O Estado de S. Paulo

A audácia crescente do PCC

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Que o Pr i meiro Comando da Capital (PCC) nunca teve sua força r e a l me n t e abalada, que continua a diversific­ar suas atividades criminosas e a aumentar seu poder dentro do sistema penitenciá­rio, onde nasceu, e fora dele é coisa bem sabida. O que mais impression­a nele hoje, além dessa posição de destaque no crime organizado, é a audácia crescente de suas ações, como provam os recentes ataques contra empresas transporta­doras de valores em cidades do interior e do litoral de São Paulo.

Segundo o Departamen­to de Investigaç­ões Criminais (Deic) da Polícia Civil, tudo indica que eles foram planejados pelo PCC e executados por sua ordem: tanto o de março, contra a sede da Protege, em Campinas, como o de abril contra a Prosegur, em Santos, e o da semana passada, contra essa mesma empresa em Ribeirão Preto. Esse último, em especial, chocou a opinião pública pela facilidade com que os bandidos conseguira­m chegar ao local e também pelo aparato utilizado: vários carros, caminhões, uma retroescav­adeira, armamento exclusivo das Forças Armadas e explosivos.

Como resumiu bem um comerciant­e, que como outros vizinhos da Prosegur em Ribeirão conseguiu filmar o roubo: “Foi uma coisa assustador­a. A gente vê isso na televisão e não faz ideia que de perto é muito pior”. Não há exagero porque, além das explosões provocadas para abrir caminho em direção ao cofre forte da empresa, se estima que foram disparados mais de mil tiros de fuzis pelos bandidos para impedir a aproximaçã­o da polícia. Além da soma roubada – R$ 65 milhões –, o PCC ainda conseguiu o efeito de chocar e amedrontar a população com sua demonstraç­ão cinematogr­áfica de força.

O que mais chama a atenção nesses roubos, além da quantia total conseguida, de R$ 138 milhões, é o nível de organizaçã­o na sua execução. Segundo o delegado Fabiano Barbeiro, existem dentro do PCC grupos especializ­ados na prática de cada aspecto específico dos crimes. Eles são reunidos e sua ação planejada de acordo com as caracterís­ticas das ações, dos locais em que devem ocorrer e da possível resistênci­a a ser enfrentada. E cada vez mais lançam mão também de novas tecnologia­s como a utilização de aplicativo­s (WhatsApp é um deles).

Essa capacidade de organizar e planejar não está presente só nas ações no terreno, mas igualmente – o que é mais importante – na diversific­ação dos setores em que atua o PCC, na sua expansão para outros Estados (está presente na maioria deles) e o exterior e na escolha das alianças com outros grupos criminosos.

Um exemplo é a sua entrada no tráfico de drogas, que não é de hoje, e que já se transformo­u numa de suas maiores fontes de renda. Outro é a sua relação com as vans que fazem parte do serviço de ônibus da capital, usada para lavar o dinheiro das drogas, que foi objeto de denúncia feita à Justiça pelo Ministério Público Estadual em 2014. Pouco depois, o Ministério Público fez o mesmo com relação às ligações do PCC com um dos ramos d a má f i a italiana, a N’Dragheta, neste caso para intermedia­r o envio de cocaína da Bolívia para a Europa.

O combate ao PCC tem ficado longe do que deveria ser, e é por isso que ele atingiu o porte e a eficiência que ficaram mais uma vez demonstrad­os nesses três roubos. O Deic comemorou a autorizaçã­o que recebeu do Comando Militar do Sudeste para usar as armas – fuzis e metralhado­ras – apreendida­s com os criminosos em São Paulo. Esse é mesmo um fato positivo, mas é preciso muito mais do que isso para enfrentar o PCC em sua principal base, que continua sendo São Paulo.

Para tal é necessário investir mais em investigaç­ão – que afinal é a principal função da Polícia Civil – e informaçõe­s, além de estabelece­r cooperação mais estreita com as polícias de outros Estados e com a Polícia Federal, tendo em vista as atividades do PCC no resto do País e no exterior. É a ausência de medidas como essas que explica por que ele chegou onde chegou.

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