Tão ruim que parece não ter fim
Este será, por muitos motivos, um ano para esquecer. Tanta coisa piorou tão depressa que parece difícil acreditar no que, há menos de 12 meses, gente experiente do mercado financeiro considerava provável que ocorresse em 2015. O encolhimento da economia supera todas as previsões, por mais pessimistas que tenham sido. A inflação está sendo muito maior do que a prevista. O desemprego aumenta numa velocidade assustadora, corroendo renda e esperanças. O descontrole das finanças públicas chegou a tal ponto que o governo não consegue nem mesmo apresentar uma projeção minimamente confiável para seu déficit. Se há alguma certeza, é a de que as coisas ainda vão piorar, antes que se possa vislumbrar alguma melhora.
Quem poderia imaginar, em dezembro do ano passado ou em janeiro deste, que o segundo mandato da presidente Dilma Rousseff acabaria, na prática, logo depois de iniciado, sucumbindo a uma crise em boa parte alimentada pelo próprio governo, por causa de seus erros passados e presentes e de sua incompetência? Se a constatação de que, na campanha de 2014, Dilma enganara o elei- tor ao esconder os problemas reais do País já era bastante para disseminar a desconfiança com relação a suas reais intenções, a inabilidade política e o imobilismo administrativo notórios desde os primeiros momentos do segundo mandato destruíram sua credibilidade. O avanço da Operação Lava Jato, que investiga o esquema de corrupção instalado na Petrobrás para beneficiar partidos, políticos e ex-dirigentes da empresa, mostrou a extensão da imoralidade que se apossou dos organismos do Estado brasileiro. Cada decisão da presidente no sentido de reduzir os riscos do impeachment, como a troca de ministros, tornou seu governo mais vulnerável e menos competente. Estabeleceuse uma espécie de sinergia entre as crises política, econômica, moral e social com efeito altamente nocivo para o País, pois, além da perplexidade crescente da população, provocou a paralisia das decisões.
Talvez se possa ter uma noção do efeito nocivo dessa combinação comparando as expectativas predominantes nas vésperas do início do segundo mandato de Dilma e o que se espera hoje. Quanto à inflação de 2015, era de 6,53% a previsão registrada na última edição de 2014 do boletim Focus, publicação semanal do Banco Central que registra as projeções dominantes entre os economistas das principais instituições financeiras do País. Já se previa, naquela época, que seria rompido o excessivamente permissivo limite de tolerância de 6,5% estabelecido pela política de meta inflacionária. Na edição mais recente do Focus, divulgada na segunda-feira passada, a projeção havia subido para 9,99%, mais do dobro da meta de 4,5% e muito acima do limite de tolerância.
Os preços sobem num período de forte desaceleração da atividade econômica. Há menos de um ano, previase que o Produto Interno Bruto (PIB) cresceria 0,55% em 2015, um aumento modesto, mas melhor do que o resultado de 2014 (aumento de apenas 0,1%). A projeção mais recente é de queda de 3,1%. Será o pior resultado desde 1990, quando o PIB encolheu mais de 4% co- mo consequência do desastroso Plano Collor, que congelou ativos financeiros e paralisou a economia.
Se alguma projeção melhorou, foi a do déficit em conta corrente do balanço de pagamentos em 2015. A estimativa se reduziu de US$ 77,79 bilhões em dezembro do ano passado para US$ 65 bilhões na semana passada. A melhora se deve ao aumento da expectativa de saldo da balança comercial no acumulado do ano, antes previsto em US$ 5 bilhões e, agora, estimado em US$ 14,6 bilhões. Ressalve-se, porém, que essa melhora numérica decorrerá da piora da economia. As exportações diminuirão em valor, mas, por causa da recessão, as importações diminuirão bem mais, ampliando o saldo comercial e reduzindo o déficit em conta corrente.
O compromisso de severo ajuste fiscal, penosamente assumido pelo novo governo Dilma e colocado sob a responsabilidade de um ministro da Fazenda, Joaquim Levy, considerado preparado para cumprir a tarefa, esvaiuse junto com a credibilidade da presidente e de seu auxiliar, que até agora não conseguiu obter a aprovação, pelo Congresso, de suas principais propostas. A rápida e acentuada redução das projeções para o superávit primário – o dinheiro necessário para o pagamento dos juros da dívida pública – pareceu acompanhar a corrosão da confiança na capacidade do ministro de fazer os acertos para recolocar em ordem as finanças públicas, passo indispensável para criar as condições necessárias à retomada do crescimento.
O ano começou com o anúncio da meta de um superávit primário de R$ 66,3 bilhões, ou 1,2% do PIB. Em 2016, o resultado primário seria de 2,0% do PIB e, em 2017, de 2,3%. Em julho, com a queda da arrecadação tributária provocada pela recessão, a meta para 2015 foi reduzida para 0,15% do PIB. Em outubro, o governo propôs nova revisão, com a projeção de déficit primário de 0,9% do PIB. Considerando, porém, despesas não relacionadas pelo governo na proposta, o relator do projeto, deputado Hugo Leal (ProsRJ), previu déficit primário de 2,05% do PIB neste ano.
Para 2016, a versão do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias aprovada na quinta-feira pela Comissão Mista do Orçamento do Congresso fixou a meta de 0,7% do PIB, sem desconto, ou R$ 43,8 bilhões. Talvez haja quem acredite que a meta seja alcançada, mas instituições como o FMI advertem que a situação fiscal do Brasil continuará ruim no próximo ano, se não for pior do que a de 2015, e que saldos positivos só começarão a surgir em 2017.
Sob o risco de terminar antes do tempo, com a base política destroçada e a maioria da população querendo vê-lo pelas costas, o governo Dilma não governa. Inepta, com cada dirigente interessado apenas na própria sorte, a oposição nem sabe para que lado se mover – parece demais esperar dela que pavimente caminhos para romper o impasse que trava o País. Tudo isso dá forças para este ano ruim se estender além dos limites do calendário.
Situação política e econômica atual do Brasil dá forças para este ano difícil se estender além dos limites do calendário