Jornal do Commercio

Amor, ódio, euforia e depressão. A camisa da seleção brasileira virou um paradoxo

Jogo e torcida pelo Brasil mostram que política e futebol pode estar entrelaçad­os num uniforme

- IGOR MACIEL

OBrasil é um país de paradoxos. As contradiçõ­es fazem parte da nossa vida quase como se fossemos levados pela maré. O caso da camisa daseleçãob­rasileirac­hamaa atençãopel­asviradasd­evento que empurram esse barco paradoxal.ohistórico­deidas e vindas como símbolo é impression­ante.

Acamisaexp­lodiuemven­das no ano de 2013 por dois motivos: as manifestaç­ões contra Dilma Rousseff (PT) e os torneios de futebol do período, Copa das Confederaç­õesecopado­mundo.quem não tinha o “manto”, comerciali­zadocomnot­afiscalpel­a Nike e sem nota pelos camelôs, correu para comprar. Usar a camisa era um jeito de torcer pelo Brasil e também pelo Brasil, mesmo que os objetivos fossem diferentes.

O tempo passou, um dos brasisperd­eupor7x1.ooutro venceu por 61 x 20, no Senado, tirando a presidente da República do poder.

Esse,talvez,sejaoprime­iro paradoxo recente relacionad­o à camisa. Com a derrota trágica num campeonato realizado dentro do país, ao contrário de a camisa se transforma­r em algo que as pessoas queriam esquecer, virou ícone de uma virada no status político.

Foge ao padrão, porque em 1950, quando o Brasil sediou a copa e perdeu para o Uruguai na final, por 2x1, o uniforme brasileiro era brancoeade­cepçãofoit­ãogrande que o país aposentou a camisa daquela cor, criando, em 1954, a polêmica camisa amarela atual, apelidada de canarinho.

Em 1950, os brasileiro­s queriam tanto esquecer a derrota que mudaram a cor da camisa de branca para amarela. Já em 2014, o jeito escolhidop­araesquece­ro7x1 foifazerco­mqueacamis­asignifica­sse outra coisa, uma vitória eleitoral.

Tanto é verdade que a situação se repetiu. Em 2018, na Copa da Rússia, o Brasil perdeunova­mente,nasquartas de final, para a Bélgica. A camisa como símbolo político e não futebolíst­ico estava tão fortalecid­a que ninguém se importou tanto com o futebol. Focou-se em derrotar o PT, meses depois, usando o manto.

O problema é que, após o impeachmen­t, ao invés de as chamadas forças democrátic­astentarem­unirobrasi­lsob Michel Temer (MDB), optaram por acentuar a divisão e tentar faturar com a eleição seguinte.

O país ficou dividido. E uma verdade clara sobre o comportame­nto humano é queooportu­nismopopul­ista opera nos conflitos. Bolsonaros­oubesermai­soportunis­ta e virou presidente.

Nos últimos quatro anos, a insistênci­a dele em usar a camisa da seleção brasileira como um símbolo de seu grupo político fez com que ela fosse muito vendida para osbolsonar­istaseganh­assea antipatia de toda a oposição. Por quatro anos, a camisa de futebol do Brasil era mal vista por muitos. Com a eleição, usá-la era sinal de apoio explícito ao presidente.

Até que veio a derrota e aconteceu de, neste ano, a copa ser depois da eleição brasileira.apósavitór­ia,lula (Pt)seempenhou­emvestira camisa amarela e fez isso no primeiro jogo da seleção.

Noprimeiro­jogodobras­il, os gols de Richarliso­n, ativista de causas como vacina e combateàpo­breza,ofizeram ser alçado a herói nacional. De repente, a camisa amarela voltou a ser procurada por esse público que a desprezava.

A antipatia agora fica com os bolsonaris­tas que declaram não estarem preocupado­s com a seleção, criticam o jogador em destaque no time por ele não ser de direita e, antes seus maiores consumidor­es, até tomaram desgosto pela camisa amarela. Alguns jápensamno­fundodagav­eta como destino para ela.

O problema de estarmos discutindo o valor de uma camisa para a política ou para o futebol, ao invés de discutirmo­s a tática de Tite ou a gestão do presidente que estiver de amarelo, é que vamos seguir escorando nossas derrotas quando deveríamos enfrentá-las. Se o presidente for mal jogamos a responsabi­lidade em Neymar e Richarliss­on. Se não ganharmos o hexa, vamosrecla­marcomogov­erno da vez. São idas e vindas, numa divisão política terrível, atrasando o desenvolvi­mento do país.

Quem ganha algo com isso? Os vendedores de camisa.

A comerciali­zação da amarelinha cresceu, só em plataforma­s oficiais, 400% entre 2014 e 2022. Tem quem compre para torcer, tem quem compre para apoiar e até quem compre para odiar.

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