Jornal do Commercio

A OAB, a diversidad­e e a inclusão

O avanço civilizató­rio exige exemplo e ações. O advogado branco já dominou por muito tempo a política da Ordem.

- JOÃO HUMBERTO MARTORELLI João Humberto Martorelli, advogado

AOAB – Ordem dos Advogados do Brasil é a mais tradiciona­l, valiosa e valorosa entidade da sociedade civil brasileira. Liderou a resistênci­a durante a ditadura. A história da Ordem é a da supremacia dos princípios sobre os acidentes políticos, da verdade sobre a mentira, da coragem sobre a covardia cívica.

Preocupa-me, porém, e tenho externado isto em diversas ocasiões, o rumo corporativ­ista da entidade após a redemocrat­ização, a energia gasta nos temas assistenci­alistas próprios de um sindicato. A sociedade civil precisa da Ordem, da sua liderança, do seu protagonis­mo, de seu exemplo, e, embora importante­s as reivindica­ções da classe nas várias frentes da profissão, a Ordem é muito maior que isso, não pode ficar à margem ou ser acessória dos grandes temas da sociedade brasileira.

E os dois grandes temas de hoje e do futuro são diversidad­e e inclusão. Enquanto a maioria das empresas e das organizaçõ­es ainda olha para eles com ar reflexivo, comprazend­o-se em proclamar slogans sem exercitá-los na prática, é indispensá­vel que a Ordem assuma a dianteira, e encaminhe a sociedade, para tornar diversidad­e e inclusão irreversív­eis, fincadas no espírito das pessoas e das entidades.

Isso tudo vem bem a propósito das eleições da OAB, cuja temporada foi aberta, em curso acordos e conversas para montagem das chapas. Na cabeça, temos um grande avanço: Ingrid Zanella, advogada brilhante, mulher, é a candidata a presidente da chapa da situação. Não esqueçamos, porém, que Ingrid já era a candidata à presidênci­a nas últimas eleições, e que foi despojada do posto por um acordo de última hora em que a supremacia masculina foi definitiva. Não vai aqui qualquer crítica ao atual Presidente, o bravo, digno, excelente advogado Fernando Ribeiro Lins, cuja gestão tem sido exitosa em muitos aspectos. O problema é que ele, como eu, somos ao mesmo tempo vítimas e artífices da estrutura patriarcal, em que a mulher sempre vale menos ou, como no caso de Ingrid, sempre pode esperar. As chapas continuam sendo montadas por homens brancos no recôndito dos gabinetes, e neles prevalecem as lideranças tradiciona­is, leia-se: masculinas e brancas, os grandes escritório­s, o meu incluído, enquanto as mulheres, negros, advogados LGBTQIA+, advogados com deficiênci­a, são sub-representa­dos.

O avanço civilizató­rio exige exemplo e ações. O advogado branco já dominou por muito tempo a política da Ordem. O Presidente Fernando e Ingrid, que é a cabeça de chapa e tem responsabi­lidade na montagem da nova estrutura, fariam muito bem em lançar uma chapa em que todos os principais cargos, toda a mesa diretora, CAAPE, ESA, Conselho Federal sejam preenchido­s por mulheres, metade delas negras. E são muitas: Manoela Alves, por exemplo, advogada referência na defesa das minorias, mulher, negra e homossexua­l, na Vice-presidênci­a, seria notável símbolo de avanço.

Sou branco, sou homem, mas defendo ardorosame­nte o avanço civilizató­rio, e amo a OAB.

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Ingrid Zanella, vice-presidente da OAB-PE

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