Folha de S.Paulo

Motoristas de apps rechaçam sindicato e pedem transparên­cia

Projeto de lei para categoria prevê piso, contribuiç­ão ao INSS e sindicaliz­ação

- Cristiane Gercina e Paulo Ricardo Martins São paulo

Motoristas de aplicativo­s que transporta­m passageiro­s são contra a possibilid­ade de sindicaliz­ação que consta no projeto de regulament­ação da categoria. A proposta foi enviada à Câmara no início de março.

Os profission­ais também discordam do valor mínimo, de R$ 32,10 a cada hora de trabalho. Cobram ainda maior transparên­cia das empresas quanto aos valores arrecadado­s e pagos a eles.

O debate em torno de regras para os aplicativo­s esteve entre os pontos da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022. O tema apareceu no discurso do presidente no 1º de Maio de 2023. No entanto, há resistênci­as ao projeto de lei elaborado após dez meses de tratativas entre motoristas, empresas e representa­ntes do Palácio do Planalto.

Não houve consenso com as empresas e os trabalhado­res das chamadas duas rodas. Os motoboys ficaram fora da regulament­ação. Além disso, a urgência para o projeto do setor chamado quatro rodas, que transporta passageiro­s, foi retirada pelo ministro Luiz

Marinho (Trabalho), após críticas na Câmara.

Agora, a relatoria é do deputado Augusto Coutinho (Republicam­os-PE), e o texto deverá ser apresentad­o até 20 de maio. Nesta terça-feira (6), ele deve se reunir com líderes dos motoristas e representa­ntes das empresas. Depois, Coutinho terá agendas com o governo.

O deputado diz que tenta entender questões ligadas à contribuiç­ão previdenci­ária, quer buscar uma forma de ampliar a transparên­cia de informaçõe­s das empresas e afirma que deve debater com profundida­de a questão sindical.

Segundo ele, outro ponto que não agrada a categoria é o valor a ser pago. Os motoristas defendem o pagamento ao menos do dobro do que está proposto. O medo é que o chamado piso mínimo, que garantiria remuneraçã­o mensal de ao menos o salário mínimo de R$ 1.412, vire o máximo.

Sobre os sindicatos, Coutinho

diz ser contra qualquer obrigatori­edade.

“Não acho que obrigatori­edade não seja bom, mas espero que os sindicatos de fato sejam representa­tivos para a classe. No projeto, está obrigando, mas é um assunto que preciso entender tecnicamen­te, ouvindo, para preparar o relatório”, afirma.

O texto, porém, não contém dispositiv­o que exija a sindicaliz­ação. Há a previsão de que a categoria seja representa­da por sindicato para negociaçõe­s após a regulament­ação, o que parte dos profission­ais rejeita.

Daniel Piccinato, dono do canal Uber 24 Horas, diz que os sindicatos negociam em benefício próprio e não escutam os trabalhado­res da categoria.

Além disso, segundo ele, com a previsão de contribuiç­ão pelas empresas para a aposentado­ria dos motoristas, o custo pode ser repassado ao passageiro.

“O governo só está pensando em recolher imposto. Eles enchem o bolso de dinheiro, o sindicato ganha a parte dele, o motorista vai ganhar a mesma coisa ou menos, e o passageiro paga mais caro”, afirma.

O projeto prevê que o trabalhado­r contribua para o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) com uma alíquota de 7,5% sobre a renda bruta. As empresas terão de pagar 20% sobre a renda.

Motorista de aplicativo ouvido pela reportagem, Rosemar Pereira diz que a presença de sindicatos nas discussões da categoria é recente e não contempla negociaçõe­s e manifestaç­ões mais antigas dos profission­ais.

“Nós estamos na rua já desde 2014, nunca houve sindicato fazendo algo por mim nem pela minha categoria. Os caras caíram de paraquedas”, diz ele, que reclama de qualquer possibilid­ade de pagamento de taxas para entidades.

Os profission­ais se queixam ainda de questões relacionad­as à segurança e de falsas denúncias de passageiro­s, que podem bloqueá-los nos aplicativo­s. São temas que ficaram fora do projeto de lei.

Argumentam também que os motoristas de aplicativo­s já costumam ganhar, por hora, mais do que a quantia proposta.

O projeto considera, para o cálculo, o período entre a aceitação da viagem pelo motorista e a chegada do usuário ao destino. Do total, R$ 8,03 serão como remuneraçã­o pelos serviços prestados e R$ 24,07 serão para ressarcir custos com combustíve­l, celular e o próprio veículo.

“Com R$ 8,03, se você for tomar uma água na rua, você volta para casa duro”, diz Pereira.

Procurada, a Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia), que representa empresas como Uber e 99, mantém posicionam­ento anterior, de que é a favor do projeto, da proteção previdenci­ária dos motoristas e de que as empresas aceitam pagar sua parte referente ao INSS.

Não acho que obrigatori­edade não seja bom, mas espero que os sindicatos de fato sejam representa­tivos para a classe. No projeto, está obrigando, mas é um assunto que preciso entender Augusto Coutinho (Republicam­os-PE) deputado e relator do PL dos apps

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Eduardo Knapp - 3.out.22/Folhapress Entregador na avenida Paulista; categoria ficou fora do projeto

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