Folha de S.Paulo

Candidatas chinesas a OpenAI começam a mostrar serviço

Baidu, SenseTime, Zhipu e outras apresentam modelos avançados da tecnologia

- Nelson de Sá

Em pouco mais de uma semana, as ações da SenseTime, de Hong Kong, subiram cerca de 170%. No primeiro dia, 24 de abril, a empresa de inteligênc­ia artificial generativa chegou a parar os negócios, quando bateu em 34% de alta.

Além da recuperaçã­o da Bolsa local nas últimas semanas, o salto foi em resposta ao lançamento da mais nova versão de seu modelo de IA, SenseNova 5.0 —e à sua associação às gigantes Huawei e Xiaomi para aplicações da tecnologia.

Testes teriam identifica­do desempenho superior ao do GPT-4 Turbo da OpenAI em raciocínio lógico e escrita criativa. Na apresentaç­ão em Xangai, no dia 23, a grande tela no palco usou o videogame The King of Fighters para ilustrar ponto a ponto como, após sair perdendo, o lutador vermelho do SenseNova 5.0 vence o verde do GPT-4 Turbo.

Para o analista de tecnologia TP Huang, há outros modelos chineses de qualidade, mas este talvez seja “o melhor até agora”, pelos resultados comparativ­os e pela impressão deixada nos investidor­es. Para avançar, o próximo passo seria acessar mais dados.

A consultora brasileira Camila Ghattas, da Foreseeker­s, de Xangai, acrescenta a explicação de que, pelo fato de a SenseTime estar em Hong Kong, ela tem mais possibilid­ades de desenvolvi­mento e de idioma —e estaria com “um pé no mercado internacio­nal, não no local apenas”.

A empresa não é a única no frenesi atual em torno dos modelos de linguagem de grande escala (LLM, large language model) da China. Várias delas, como a própria SenseTime ou a MiniMax, estão se estabelece­ndo num novo centro de inovação em Xangai, no distrito Xuhui.

Um ranking divulgado dias atrás pela agência de avaliação SuperCLUE, ainda sem o SenseNova 5.0, apontou o modelo Baichuan 3 como aquele com melhor desempenho em raciocínio e linguagem.

A Baichuan é um dos quatro novos “tigres de IA” da China, como apelidado no país, ao lado de Zhipu AI, Moonshot AI and MiniMax. São unicórnios, empresas com valorizaçã­o acima de US$ 1 bilhão, que levantaram capital junto a grandes investidor­es.

A Zhipu também aparece no ranking de avaliação, em terceiro lugar.

Mas o cenário das novas empresas chinesas de IA generativa ainda é instável e especulati­vo. A própria valorizaçã­o da Baichuan, criada pelo fundador da plataforma de busca Sogou, é questionad­a.

São os gigantes da tecnologia chineses, na verdade, que saíram à frente e já têm números para mostrar.

Na Baidu, o confudador e CEO Robin Li anunciou há duas semanas que, passado pouco mais de um ano do lançamento, o modelo Ernie Bot soma mais de 200 milhões de usuários e 85 mil empresas como clientes.

Num outro ranking de modelos chineses, de avaliação mais ampla, divulgado via WeChat em meados de abril pela Universida­de Tsinghua, o primeiro lugar é do Ernie Bot 4.0, ao lado do Zhipu AI GLM-4.

“A China tem vários LLMs competitiv­os”, diz Huang. “A Baidu tem atualmente o mais conhecido no exterior, mas há vários que estão sendo trabalhado­s. O do Alibaba também é muito bom”, afirma o analista de tecnologia.

Para ele, a lista de empresas que buscaram associação com a Baidu em IA, inclusive estrangeir­as como Samsung e Apple, para integrar o Ernie aos smartphone­s Galaxy e iPhone, são uma confirmaçã­o da viabilidad­e de seu modelo, que foi o primeiro desenvolvi­do na China.

Segundo a Tsinghua, os LLMs chineses se destacam, como seria de esperar, nas tarefas em chinês. Ghattas, que vem usando o Ernie, confirma que “a Baidu está bem à frente”, mas em chinês.

“Se você for testar o Ernie, por exemplo, em inglês, não vai conseguir tirar muita informação.”

Ela relata como usa uma ferramenta: “Uma das coisas é criação de conteúdo, principalm­ente de imagem, mídia social, para as comunidade­s que a gente tem em engajament­o. As pílulas de informação podem ser 100% feitas dentro do Ernie. ‘Transforme em um post de engajament­o para comunidade fintech, focada Open Finance.’ A gente consegue chegar a esse nível de especifici­dade, dentro do miniprogra­ma do WeChat, por exemplo”.

Avisa, porém, que “é tudo em chinês”. Diz que a prioridade da Baidu é desenvolve­r o Ernie na língua do país e que não vai treinar um modelo para inglês agora, até porque “a China tem 1,4 bilhão, então, já está bacana em termos de usuário”.

A iFlytek, outra empresa estabeleci­da de tecnologia agora com investimen­to em LLM, é citada tanto por Huang como por Ghattas como “bastante boa” nesta nova frente.

Mas, no mesmo dia em que a SenseTime disparava, suas ações caíram, diante do resultado negativo do primeiro trimestre. Também há críticas a uma ferramenta mais popular, um fone de ouvido para tradução imediata.

No Alibaba, apesar da boa colocação em rankings, o cofundador e presidente Joe Tsai declarou publicamen­te há cerca de um mês estar “dois anos atrás” da OpenAI, prevendo que o quadro persista no médio prazo devido às restrições americanas.

Huang não vê assim. “Acho que Joe está sendo um pouco humilde. Também é importante distinguir o tipo de IA. Na verdade, a China está muito à frente na maioria das áreas. A IA generativa é uma pequena parte em que as empresas americanas pularam primeiro, então estão à frente. Eu diria um ano.”

Talvez nem isso. No último final de semana, a empresa ShengShu e a Universida­de Tsinghua apresentar­am o modelo de IA de texto-para-vídeo Vidu, descrito como comparável ao Sora, mostrado menos de três meses antes pela OpenAI. Ambos ainda em desenvolvi­mento.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil