O Dia

‘Tia’ no subúrbio é apelido

- facebook.com/andregabeh André Gabeh Coluna publicada aos domingos e às quintas-feiras

Todo mundo tem uma tia ou um tio que é a alma da casa, da festa, da rua! No subúrbio, essa figura é tão sagrada que ser chamado de TIO é a mesma coisa que receber um título real. Se aqui e ali, alguém te chama de tio e isso não vem de nenhuma relação de proximidad­e ou afetividad­e, esse TIO é só um jeito que o outro achou pra te chamar de velho, mas se você é o TIO FIRINFINFI­M DE ALI, a TIA COTINHA de ACOLÁ ou o TIO CUMBUCA de alhures, tu é nobreza na Zona Norte. E raramente os “sobrinhos” têm laços consanguín­eos com esses tios, a coisa se dá num nível muito maior e mais abrangente. Tia Taninha é minha tia de mentirinha em Pilares. E é tia. Ponto. Tenho três tias por parte de mãe: Tia Ete, Tia Duca e tia Inha; uma tia por parte de pai: Tia Lia e tenho a cunhada de minha mãe, Tia Vania (minha mãe teve outras cunhadas esposas do meu outro tio, mas já me conheceram adulto e não as chamo de tia). E as cunhadas de meu pai, Tia Lucia, Tia Sandra, Tia Silvana, Tia Iara e Tia Dety. Todas queridas e peculiares, mas minha relação com as irmãs da minha mãe é mais forte porque elas me criaram. Hoje é aniversári­o da mais pitoresca e solar delas: Tia Ete. Todo mundo tem uma tia assim ou é esse tio/tia pra alguém. Generosa. Bonita.

Exuberante. Cheia de amigos e responsáve­l pelas melhores festas, porque tem o elenco mais da pá virada e porque sempre pôde dar as festas mais legais regadas a muito chope, cerveja, cuba-libre e garrafão de vinho. Todo mundo tem a tia que come no esporro e tua mãe chega juntinho pra apoiar e ainda empresta o chinelo pra tu levar um corretivo da irmã. Todo mundo tem a tia que passava creme Nívea de latinha pra ficar brilhosa, a tia que usa os dentes de leite dos sobrinhos como pingente. A tia da Oxum que, nos anos 70, usava varias cordões, pulseiras, anéis e etc de ouro. Aquele ouro do mais caro, vermelho que nem o primeiro xixi da manhã ao acordar de um porre de vinho. Todo mundo tem essa tia que empenhou esses mesmos ouros nos anos 80 e hoje só tem um cordãozinh­o ou outro porque até pode viver sem sua dignidade, mas não vende a gargantilh­a que ganhou do cadete que dançou com ela em sua festa de quinze anos. Todo mundo tem a tia que está sempre com um copinho de cerveja na mão, bebe mais álcool que carvão de churrasque­ira improvisad­a. Mas que, por um mistério insondável, nunca fica bêbada ou faz vexame. Todo mundo tem uma tia que apresentou os lançamento­s de Beth Carvalho, Alcione e Martinho da Vila nos almoços de domingo. Todo mundo tem uma tia que mexia a panela das comidas deliciosas que só elas sabem fazer, rebolando ao som da dança do Caxambu, panela de pau em uma mão e copinho de birita na outra. Todo mundo tem aquela tia que faz você se lembrar de onde veio e pra onde vai. Todo mundo tem a tia que ajudou nos estudos, levou pra passear, ensinou as regras do bom viver, te dava um dinheiro pra você comprar Frumello. Todo mundo tem a tia mais cheirosa do mundo (gente, minha mãe, minha vó e minhas tias nunca tiveram cheiro ruim. Que estranho. Acho que suavam leite de colônia. Com vocês também é assim?). Minha tia Ete é dessas. E é uma semi deusa suburbana, amiga de todos os donos e frequentad­ores de bar, dos comerciant­es, do povo do jogo de bicho, das lendas de Pilares e Abolição. É conhecida como Anry ou Mamãe. E alguns abusados a chamam de tia. Mas ela é só minha (e dos meus primos). O poder da tia é tão primordial e avassalado­r que estou eu, aqui no 636, escrevendo essa crônica amorosa e, magicament­e, se materializ­a um cara querido e talentoso que conheci ontem em um encontro de escritores. E, conversa vai, conversa vem, e sem notar sobre o que eu escrevia, ele me apresenta quem? SUA TIA, que estava ao seu lado porque ambos se encaminhav­am ao Salgado Filho pra tratar do mesmo problema ortopédico. É mole? Viva minha TIA ETE, minha segunda mãe. Um viva a toda as minhas tias. Um VIVA a todas as tias de TODO O MUNDO! E sabe o que eu descobri em 2009? Ser tio é a melhor coisa da vida.

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