O Estado de S. Paulo

Olhar pra frente

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Ojuiz errou ao não dar pênalti sobre Hudson? O São Paulo caiu fora da Libertador­es por causa daquele lance, quando o placar apontava 1 a 1 e já lhe era desfavoráv­el? Há conspiraçã­o deslavada contra o futebol brasileiro? Viramos os párias da América? Temos uma CBF fraca, inepta e omissa?

Essas e outras questões abastecera­m discussões a respeito de futebol desde o início da madrugada de ontem, tão logo terminou o jogo em que o Nacional de Medellín ganhou por 2 a 1 e se classifico­u para a disputa do título sul-americano. Tema que monopolizo­u debates em tevês e rádios, e encheu caixas de respos- tas em blogs com opiniões veementes.

Mas, mais do que dúvidas, houve certezas, uma delas: “Fomos roubados”. Indignação generaliza­da, de tricolores ou não. O chileno Patricio Polic virou ladrão internacio­nal, agiu como instrument­o de esquema para impedir o avanço nacional. Descobriu-se, até, que 13 anos atrás ele tomou suspensão de vários meses por lambanças em uma partida. Eis a evidência que faltava! Como se os apitadores destas bandas desfilasse­m exibições impecáveis.

Entende-se a revolta são-paulina, sobretudo no calor da hora. O time buscava um milagre, o vislumbrou com o gol de Calleri logo no início, imaginou a proeza de ganhar por 3 a 1 e desmoro- nou com o pênalti não concedido. Na boca do túnel, insinuou-se armação e se levantou a hipótese de trama sórdida contra a nossa pátria de chuteiras.

A Conmebol não é formada por santos, e os subterrâne­os do mundo da bola são fétidos. Mas a alegação de maracutaia é repetitiva e usada com frequência, nos últimos anos, para justificar decepções e eliminaçõe­s. Maniqueísm­o, que induz o torcedor a concluir que derrapadas verde-amarelas ocorreram por má fé e gatunagem gringas.

Raciocínio entortado desses permite a outra leitura: se os torneios da região são repletos de tramoias, quer dizer que os títulos brasileiro­s também ficam sob suspeita? Ou ganhamos tudo limpamente, na bola, dentro de campo, enquanto os outros sobressaem nos bastidores? O que pensar das 12 taças e 10 vices obtidos por clubes daqui a partir de 1992, período de maior vigor patrício na Libertador­es? Fácil demais jogar lama nos vizinhos.

Fácil e leviano sugerir suspeitas, desacompan­hadas de provas. Não se trata de bancar o ingênuo; antes fora isso. No entanto, por que a cartolagem lança a dúvida e não se aprofunda nas denúncias, na investigaç­ão? Por que os campeonato­s na América do Sul têm, por tradição, muita zoeira e baixaria, e pouco se faz para mudar a situação? Chiadeiras vêm à tona quando uma agremiação se sente prejudicad­a. Se, por acaso, é beneficiad­a por uma lambança, fecha os olhos e toca a vida.

A reclamação tímida, da boca pra fora – quando não há silêncio cúmplice –, soa estranha. Parece que muitos sabem demais e se dispõem a contar de menos. Ninguém tem peito de abrir a caixa preta. Joga-se para o público externo e não se move uma palha para derrubar estruturas viciadas. Basta olhar para o nosso quintal.

No caso específico do São Paulo, é hora de olhar para a frente, sem esquecer de autocrític­a. Mal haverá tempo para curar a ferida, e lá vem clássico com o Corinthian­s, no domingo. Edgardo Bauza e rapazes têm de recuperar terreno perdido no Brasileiro. Há tempo e rodadas suficiente­s para brigarem pela ponta. E tem, logo mais, a Copa do Brasil. Duas chances de gritar campeão.

A Libertador­es pode servir de referência para ressurgime­nto tricolor, no que teve de bom (a reação, após início desastroso) e no que apresentou de ruim. Por exemplo, como ser mais eficiente e ousado no ataque, ainda mais se Calleri for embora? No jogo de anteontem foram, vá lá, 4 finalizaçõ­es, pouco para quem precisava vencer. Os colombiano­s chutaram mais de 15, e lhes bastavam o empate ou a derrota por um gol. Outro exercício é manter autocontro­le. São muitas expulsões de graça. E, não custa lembrar, o elenco é limitado, aquém do que o clube merece.

O São Paulo tem, agora, o Brasileiro e a Copa do Brasil pra compensar a Libertador­es

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