Jornal do Commercio

Três décadas de Real, o plano econômico que mudou o Brasil

O país, ao final da ditadura, encontrava-se em situação econômica e política extremamen­te frágil, com desequilíb­rios macroeconô­micos significat­ivos

- PRISCILA LAPA Priscila Lapa, jornalista e doutora em Ciência Política; Sandro Prado, economista e professor da FCAP-UPE.

Adécada de 1980, “a década perdida”, foi marcada por uma série de crises econômicas no Brasil. A inflação galopante, a estagnação econômica e a dívida externa crescente foram caracterís­ticas desse período. O país, ao final da ditadura militar em 1985, encontrava-se em uma situação econômica e política extremamen­te frágil, com desequilíb­rios macroeconô­micos significat­ivos. Naquele período, a dívida externa crescia exponencia­lmente, enquanto a inflação se tornou uma constante ameaça, em um contexto político de transição para uma democracia ainda frágil e instável.

A história do Brasil deste período apresenta nuances importante­s sobre a relação entre política e economia. As eleições presidenci­ais de 1989 foram um marco, representa­ndo a primeira eleição direta para presidente desde a década de 1960. Fernando Collor de Mello venceu a disputa, com um discurso de combate à inflação e modernizaç­ão da economia, como pilares principais da nova era que se iniciava. No entanto, seu governo enfrentou inúmeros escândalos de corrupção e crises econômicas, culminando em seu impeachmen­t, em 1992. Itamar Franco assumiu a presidênci­a e iniciou um novo capítulo na política econômica do país, culminando com a criação do Plano Real.

Antes do Plano Real, diversos planos econômicos foram implementa­dos com o objetivo de controlar a inflação e estabiliza­r a economia, mas todos falharam em alcançar resultados duradouros. O Plano Cruzado (1986), implementa­do durante o governo de José Sarney, introduziu uma nova moeda, o Cruzado, e congelou preços e salários. Inicialmen­te, houve um controle temporário da inflação, mas a falta de controle fiscal e a pressão inflacioná­ria resultaram no fracasso do plano.

O Plano Bresser (1987), proposto pelo ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, envolvia um novo congelamen­to de preços e medidas de ajuste fiscal. Porém, a hiperinfla­ção persistiu. O Plano Verão (1989), introduzid­o pelo ministro Maílson da Nóbrega, envolveu outra mudança de moeda, para o Cruzado Novo, e um novo congelamen­to de preços. A inflação foi temporaria­mente controlada, mas logo voltou a crescer. O Plano Collor (1990), implementa­do por Fernando Collor de Mello, foi radical ao confiscar a poupança e outros ativos financeiro­s. A medida foi extremamen­te impopular e ineficaz, resultando em mais instabilid­ade econômica.

O Plano Real, lançado em 1994 durante o governo de Itamar Franco e sob a liderança do então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, foi um conjunto de medidas econômicas que visavam estabiliza­r a economia e controlar a hiperinfla­ção. O plano foi implementa­do em três etapas principais: medidas de ajuste fiscal, que incluíam cortes nos gastos públicos e reformas tributária­s para equilibrar as contas do governo; criação da Unidade Real de Valor (URV), uma unidade de conta que ajustava os preços diariament­e, preparando o terreno para a nova moeda; e a introdução do Real, em 1º de julho de 1994, substituin­do o Cruzeiro Real. A taxa de câmbio foi inicialmen­te fixada, o Real valorizado, ajudando a estabiliza­r os preços. A nova moeda rapidament­e ganhou a confiança da população e do mercado.

O Plano Real teve um impacto profundo na economia brasileira, conseguind­o controlar a hiperinfla­ção e estabiliza­r a economia. Os principais efeitos a longo prazo incluem a estabiliza­ção da moeda, com a introdução do Real; as medidas de controle fiscal, que reduziram drasticame­nte a inflação; o cresciment­o econômico, pois a estabiliza­ção criou um ambiente favorável ao investimen­to e ao desenvolvi­mento econômico; e a redução da pobreza, uma vez que a inflação elevada afeta desproporc­ionalmente os mais pobres.

O sucesso do Plano Real teve um impacto significat­ivo na eleição de Fernando Henrique Cardoso para a presidênci­a em 1994, já que proporcion­ou um ambiente de confiança e credibilid­ade, que favoreceu a sua candidatur­a. Sua associação direta com o plano econômico bem sucedido foi um fator determinan­te em sua eleição.

A estabilida­de econômica resultante do Plano Real não só melhorou a qualidade de vida dos brasileiro­s, como também consolidou a transição democrátic­a do país. A eleição de Fernando Henrique Cardoso represento­u a continuida­de das políticas econômicas de estabiliza­ção e a implementa­ção de reformas estruturai­s que visavam modernizar a economia brasileira e integrá-la mais efetivamen­te no cenário global.

Nossa reflexão sobre os 30 anos do Plano Real revela a importânci­a desse marco na história recente do Brasil, que não represento­u apenas um viés econômico, mas também abriu caminho para um período de fortalecim­ento das instituiçõ­es democrátic­as. A experiênci­a nos mostra a importânci­a de políticas econômicas sustentáve­is, a necessidad­e contínua de reformas para enfrentar os desafios econômicos persistent­es e o zelo constante pela democracia.

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Plano Real teve um impacto profundo na economia brasileira, conseguind­o controlar a hiperinfla­ção e estabiliza­r a economia
ACERVO/FUNDAÇÃO FHC O Plano Real teve um impacto profundo na economia brasileira, conseguind­o controlar a hiperinfla­ção e estabiliza­r a economia

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