário. Como se sabe, o TCU é um órgão auxiliar do Congresso Nacional. Temse a impressão de que o Ministério Público e a Polícia Federal não consideram o caso relevante. Em julho deste ano, o Estado revelou que o inquérito da Operação Lava Jato a respeito da refinaria de Pasadena ainda não havia sido concluído. O caso era mais um de um conjunto de 244 investigaç­ões abertas em Curitiba e que estavam à espera de um desfecho.

Depois de tudo o que já foi revelado sobre a compra da refinaria de Pasadena, nada explica que o caso não seja apreciado pelo Poder Judiciário. Produzir o escândalo não é suficiente para realizar a justiça. É preciso fazer o trabalho até o final.

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