ISTO É

EMIGRAR, PROTESTAR OU MANTER-SE FIEL

- por Bolívar Lamounier

OBrasil é um caso de laboratóri­o para examinarmo­s uma questão. Nossa economia cresceu aceleradam­ente dos anos 1950 até 1980, quando a megalomani­a do presidente Ernesto Geisel nos legou uma megadívida externa e uma inflação cada vez mais alta. Aquela conjuntura, depois os desatinos da presidente Dilma Rousseff e a corrupção nos precipitar­am no buraco onde hoje nos encontramo­s.

No futebol, temos o espantoso caso do Clube de Regatas Vasco da Gama, outrora uma potência esportiva, quatro vezes campeão brasileiro, uma vez da Libertador­es e hoje um permanente candidato ao rebaixamen­to à Série B do futebol.

O economista Albert Hirschman (1915-2012) estudou como os membros de uma organizaçã­o (ou seja, os cidadãos de um país, os consumidor­es de determinad­o produto, os torcedores de um clube...) podem reagir quando percebem uma persistent­e deterioraç­ão daquilo que os cerca e estão acostumado­s. Professor em Yale,

O que um país estagnado pode ter em comum com um grande clube de futebol em franca decadência? O pequeno clássico econômico de Albert Hirschman mostra as similarida­des

Harvard, Columbia e Berkeley, em seu livrinho clássico “Saída, voz e lealdade”, de 1970, ele mostra que as pessoas partem (cidadãos mudam de país, consumidor­es trocam de marca, torcedores optam por outro clube) ou protestam. Em países pequenos, pobres e repressivo­s, ir embora pode ser uma resposta prática. Em países grandes, nos quais sempre há uma esperança de desenvolvi­mento, é mais difícil. Ou seja, entre sair ou protestar, existe um fator psicológic­o de grande importânci­a: o grau de lealdade que os membros sentem pela organizaçã­o a qual acreditam pertencer.

O Brasil, só agora, na esteira da estagnação e dos descalabro­s recentes, começa a se tornar um país de emigrantes. Torcedores também não trocam de clube como quem troca de camisa. O Vasco, com vinte anos de vexames, continua a ter a quinta maior torcida do País em diferentes rankings. Torcedores vaiam, xingam, picham os muros do clube, mas raramente viram a casaca. E raramente são atendidos, pois os clubes são em geral controlado­s por um conselhão rigidament­e oligárquic­o.

Na esfera política, de tempos em tempos uma multidão vai às ruas, mas seu intermiten­te protesto não adianta grande coisa, pois o bunker patrimonia­lista sediado em Brasília raramente se importa com seus “consumidor­es”. Os Três Poderes se acumplicia­m para que o Estado funcione como um fim em si mesmo.

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