O Estado de S. Paulo

O conto de duas estratégia­s climáticas

- / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZ­OU FAREED ZAKARIA É COLUNISTA

Na semana passada, a primeira página do New York Times infor mouque o governo Trump revogou o Plano de Energia Limpa, a tentativa da administra­ção Obama de reduzir as emissões de carbono das usinas a carvão. Abaixo do artigo, havia uma reportagem que detalhava o enorme investimen­to da China em veículos elétricos, parte dos esforços de Pequim para dominar anova erada tecnologia de energia limpa. É um conto de duas estratégia­s.

O governo Trump decidiu avan- çar para um novo século: o 19. O carvão está em declínio há pelo menos sete décadas. Em 1950, representa­va metade da produção de eletricida­de dos EUA; agora, caiu para um terço. Além disso, a maciça automação da mineração significa menos empregos na indústria. Assim como acontece em outras atividades econômicas, máquinas e softwares estão substituin­do os mineiros. A demanda por carvão está baixa em razão das alternativ­as, principalm­ente gás natural. Nos últimos anos, muitas das principais empresas de carvão americanas foram obrigadas a declarar falência.

Apesar da decisão do governo Trump, é improvável que essas tendências retrocedam. A agência Reuters descobriu que, das 32 empresas de fornecimen­to de energia que entraram com processos judiciais contra o Plano de Energia Limpa em 26 Estados, “a grande maioria não tem nenhum plano para direcionar seus bilhões de dólares para outra fonte de energia além do carvão”. A razão pela qual outras empresas estão deixando o carvão para trás é econômica – o preço do gás natural caiu nos últimos anos, e sua participaç­ão na geração de eletricida­de nos EUA quase triplicou desde 1990. E os custos da energia eólica e solar estão caindo rapidament­e.

Além disso, o carvão é a energia mais suja ainda em uso. As usinas de energia a carvão são uma das principais fontes de emissão de dióxido de carbono do país, e a maioria dos cientistas concorda que essas emissões acarretam o aqueciment­o global, e causam uma poluição atmosféric­a terrível.

Essa é uma das razões que levaram a China – que conta mais de 1 milhão de mortes por ano em razão da má qualidade do ar – a fazer grandes investimen­tos em energia limpa. O país se tornou um dos principais produtores mundiais de turbinas eólicas e painéis solares, com subsídios governamen­tais que possibilit­am que suas empresas sejam economicam­ente eficientes e tenham ambições no mercado global. Segundo um relatório da ONU, a China investiu US$ 78,3 bilhões em energia renovável no ano passado – quase o dobro do investido pelos EUA.

Agora, Pequim está investindo em carros elétricos, na esperança de dominar o que acredita que será a indústria de transporte do futuro. E o país já abriu uma grande liderança do setor. Em 2016, foram vendidas duas vezes mais unidades na China do que nos EUA, um feito surpreende­nte para um país que quase não contava com essas tecnologia­s dez anos atrás. Tudo isso já se traduziu em empregos, uma “grande jogada”, como diria o presidente Trump: 3,6 milhões de pessoas já estão trabalhand­o no setor de energia renovável na China. Nos Estados Unidos, são apenas 777 mil.

Donald Trump sempre diz que está cansado de ouvir falar sobre os enormes índices do cresciment­o chinês. Ele deveria entender que Pequim está crescendo porque se concentra no futuro. Os Estados Unidos sob Trump estão engajados em uma busca inútil e quixotesca para reviver as indústrias do passado. Quem você acha que vai ganhar?

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